“Sentidos de promoção da saúde produzidos por trabalhadores do campo da saúde do trabalhador: da polissemia à operacionalidade possível” por Ana Paula Carneiro Carvalho Dissertação apresentada com vistas à obtenção do título de Mestre em Ciências na área de Saúde Pública. Orientador: Prof. Dr. Aldo Pacheco Ferreira Rio de Janeiro, março de 2014. Esta dissertação, intitulada “Sentidos de promoção da saúde produzidos por trabalhadores do campo da saúde do trabalhador: da polissemia à operacionalidade possível” apresentada por Ana Paula Carneiro Carvalho foi avaliada pela Banca Examinadora composta pelos seguintes membros: Prof. Dr. Cyro Haddad Novello Prof.ª Dr.ª Ana Elisa Bastos Figueiredo Prof. Dr. Aldo Pacheco Ferreira – Orientador Dissertação defendida e aprovada em 31 de março de 2014. Catalogação na fonte Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica Biblioteca de Saúde Pública C331 Carvalho, Ana Paula Carneiro Sentidos de promoção da saúde produzidos por trabalhadores do campo da saúde do trabalhador: da polissemia à operacionalidade possível. / Ana Paula Carneiro Carvalho. -- 2014. 113 f. Orientador: Ferreira, Aldo Pacheco Dissertação (Mestrado) – Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Rio de Janeiro, 2014. 1. Saúde do Trabalhador. 2. Promoção da Saúde. 3. Meio Ambiente. 4. Ambiente de Trabalho. I. Título. CDD - 22.ed. – 363.11 À minha família amada que superou os inúmeros momentos de ausência, aos profissionais do CEREST/RJ, que compartilharam comigo seus saberes e experiências. AGRADECIMENTOS Agradeço primeiramente a Deus, que me deu sabedoria, visão e condições para construir este trabalho, pondo anjos nos meus caminhos para me ajudarem de inúmeras formas, e destas, singular a cada um, que dentro de suas condições e possibilidades, uns mais outros menos, me possibilitaram este resultado. Agradeço a todos os professores das disciplinas que cursei, que contribuíram, na minha formação, com um maravilhoso e competente arcabouço teórico, que além de me dar ferramentas para a construção deste trabalho, ampliaram minha visão de mundo, me tornando uma pessoa melhor. Sendo assim, especialmente: Ao meu orientador Drº. Aldo Pacheco Ferreira, pelo apoio, por ter me apresentado a este tema maravilhoso da promoção da saúde, pelo artigo que construímos juntos no início desta jornada, que possibilitou maior reflexão e compreensão do campo, pela confiança depositada e as novas perspectivas apresentadas. Ao professor Drº. Cyro Haddad Novello, que quando sob sua gestão, possibilitou o conhecimento desta Instituição através da participação em inúmeras palestras voltadas para o campo da saúde do trabalhador, me despertando o interesse pelo mestrado. À Adriana Fernandes Martins, pela amizade, apoio e auxilio nesta jornada. Ao professor Drº. Ary Carvalho Miranda, por ter compartilhado seus preciosos saberes e acolhimentos durante sua disciplina e fora dela, que significaram muito para a construção dos fundamentos teóricos desta pesquisa. À professora Drª. Kátia Reis, pela generosidade, incentivo, apoio e sábias observações. À professora Drª. Tatiana Wargas de Faria Baptista pelo apoio e incentivos constantes. Ao professor Drº. Luiz Carlos Fadel de Vasconcellos por sua disponibilidade sempre em ajudar e compartilhar seus preciosos saberes. À Professora Drª. Ana Elisa Bastos Figueiredo, à qual estendo o tapete vermelho, e sei que nunca poderei agradecer suficientemente sua tamanha generosidade e acolhimento, que através de inúmeros encontros, compartilhou seus precisos saberes de forma singular e me possibilitou o uso do método e a análise desta pesquisa. A equipe do Cerest que contribuiu com cumplicidade e com suas enriquecedoras experiências. Aos meus colegas de classe, pela rica troca de experiências. À Daiana Rangel, pela amizade, apoio, força e consolo nos momentos mais difíceis. À Daniela Maria, pela generosidade, amizade e apoio, além das ricas trocas de experiência. À galera da turma de análise de discursos da profª. Ana, como Armando, Alba, Ray, Paula, Jô, Andréa e Letícia, pela amizade e rica troca de experiências. Aos bibliotecários, pelos constantes auxílios, especialmente a Arlete, Leonardo, Waldemar e Gisele. A todos que, de alguma forma, contribuíram para esta construção, muito obrigada! “O que nós estamos fazendo aí, é..., quer dizer //é uma gota no oceano//”, “...Então, quer dizer, //é trabalho de formiguinha//” (expressão facial de tristeza)”... (técnico(a) da equipe do CEREST/R). RESUMO Este estudo partiu da compreensão de ser a promoção da saúde um importante instrumento para as políticas de saúde, nesta incluída a Política Nacional de Saúde do Trabalhador e Trabalhadora. Foi realizado um estudo de campo na Secretária de Estado de Saúde do Estado do Rio de Janeiro, com a equipe do Centro de Referencia em Saúde do Trabalhador do Estado do Rio de Janeiro, onde se objetivou compreender e interpretar os sentidos produzidos nos discursos pelos atores do setor sobre promoção da saúde. Optou- se por investigar a dinâmica da promoção da saúde no campo da saúde do trabalhador através de uma metodologia qualitativa, onde a forma de análise dos dados foi feita a partir da análise do discurso. Para a coleta dos dados foi utilizada a técnica de entrevista semiestruturada, acompanhada de um roteiro orientador contendo os objetivos da pesquisa. A organização dos resultados foi estabelecida a partir das categorias conceituais que nos levaram ao campo prático: Promoção da Saúde / ações de Promoção da Saúde, Intersetorialidade, Participação dos Trabalhadores, Estrutura do setor e Desafios, que proporcionaram o desvelamento dos sentidos produzidos pelos trabalhadores do setor em mosaicos significantes. Os resultados apontaram para a valorização da promoção da saúde como objetivo político e norteador para o campo da saúde do trabalhador, embora se tenha uma operacionalidade ainda muito aquém do potencial existente; o surgimento de novas e históricas fragilidades que permeiam o campo e impedem sua legitimidade, que se desvelou nos significados das categoriais empíricas e apresentaram desafios a serem enfrentados pelos atores do campo, como a construção de uma política de Estado que contemple as especificidades territoriais do campo e forneça maior visibilidade do setor perante a sociedade. Palavras-chave: Saúde do Trabalhador. Promoção da saúde. Saúde, trabalho e ambiente. ABSTRACT This study arose from the understanding to be a promotion of health an important instrument for the health politcs and it is included in the National Politics of the worker’s health. A field study was carried out in the health state the bureau with the team of Reference Center of worker’s health which the study animed to understand and interpret the feelings produced by the health actors’ speeches. The study investigated the dynamic of health’s promotion in the field of the worker’s health through a qualitative approach in which the way of analysing the data was performed by the analysis of the speech. For collecting the data, a semi structured interview having the objectives of the research was used. The findings’ organization was establised from conceptual categories that conduct us to the practical field: health promotion/ actions to promote health, different sectors, workers’ participation, structure of the sector and challenges, which provide the revelation of the feelings produced by workers from meaningful mosaic sectors. The results showed to value the health’s promotion with a politcal aim towards the field of the worker’s health. Although there is na operation far from the existing potencial, the rise of new historical fragilities that suround the field and prevent its legitimacy that unveiled the meanings of empirical categories and showed challenges to be faced by field’s actors, such as the construction of a new state’s policy which contemplate the territory’s specification and provide greater society’s visibility of the sector. Keywords: Worker’s Health. Health promotion, Health, work and environment. LISTA DE SIGLAS CLT – Consolidação das Leis do Trabalho CNS – Conselho Nacional de Saúde CEREST - Centro de Referência em Saúde do Trabalhador CIPA - Comissão Interna de Prevenção de Acidentes CIST - Comissão Intersetorial de Saúde do Trabalhador CONSEST - Conselho Estadual de Saúde do Trabalhador DIESAT – Departamento Intersindical de Estudos e Pesquisas de Saúde e dos Ambientes de Trabalho DSS – Determinantes Sociais de Saúde ENSP - Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca EPI – Equipamento de Proteção Individual ESF – Estratégia de Saúde da Família FIOCRUZ - Fundação Oswaldo Cruz IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística MOI – Modelo Operário Italiano MS - Ministério da Saúde MTE - Ministério do Trabalho e do Emprego NR - Norma Regulamentadora NUSAT - Núcleo de Saúde do Trabalhador OIT – Organização Internacional do Trabalho PAC – Programa de Aceleração do Crescimento PCMAT - Programa de Condições e Meio Ambiente de Trabalho na Indústria da Construção PCMSO - Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional PNPS – Política Nacional de Promoção da Saúde PNAD - Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios PNST - Política Nacional de Saúde do Trabalhador PNSTT - Política Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora PS – Promoção da Saúde PST - Programa de Saúde do Trabalhador RENAST - Rede Nacional de Atenção Integral à Saúde do Trabalhador RJ - Rio de Janeiro SES - Secretaria Estadual da Saúde SESMT - Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e Medicina do Trabalho SINAN - Sistema de Informação de Agravos de Notificação ST - Saúde do Trabalhador STPS – Secretária do Trabalho e Previdência Social SUS - Sistema Único de Saúde VISA – Vigilância Sanitária VISAT - Vigilância em Saúde do Trabalhador SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO 13 1.1 OBJETO DE ESTUDO 20 2 A RELACÃO TRABALHO-SAÚDE NO CAMPO DA SAÚDE PÚBLICA COMO QUESTÃO SOCIAL 21 2.1 A RELAÇÃO TRABALHO-SAÚDE NA CONSTRUÇÃO DO CAMPO DA SAÚDE DO TRABALHADOR NO BRASIL 27 2.2 O DESENVOLVIMENTO DO CAMPO DA MEDICINA DO TRABALHO NO BRASIL 28 2.3 O DESENVOLVIMENTO DO CAMPO DA SAÚDE OCUPACIONAL NO BRASIL 29 2.4 O CAMPO DA SAÚDE DO TRABALHADOR 32 2.4.1 Os processos de trabalho 34 2.4.2 Política Nacional de Saúde do Trabalhador 39 2.5 PROMOÇÃO DA SAÚDE 40 2.5.1 Bases históricas e conceituais 40 2.5.2 Promoção da saúde para a saúde do trabalhador 45 3 PERGUNTA CONDUTORA 49 4 JUSTIFICATIVA 50 5 OBJETIVOS 51 5.1 OBJETIVO GERAL 51 5.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS 51 6 TRAJETÓRIA METODOLOGIA 52 6.1 DESENHO DO ESTUDO 52 6.2 CENÁRIO DE ESTUDO 55 6.3 SUJEITOS DO ESTUDO 55 6.4 TÉCNICAS DA PESQUISA 56 6.4.1 Entrevistas 56 6.5 A FORMA DE ANÁLISE 57 7 RESULTADOS E DISCUSSÃO 64 7.1 PROMOÇÃO DA SAÚDE / AÇÕES DE PROMOÇÃO DA SAÚDE 68 7.2 RELAÇÕES INTERSETORIAIS 82 7.3 PARTICIPAÇÃO DOS TRABALHADORES 85 7.4 ESTRUTURA DO SETOR 87 7.5 DESAFIOS 96 8 CONSIDERAÇÕES FINAIS 102 REFERÊNCIAS 105 APÊNDICE A. Termo de Consentimento Livre e Esclarecido 112 APÊNDICE B – Roteiro da entrevista 113 13 1 INTRODUÇÃO A preocupação com a saúde é secular e fundamental para a existência humana. O homem sempre buscou caminhos para alcançá-la. E dessa motivação surgiram estudos, pesquisas, crenças, conceitos, remédios, programas, entre outros inúmeros esforços, que apesar de não encontrarem a fórmula da eternidade, melhoraram em muito a expectativa e qualidade de vida da população. E, dentre caminhos e descaminhos, ao longo da história, trouxeram experiências e diferentes olhares sobre o conceito de saúde e de como promovê-la. Nessa perspectiva, após diversas transformações do conceito de saúde, saúde como ausência de doença, saúde como um direito, saúde como um componente que vai além do setor saúde, enfim, a VIII Conferência Nacional de Saúde (1986)1, que contribuiu para o texto constitucional de 1988, trouxe o conceito de saúde mais discutido atualmente e mais conhecido como conceito ampliado de saúde, que foi resultado da discussão de diversos movimentos sociais no processo de redemocratização do país. Em sentido mais abrangente, a saúde é a resultante das condições de alimentação, habitação, educação, renda, meio ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso e posse da terra e acesso aos serviços de saúde. Sendo assim, é principalmente resultado das formas de organização social, de produção, as quais podem gerar grandes desigualdades nos níveis de vida 1 Dessa forma, a VIII Conferência Nacional de Saúde (1986)1 deixa claro em seu relatório final, que a saúde passa a ser um direito do cidadão, e ter direito significa ter a garantia pelo Estado de condições dignas de vida com um olhar sobre os determinantes sociais: Direito à saúde significa a garantia, pelo Estado, de condições dignas de vida e de acesso universal e igualitários às ações e serviços de promoção, proteção e recuperação da saúde, em todos os seus níveis, a todos os habitantes do território nacional, levando ao desenvolvimento pleno do ser humano em sua individualidade. Desse direito amplo e desta noção de direito como conquista social, implica garantir: trabalho em condições dignas, com amplo conhecimento e controle dos trabalhadores sobre o processo e ambiente de trabalho; alimentação para todos segundo as suas necessidades; educação e informação plenas; qualidade adequada do meio ambiente; transporte seguro e acessível; repouso lazer e segurança; participação da população na organização, gestão e controle das ações e serviços de saúde; direito à 14 liberdade, à livre organização e expressão; e acesso universal e igualitário às ações e serviços setoriais em todos os níveis. Nesse contexto, a saúde está relacionada com as formas de vida e modos de viver dos indivíduos, e isso implica um olhar para os determinantes sociais de saúde (DSS) 2 . Dentre estes está a proposta aqui externalizada. Segundo a comissão homônima da Organização Mundial da Saúde (OMS), os DSS são as condições sociais em que as pessoas vivem e trabalham. Segundo Buss 3 , os DSS expressam com maior ou menor nível de detalhe o conceito atualmente bastante generalizado de que as condições de vida e trabalho dos indivíduos e de grupos da população estão relacionadas com sua situação de saúde. Portanto, fornecer melhor qualidade de vida e saúde, implica promover melhoria das condições de trabalho da população. Embora não seja tarefa fácil atuar no mundo do trabalho, diversos esforços nacionais têm sido realizados em prol da promoção da saúde do trabalhador, assim como a criação do programa de Saúde do Trabalhador. A Saúde do Trabalhador é um campo da saúde coletiva, que devido sua grande abrangência em termos de população, território, política, contextos multidisciplinares e interesses políticos e econômicos, entre outros fatores, nos leva a considerá-lo um campo muito complexo 4 . E também, por ser ainda uma área em construção com algumas questões recentemente construídas, requer forças multifatoriais para obter uma política exitosa. Assim, buscam-se identificar relações entre o ambiente, organização, condições de trabalho e os efeitos na saúde do trabalhador, diagnosticando e propondo soluções para os processos relativos à deterioração da qualidade de vida, saúde e ao surgimento de doenças relacionadas ao trabalho 5 . A constatação dos efeitos adversos do ambiente de trabalho requer medidas de promoção e proteção da saúde do trabalhador, mediante desenvolvimento de ações de vigilância dos riscos presentes 6 . A Saúde do Trabalhador como campo de conhecimento da saúde pública foi demarcado em fins de 1970 no Brasil, num momento de debates da reforma sanitária e processo de redemocratização da nação. Área que, inclusive, buscava romper com o paradigma da saúde ocupacional e medicina do trabalho, trazendo questões como a relação saúde-trabalho-doença no campo da saúde coletiva, que no olhar de diversos estudiosos do assunto eram fundamentais para compor uma política embasada na justiça social 7 . 15 A Saúde do Trabalhador nasce no Brasil da insuficiência da medicina do trabalho e da saúde ocupacional, após uma larga experiência de estudos e saberes, em prover direitos fundamentais aos trabalhadores, como por exemplo, direito à informação sobre os riscos, à recusa ao trabalho em condições de riscos, direito à consulta prévia aos trabalhadores pelos empregadores, a não delegação da vigilância da saúde ao Estado, entre outros direitos, embora as “outras saúdes” voltadas para o campo compunham parte dele8. Dessa forma, a Saúde do Trabalhador busca romper com a visão monocausal entre a doença e um agente específico, e/ou multicausal, entre a doença e um grupo de fatores de risco (físico, químicos, biológicos, mecânicos). Ou seja, busca a interdisciplinaridade composta, no campo da saúde coletiva, pelo tripé epidemiologia, administração e planejamento em saúde e ciências sociais em saúde, compondo, assim, uma ampla gama de saberes envolvidos de diversas áreas como as ciências políticas, economia, sociologia, engenharia e outras que se inter-relacionam 9 . Portanto, o campo da Saúde do Trabalhador compreende práticas interdisciplinares e interinstitucionais, como técnicas, sociais, políticas e humanas. Tendo atores situados em diversos lugares distintos com o objetivo comum de se produzir saúde, portanto desenvolvem ações com vistas à promoção da saúde, sempre no âmbito de atuação das políticas públicas de saúde 9 . A Política Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora 10 , busca através das ações dos Centros de Referencia em Saúde do Trabalhador (CEREST), no âmbito da Rede Nacional de Atenção Integral a Saúde do Trabalhador (RENAST): Art. 14 : I - desempenhar as funções de suporte técnico, de educação permanente, de coordenação de projetos de promoção, vigilância e assistência à saúde dos trabalhadores, no âmbito da sua área de abrangência; II - dar apoio matricial para o desenvolvimento das ações de saúde do trabalhador na atenção primária em saúde, nos serviços especializados e de urgência e emergência, bem como na promoção e vigilância nos diversos pontos de atenção da Rede de Atenção à Saúde; III - atuar como centro articulador e organizador das ações intra e intersetoriais de saúde do trabalhador, assumindo a retaguarda técnica especializada para o conjunto de ações e serviços da rede SUS e se tornando polo irradiador de ações e experiências de vigilância em saúde, de caráter sanitário e de base epidemiológica. Considerando a importância de se promover a saúde dos trabalhadores proporcionando dignidade frente aos processos de trabalho, torna-se fundamental observar a 16 situação em que se encontram os trabalhadores. E de acordo com pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE11, com a população de trabalhadores nas seis principais cidades metropolitanas do Brasil, mostrou que só no Rio de Janeiro houve aumento ao longo dos últimos oito anos, da população ativa de mulheres, idosos a partir de 50 anos ou mais, apresentando em 2010 maior taxa de crescimento (33,3%) em relação às outras metrópoles, e grande aumento de trabalhadores (33%) na construção civil. De acordo com o Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) o número absoluto de crianças que trabalham, bem como de adolescentes que trabalham em condições ilegais (sem respeito à condição de aprendiz ou às condições de proteção definidas em lei) ainda é muito alto; pois pesquisa realizada pelo Centro de Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) do IBGE mostra que, embora esteja diminuindo segundo a pesquisa, a taxa de trabalho infantil no Brasil ainda é alarmante com 89 mil crianças de 5 a 9 anos trabalhando, e considerando a faixa etária de 5 a 17 anos, são 3,7 milhões. Entre 1995 e 2002, 44.231 trabalhadores se encontravam em condições de trabalho análogas à escravidão 12 , segundo resgate realizado pelo Ministério do Trabalho. Sendo que, em 2012, 2.560 ainda se apresentavam nestas condições 13 . Diante deste quadro, é preciso compreender que ainda estão muito aquém da realidade atual, posto que, embora sejam mencionados como integrais, estes não abrangem toda a população, sendo os mesmos subnotificados e desvirtuados das drásticas condições que ainda vivem os trabalhadores. Por ser o trabalho, reconhecido, inclusive constitucionalmente, um direito fundamental e social, consequentemente esses dados revelam não somente a importância e a necessidade de se promover ações voltadas à promoção da saúde dos trabalhadores, mas um dever do Estado de Direito construir políticas saudáveis que promovam justiça social e resgate a dignidade desses trabalhadores em condições de riscos e em situações de vulnerabilidade, implicando melhorias das condições de trabalho e, consequentemente, qualidade de vida 14 . Devido a grande importância da promoção da saúde para a saúde do trabalhador, encontra-se em consulta pública nº3, desde 17 de maio de 2011, no Ministério da Saúde, uma política que institui as diretrizes da Política Nacional de Promoção da Saúde do Trabalhador do Sistema Único de Saúde (SUS) 15 , que visa promover a melhoria das condições de saúde 17 do trabalhador do SUS, por meio do enfrentamento racional dos fatores de risco e mediante a facilitação ao acesso, às ações e aos serviços de atenção integral à saúde. O Pacto pela Saúde 16 , um acordo interfederativo para abranger um conjunto de reformas institucionais com o objetivo de promover inovações nos processos e instrumentos de gestão, gestores estabelecem metas e compromissos, renovados anualmente, para superar dificuldades apontadas com ênfase na saúde da população. Este está articulado em três dimensões: Pacto pela vida, Pacto em defesa do SUS e Pacto de gestão. No Pacto pela vida foram definidas ações prioritárias no campo da saúde, que foram consideradas impactantes para a situação de saúde da população, dentre estas está a promoção da saúde. Em março do mesmo ano de criação do Pacto pela Saúde do Ministério da Saúde (MS), em 2006, foi publicada a Política Nacional de Promoção da Saúde, que propôs ações que vão para além dos muros das unidades e sistemas de saúde, incidindo sobre as condições de vida e favorecendo a ampliação de escolhas saudáveis por parte dos sujeitos e das coletividades no território onde vivem e trabalham 2 . De acordo com a Política Nacional de Promoção da Saúde 2 deve-se no campo de saúde do trabalhador divulgar informações e definir mecanismos de incentivo para a promoção de ambientes de trabalho saudáveis com ênfase na redução dos riscos de acidentes de trabalho. O direito dos trabalhadores à saúde perpassa o campo de transformação dos processos produtivos, indo além, como um direito à vida. Promover e proteger a saúde dos trabalhadores por meio de ações com vistas à promoção da saúde tornou-se estratégia de diferentes atores e setores responsáveis pela saúde dos trabalhadores. Existem diferentes perspectivas filosóficas, políticas e teóricas envolvidas com o tema promoção da saúde, que dificultam a operacionalização dos projetos em promoção da saúde. Estes acabam por apresentar dificuldades que aparecem como inconsistências, contradições e obscuridades, que muitas vezes, impossibilitam a clareza da distinção das estratégias de promoção das práticas preventivas tradicionais 17 . Por ser um termo que embora se apresente em, praticamente, todas as políticas voltadas à saúde da população, percebe-se que na prática sua operacionalização ora se apresenta como ações de prevenção da saúde realizadas pelo próprio indivíduo, numa perspectiva conservadora da promoção da saúde, que, consequentemente, diminui as 18 responsabilidades do Estado, transferindo a responsabilidade para o indivíduo pelo cuidado de sua própria saúde, e, ora se apresenta, com um sentido mais amplo que enfatiza outra dimensão do discurso de promoção da saúde, numa perspectiva progressista, ressaltando a elaboração de políticas públicas intersetoriais, voltadas à melhoria da qualidade de vida das populações 18 . De acordo com Machado 19 , o campo da Saúde do Trabalhador contribui para o debate no que tange estratégias de ações intersetoriais e coletivas de promoção da saúde voltadas às estratégias de transformação dos processos e ambientes de trabalho, visando a criação de redes sociais e institucionais que forneçam suporte às ações de vigilância em saúde do trabalhador. São polêmicos os sentidos atribuídos ao termo promoção da saúde nos debates, documentos institucionais e práticas de saúde. Alguns sentidos são facilmente identificáveis como, por exemplo, a ideia de promoção da saúde ligada às ações de educação sanitária, grupos de orientação terapêutica, palestras educativas com ênfase na prevenção e controle das doenças, buscando-se mudanças no estilo de vida e adaptação dos indivíduos à hábitos considerados saudáveis. Em outro sentido, remete a discussões mais abrangentes com um olhar para os determinantes de saúde e doença, relacionando a promoção, autonomia e emancipação de sujeitos no cuidado, com a adoção de políticas intersetoriais 20 . Tais variações nos apresentam diferentes usos do termo, privilegiando interesses e objetivos distintos. E, embora seja mencionada a promoção da saúde do trabalhador na política e por diversos outros atores do campo da saúde do trabalhador, não há clareza sobre qual a concepção de promoção da saúde é utilizada, e como ela se operacionaliza na prática, assim como as ações que são consideradas de promoção da saúde dos trabalhadores, na visão dos atores executores da política do campo da saúde do trabalhador. A promoção da saúde em diversos estudos 24 , está posta, de forma clara, para a saúde ocupacional como melhoria das condições de trabalho e qualidade de vida no trabalho, através de ações educativas e preventivistas, porem encontramos autores 22 , que abrangem o termo da promoção de forma mais abrangente para a saúde do trabalhador, como ações voltadas a intersetorialidade, transversalidade das ações, construção de políticas públicas, participação social, o que confirma as diretrizes da política nacional de promoção da saúde. 19 A promoção da saúde é uma política de Estado que permeia diversas outras políticas de saúde, que dependendo dos seus atores sociais, pode ser desenvolvida de diversas formas atribuindo-lhe diversos sentidos. Em vista desse contexto, o termo “promoção da saúde” tem sido muito discutido em todas as esferas do campo da saúde, tornando-se base para a sustentação de diversos programas destinados a melhoria da saúde e qualidade de vida da população 23 . Mas, embora tenha se expandido quase que como uma regra para a implantação de um programa, na prática do campo da saúde, seu entendimento ainda se revela, através de estudos, muito abstrato, tornando-se, muitas vezes, um desafio para o gestor operacionaliza-la. No entanto, sua operacionalização se dá através da produção de estratégias que se desdobram em ações, metas e objetivos que refletem a singularidade de cada gestão, visando- se a transformação das condições de vida e de trabalho. Dessa forma, esse estudo realizou uma reflexão sobre quais os sentidos da promoção da saúde que foram produzidos por trabalhadores que atuam no campo político e prático executando ações que almejam promover a melhoria da Saúde dos Trabalhadores. De acordo com Orlandi 24 , os sentidos refletem a interpretação do sujeito, onde se produz resignificações a partir do objeto simbólico imbricado pela ideologia e sua história. Por conseguinte, esse trabalho não pretendeu apresentar a verdade, posto que não existe verdade a ser desvendada, mas uma ciência entendida como a produção de discursos e de significados que percebem singularidades de seus sujeitos. Dessa forma, nos apropriamos do nosso olhar imbricado, a fim de responder as inquietações que promoveram a realização dessa pesquisa, onde buscamos compreender, interpretar os sentidos buscando significados possíveis à configuração do campo da promoção da saúde do trabalhador. 20 1.1 OBJETO DO ESTUDO O que os trabalhadores do campo da Saúde do Trabalhador pensam em relação à Promoção da Saúde? 21 2 A RELAÇÃO TRABALHO-SAÚDE NO CAMPO DA SAÚDE PÚBLICA COMO UMA QUESTÃO SOCIAL A preocupação com a saúde fundamentou-se como resultado de diversos acontecimentos e transformações sociais, principalmente na construção do entendimento da relação do trabalho com a saúde, que se configurou de diferentes formas de acordo com o contexto histórico de cada lugar. Na antiguidade foram encontrados registros em papiros egípcios sobre a observação médica da influência de certas ocupações sobre a saúde da população. No entanto, não havia uma investigação sistemática que estabelecesse tal elo, e nem interesse na saúde dos trabalhadores 25 . Nessa época, a organização da atenção médica fornecida às diferentes classes era desigual, hierárquica, o que fazia com que um escravo ou servo não se sentisse no direito de “se dar o luxo” de ficar doente. E muito poucas pessoas tinham recursos e tempo para se submeterem aos cuidados médicos sob tais circunstancias. Com o passar dos anos e o surgimento de pragas, pestes e até a dizimação de populações inteiras, começa a ser valorizada a atenção médica de forma regular, que apesar do reconhecimento da importância dos cuidados médicos para as populações, não havia desenvolvimento sistemático que fizesse relação com fatores sociais e culturais 25 . Com a Renascença outras observações médicas permitiram fazer a correlação entre fatores sociais e as condições de saúde 26 . Portanto, já no século XV, médicos já sinalizavam para a questão social e os benefícios econômicos que poderiam ter cuidando da saúde da população, que acabava por custar menos ao Estado cuidar do paciente que deixá-lo morrer. Relatos deixados por Bernadino Ramazzini em 1713 27 , faz menção a relação da saúde com a condição social em que viviam os trabalhadores, e apesar de possuírem caráter evidente humanista, também, apresentavam a preocupação com relação a produtividade. Dessa forma, Ramazzini 27 , estabeleceu o conceito básico da medicina social que é a importância de se fazer relação entre a saúde de dada população e suas condições de vida. Este foi o surgimento de um novo paradigma no período do mercantilismo, a preocupação com as questões sociais relacionadas à saúde, a fim de obter progresso nas atividades socioeconômicas a serviço dos interesses do Estado. 22 Entretanto, embora os países começassem a se preocupar com a saúde de suas populações acreditando ser um elemento essencial para o enriquecimento econômico, buscaram formas distintas de promovê-la. A relação trabalho-saúde surge no campo da saúde pública e se insere, com o advento do capitalismo, como uma questão social. Sendo esta relação entendida e apresentada de diferentes maneiras nos diversos países. A importância da saúde da população para a prosperidade econômica ganhou força no sentido de se promover políticas nacionais de saúde, que embora tenham se desenvolvido em diversos países do continente simultaneamente, cada uma dessas apresentou suas particularidades e contribuições. 25 Na Inglaterra ocorreram diversas contribuições para estudos e pesquisas sobre a mortalidade e morbidade da população, como o controle de doenças transmissíveis, a fim de prevenir a diminuição da população, como também, o isolamento de doentes preocupando-se com a contaminação, entre outros feitos 25 . Diante do contexto da migração das populações para as cidades e crescimento industrial, começa a surgir a valorização do processo de trabalho como um importante componente para o crescimento econômico, surgindo a valorização e regulamentação da atenção médica, a fim de provê-la para aqueles que dela necessitavam, que também tinha a ver com uma preocupação com o desperdício de recursos humanos e a construção de hospitais, laboratórios e o Instituto Nacional de Saúde 25 . Na Alemanha, devido às condições gerais do país, na busca por um processo de unificação, até mesmo por não se compor um exército, os assuntos de saúde foram tratados a partir de leis e medidas administrativas que ordenavam o que o povo deveria ou não fazer, ficando conhecida sua intervenção na saúde como polícia médica 25 . Na época a Alemanha não tinha uma Unidade Nacional, nem a própria língua era unificada nas 28 repúblicas. Desta forma, o Estado Alemão tenta exercer o controle da população com imposições, regras e normatizações, a fim de se fortalecer seu poder 28 . Mesmo que o propósito do Estado, na Alemanha, fosse zelar pelo maior bem estar e segurança do povo, cabia somente ao legislador determinar qual era o maior bem estar para a população, ao ponto de o Estado ter o direito de intervir nos assuntos mais específicos das vidas das pessoas, alegando que visava o interesse geral. Pois como apresenta Rosen 25 , a finalidade era promover a melhoria da saúde e expansão populacional. Como exemplo, as 23 pessoas que sofressem de doenças hereditárias ou que fossem incapazes de procriar não seriam permitidas casar. De acordo com Rosen 25 , no sistema cameralista a ideia de Police, derivada da palavra grega politeia era um conceito chave em relação aos problemas de saúde e doença. Onde o governo estabelecia regulamentos para serem seguidos, a fim de promover a prosperidade e o bem-estar do país e do povo. Embora já ocorresse o poder sistematizado do Estado sobre a população, o termo polícia médica foi empregado pela primeira vez em 1974 por Wolfgang Thomas 25 , quando os médicos eram obrigados, além de tratar o doente, supervisionar a saúde da população. Dessa forma, o modelo da policia médica foi uma forma do governo absolutista Alemão realizar uma análise sistemática dos problemas de saúde da população, o que corroborou com novos estudos da relação social com o processo saúde-doença. A França também teve sua concepção de saúde influenciada pelo mercantilismo, porém, o termo “polícia médica”, apesar de ter origem francesa, não teve o mesmo desenvolvimento sistemático que na Alemanha. Pois a França, assim como também na Inglaterra, vivia-se um contexto revolucionário ideológico, onde o capitalismo já estava se desenvolvendo e os franceses e ingleses tinham grande mobilização social com uma força política muito maior. Contudo, na França, houve maior preocupação com a saúde, relacionada ao processo de urbanização, que devido, principalmente, ao crescimento populacional, havia poucas moradias, superlotação, gerando grandes epidemias, como peste e varíola. As condições de trabalho, também, eram precárias, ambientes insalubres, periculosos, além dos efeitos do desemprego periódico que ameaçavam o equilíbrio de vida do trabalhador e sua família. O quadro piorou após as guerras napoleônicas, onde os baixíssimos salários faziam com que o trabalhador tivesse que se dedicar de 13 a 16 horas por dia, o que levou as mulheres e crianças ao mercado de trabalho para complementar a renda 25 . Todo esse contexto trouxe reflexões sobre as terríveis condições de trabalho e a necessidade da mão de obra para o crescimento econômico, que anos após, o governo Francês elaborou a primeira legislação trabalhista, regulamentando o trabalho infantil nas fábricas, o que levou a atenção dos médicos, escritores, economistas e funcionários públicos 25 . 24 Diante de tantas injúrias, um grupo de médicos e higienistas realizaram investigações e estudos estatísticos das condições reais da vida dos trabalhadores nas comunidades urbanas francesas, e as circunstâncias, sob as quais, eles trabalhavam, nas lojas e fábricas, e alertaram para os problemas de saúde. Estas e outras questões levaram a França a providenciar um suprimento de água potável, um sistema adequado de esgoto e outros recursos para melhorar as condições sanitárias e de saúde da população. A França se tornou, na primeira metade do século XIX, líder em medicina e higiene, consequência de diversos estudos sobre mortalidade diferencial e no efeito de fatores tais como classe social, ocupação, raça, prisão, relação entre pobreza e doença, intemperança e falta de saneamento adequado e a saúde, entre outros 25 . Este modelo de atenção a saúde pública, com preocupação higiênista e urbana, foi trazida para o Brasil, no séc. XX, com ênfase nos problemas urbanos, a fim de promover melhorias na qualidade do ar, solo, fluxos de pessoas. Entretanto trouxe maior intervenção Estatal no desenvolvimento das políticas sanitaristas, como exemplo o “bota abaixo”, a revolta da vacina, entre outros fatos. Grandes higienistas compartilhavam seus achados com outros atores sociais da época, como o higienista Parent-Dchâlet, que contribuiu com um tratado sobre prostituição e relacionou diversas ocupações a problemas de saúde, como o trabalho em esgotos, efeitos do fumo nos trabalhadores que o manipulavam. Naquela época, houve outros atores sociais, que, também, contribuíram para a atenção de problemas de saúde relacionados à ocupação. Tais como: publicação do livro sobre saturnismo, livro sobre as doenças dos trabalhadores em fábricas de fósforos, estudo pioneiro da necrose óssea 25 . Neste contexto se desenvolve uma concepção social, de uma medicina social, donde emergiu o termo higiene social, que fora usado em um trabalho de Foucault sobre a prevenção de doenças crônicas, especialmente a tísica pulmonar. Onde fazia a relação entre as condições insalubres de trabalho com problemas de saúde, a fim de melhorar as condições morais dos trabalhadores, pois para ele a pobreza e o desemprego levariam à doença, vício e roubo, crimes de violência e suicídio 25 . 25 Foucault 28 , faz uma crítica a concepção de capitalismo, fins do séc. XVIII e início do XIX, onde a sociedade capitalista, antes de tudo, socializou o corpo enquanto força de produção e de trabalho, como componente real de uma estratégia biopolítica da medicina, pois, para ele, foi somente em último lugar, 2ª metade do séc. XIX, que se colocou o problema do corpo, da saúde e do nível da força produtiva dos indivíduos. Desta forma Foucault 28 , divide a medicina social em três etapas: Medicina de Estado, medicina urbana e medicina da força de trabalho. A medicina de Estado, que se desenvolveu na Alemanha por diversos fatores, sobretudo no sec. XVIII. Isto se deve ao fato da Alemanha ter se unificado em um Estado unitário somente no séc. XIX. Pois havia uma justaposição de pequenas unidades de pseudo-estados muito pouco estatais. A pequena dimensão dos estados, e os confrontos desequilibrados, tornou-se necessária a consciência por um funcionamento estatal. Outro fator importante fora a situação da Alemanha nesse período que se encontrava devastada pelas guerras e em estagnação econômica. Diante de tal situação, a burguesia uniu forças, com seus recursos, funcionários, sua capacidade entre outros, para uma organização dos Estados. Como já foi dito anteriormente, a criação de funcionários médicos evoluiu progressivamente na Alemanha, no sentido de domínio de diversas áreas do campo da saúde. Normalizou-se a profissão médica, estes passaram a uma organização médica estatal, caracterizando a medicina de estado. Esta medicina não valorizava o corpo do trabalhador, mas o corpo dos indivíduos enquanto constituintes do Estado, a força, não do trabalho, mas estatal. Na França esse fenômeno do desenvolvimento da medicina social foi inteiramente urbano. No contexto da época a França passava por revoltas camponesas até o séc. XVII, e no séc. XVIII onde ocorreram mais intensamente as revoltas urbanas. A inquietude político- sanitário partia, principalmente, do medo urbano adquirido pela população devido a diversos fatores como das epidemias urbanas, dos cemitérios que invadiam a cidade aos poucos com amontoamento dos corpos mortos, do aumento da população, das casas altas demais, do esgoto entre outros. Estas questões levaram a França a estabelecer um plano de urgência, onde havia métodos de vigilância exaustiva dos indivíduos vivos e mortos, hospitalização e expulsão dos doentes, constituindo-se na 2ª metade do séc. XVIII em uma medicina urbana, que analisava as situações perigosas do espaço urbano 28 . 26 Esta medicina urbana caracterizou-se por três principais objetivos: se livrar de tudo que causava doenças, como exemplo os mortos; controle da circulação da água e do ar; e por último reorganização da cidade e saneamento básico. Dessa forma, a inserção da medicina no funcionamento geral do saber médico se fez através da socialização da medicina coletiva, social e urbana. Ou seja, a medicina urbana não é uma medicina do corpo humano, mas das coisas: ar, água, decomposições, fermentos, das condições de vida e do meio de existência. Este fato foi importante por fornecer noções sobre a influência das condições sociais para a futura medicina do organismo humano, como a relação entre salubridade e saúde. A medicina social se objetivou, na Inglaterra, como controle da força de trabalho, e o pobre aparece como um perigo. Com a criação do sistema postal e carregadores foi-se retirando ocupações dos pobres e impedindo-os de seu ganha-pão. E com a epidemia do cólera se produziu um medo político-sanitário da população, levando a divisão do espaço urbano entre ricos e pobres 28 . A Lei dos pobres foi o marco para a socialização da medicina inglesa. Essa legislação continha formas de controlar a saúde da população pobre, fornecendo uma assistência controlada de intervenção médica. No entanto, se tratava mais de um sistema autoritário que propriamente cuidados médicos, pois obrigavam a população a se vacinar, a declarar suas doenças para registro, destruição dos focos considerados insalubres nos seus espaços, objetivando assistir toda a população de pobres e não somente o individual (ROSEN, 1983). No entanto, a Inglaterra investiu, também, em trabalhadores da saúde e diversas pesquisas estatísticas sobre as doenças e fenômenos sociais 25 . A medicina social inglesa possibilitou a construção de um novo paradigma na saúde pública: a assistência médica aos pobres, controle de saúde da força de trabalho e esquadrinhamento geral da saúde pública, através de três sistemas médicos superpostos e coexistentes: uma medicina assistencial destinado aos pobres, uma medicina administrativa encarregada de problemas gerais e uma medicina privada, que beneficiava quem tinha meios de pagar 28 . E, durante esse período, os termos saúde pública, medicina social e higiene social eram tratados como sinônimos. E a mudança decorreu depois da reforma sanitária com as novas descobertas bacteriológicas 25 . 27 Em suma, a relação entre trabalho-saúde-doença emergiu do campo da saúde pública, e foi se configurando com os acontecimentos e ganhando novas concepções. Ao longo da história, percebem-se evidentes interesses econômicos e políticos associados às decisões do Estado. E quanto aos problemas de saúde dos trabalhadores, estes foram evidenciados e se configuraram no decorrer da história, além de se apresentarem como de extrema importância para a saúde populacional. 2.1 A RELAÇÃO TRABALHO-SAÚDE NA CONSTRUÇÃO DO CAMPO DA SAÚDE DO TRABALHADOR NO BRASIL A preocupação da saúde relacionada com o trabalho se desenvolve no Brasil, ao longo da história, com um olhar médico-assistencialista e assistencial-sanitarista, ainda hegemônicos na saúde pública. No período colonial, com a chegada da família real ao Brasil, surge um grande interesse na manutenção da mão de obra saudável para conservar os interesses econômicos da realeza. Dessa forma, promovem a vinda de mais médicos da Europa para o cuidado da saúde da população, quando deram inicio a criação das primeiras escolas especializadas em saúde, institucionalizando-se as práticas médicas aos moldes europeus 29 . Algumas ações coletivas para a manutenção da saúde do trabalhador começavam a ser implementadas como a quarentena, afastamento do trabalhador do ambiente de trabalho por 40 dias seguidos, a fim de se evitar a propagação das doenças, sem uma preocupação efetiva com o tratamento do doente 29 . No entanto, diante das condições precárias e insalubres que viviam os trabalhadores, estes começaram uma série de revoltas e reivindicações por melhores condições de vida no trabalho. No período de 1791 a 1930 surgiram, no Brasil, diversos movimentos e greves como reivindicações por melhores condições de trabalho e dignidade. Até a década de 30, as condições de trabalho eram semelhantes as da Europa e dos Estados Unidos de um século antes, como jornada de trabalho ilimitada, sem descanso semanal nem férias, trabalho pesado, extenuante, independente da idade e gênero, com mulheres e crianças, assim como, ambientes 28 insalubres, úmidos, com fumaça, vapores, tanto dos portos e da cafeicultura como nas fábricas e construção civil 30 . Em resposta ao movimento social e na busca para o controle da classe trabalhadora, foram concedidos alguns benefícios sociais pelo governo Vargas, como a obrigatoriedade da carteira profissional para os trabalhadores urbanos, a definição da jornada de trabalho de oito horas, o direito a férias e a lei do salário mínimo 29 . 2.2 O DESENVOLVIMENTO DO CAMPO DA MEDICINA DO TRABALHO NO BRASIL O serviço médico empresarial ganhou força no Brasil em 1953, quando a Organização Internacional do Trabalho (OIT), criada em 1919, através da sua recomendação nº97, fomentou a formação de médicos do trabalho qualificados, incentivando a inclusão de serviços médicos nas empresas, a fim de promover “proteção da saúde dos trabalhadores”, criando, em 1958, “Serviços de Medicina do Trabalho”8. A medicina do trabalho teve sua origem na Inglaterra em resposta às consequências da Revolução Industrial em meados do séc. XIX, que causara um processo acelerado e desumano de produção nas indústrias 8 . Nascida no discurso da revolução industrial, a medicina do trabalho, traz a saúde ocupacional, como forma de prevenção e reparação de danos à saúde no trabalho. E se consolida, nos anos subsequentes, como uma das vertentes mais primitivas do direito trabalhista 31 . Neste modelo de atenção à saúde do trabalhador, eram postos médicos dentro das fábricas a fim de promover uma assistência médica com o olhar sobre o “corpo doente”, não sobre as condições de trabalho precárias. Dessa forma, simultaneamente, transferia-se a responsabilidade do adoecimento do trabalhador para o médico, protegendo assim o empregador. Por mais que soe louvável e seja importante a permanência de um médico nas empresas, como uma forma de promover a saúde do trabalhador, realização de exames periódicos, há controvérsias, já que esta medicina do trabalho muitas das vezes acaba por favorecer e beneficiar o empregador em detrimento dos direitos dos trabalhadores. Pois de acordo com Mendes 8 , assim como na Inglaterra, esse médico escolhido deveria ser de inteira 29 confiança do empresário, os serviços deveriam ser centrados na figura do médico e este assumia todas as responsabilidades por problemas de saúde e acidentes de trabalho. Estes serviços também levavam a dependência do trabalhador, a partir do momento em que havia uma visão inteiramente empresarial, não dando oportunidade do trabalhador pôr sua concepção a respeito do trabalho exercido, promovendo assim um controle da força de trabalho. Através dos serviços médicos organizados nos locais de trabalho, tornara-se, também, mais fácil a seleção de mão de obra, pois se priorizava a mão de obra com melhores condições físicas, já visando evitar maiores problemas futuros, como absenteísmo, gastos com obrigações sociais, entre outros. Alem disso, promoviam-se o controle sobre a mão de obra já empregada, como a anotação de licenças, faltas e casos de doenças 8 . Dessa forma, as empresas oneravam suas obrigações, e tratavam o adoecimento como externos a ela, tornando estes um problema a ser resolvido pelo médico e/ou pela previdência social. Estas e outras questões, como a evolução tecnológica e as novas demandas do capitalismo com relação à mão de obra, trouxeram reflexões sobre a insuficiência da medicina do trabalho para dar conta de um novo universo emergente de reivindicações e insatisfações trabalhistas, assim como também da constatação de sua limitação quanto à satisfação dos problemas de acidentes e adoecimentos advindos do processo de trabalho danosos. 2.3 O DESENVOLVIMENTO DO CAMPO DA SAÚDE OCUPACIONAL NO BRASIL Os anos da II Guerra Mundial trouxeram condições extenuantes de trabalho pesado e doloroso, tão quanto aos da própria guerra, levando a perda de vidas de trabalhadores em massa, assim como também inúmeras indenizações a serem pagas pelas empresas devido a doenças incapacitantes advindas do trabalho 8 . Em uma nova tentativa de responder às insatisfações e tentar solucionar os problemas advindos do trabalho, surge a “Saúde Ocupacional”, que passa a executar um serviço, a princípio, dentro das fábricas de forma multidisciplinar e com ênfase na higiene “industrial”, com um olhar voltado para os riscos ambientais8. A partir desse novo paradigma, com o passar dos anos, foram realizadas e reconhecidas importantes pesquisas sobre a saúde 30 dos trabalhadores, das doenças do trabalho e estudos epidemiológicos relativos à saúde ocupacional. No Brasil, se reproduziram os processos ocorridos em outros países. Surgiram cursos irradiadores de saúde ocupacional em nível de especializações, mestrados e doutorados. Na legislação expressou–se através da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) reformada na década de 70, e criação de Normas Regulamentadoras para os ambientes de trabalho (NR`s), embora mantidas na legislação previdenciária e voltada, exclusivamente, para os trabalhadores do setor formal 8 . Em sua essência a saúde ocupacional reproduz a medicina do trabalho, pois a interdisciplinaridade não é concretizada e é dificultada pelas lutas corporativas. A contribuição da capacitação do aumento do conhecimento e tecnologia de intervenção não condiz com a evolução da transformação dos processos de trabalho, e apesar de enfocar o aspecto coletivo de trabalhadores, continua a tratá-los como “objetos” das ações de saúde, e não agentes participativos. Esta limitação da medicina ocupacional foi corroborada em pesquisa realizada com a análise sobre os riscos ambientais e uso de equipamentos de segurança e proteção pessoal numa indústria de mineração, elaborada pela Secretaria do Trabalho e Previdência Social (STPS) do México, cuja intenção foi controlar as condições de higiene e segurança dos centros de trabalho, através de guias de inspeção. Esta mostrou que, além de não se apresentar outros elementos importantes do ambiente, como por exemplo a não verificação de outros agentes químicos, importantes para a saúde do trabalhador, como poeira e gases analisados, apresentou uma ausência ainda maior com relação àquela que está entre os homens e seu trabalho. Onde, o manual de inspeção visualizou um espaço despovoado, pois os operários aparecem apenas num momento e não como tais, mas como portadores potenciais do “equipamento de proteção pessoal”32. É como se a relação trabalho-saúde se sustentasse e tivesse relevância apenas aos agentes físicos e químicos presentes nos ambientes, e, unicamente, os responsáveis por causar enfermidades e condições inseguras que levam danos por acidentes. Isto expressa uma notável coisificação do ser, pois eliminando a atividade do trabalho e a relação social, as coisas ganham relevância, como fatos e dados a-históricos, e se perde a noção de trabalho como processo e transformação 32 . 31 Este procedimento fere o entendimento da relação social, ou seja, os elementos mais importantes do trabalho, e sobra apenas um espaço físico delimitado – o local de trabalho – provido de condições ambientais, que, também, não se distingue de outros espaços, o que torna-se “coerente” sistematizar normas que servirão, também, para os outros espaços semelhantes. Desta forma, prevalece uma noção quantitativa em que os limites de tolerância e normas criadas tornam-se verdades, embora a própria higiene ocupacional reconheça esse déficit 32 . Este método tem como utilidade restrita a sistematização das condições inseguras, que podem facilitar certas medidas corretivas do ambiente de trabalho, embora não permita ter uma visão abrangente e dinâmica dos acidentes de trabalho. Com o passar dos anos, o mundo das relações trabalho-saúde e capital foram se tornando ainda mais complexos, como a exclusão do trabalhador autônomo e informal do sistema de assistência da saúde ocupacional, a alienação do trabalhador ao processo produtivo cada vez mais afastado do saber operário, a manipulação empregador-médico do trabalho, as cargas de responsabilidades postas sobre o trabalhador em prol do bem estar empresarial, os problemas psicológicos advindos do trabalho, dentre outras questões que a medicina do trabalho e a saúde ocupacional continuavam sem responder, mostrando cada vez mais sua insuficiência e manipulação do trabalhador. Logo, a saúde ocupacional, se revelou em inúmeras insuficiências, que embora apresentasse uma concepção interdisciplinar, esta não se concretizava na prática, já que as atividades em prol dos trabalhadores eram desarticuladas e dificultadas por lutas corporativas, promovendo-se a atenção à saúde do trabalhador no âmbito do trabalho, excluindo outros trabalhadores da sociedade que também necessitavam, mas não possuíam vínculos empregatícios 8 . Segundo Stout 33 as abordagens da saúde ocupacional têm suas concepções baseadas na multicausalidade, que reconhece a multiplicidade ou interação de vários agentes físicos, químicos, mecânicos e biológicos como causadores de acidentes e doenças. Valoriza os aspectos externos ao trabalhador, reproduzindo a forma tradicional da engenharia e da medicina de encarar os acidentes e as doenças, fenômenos de ordem técnica ou biológica centrados no indivíduo, e adotando medidas saneadoras sobre o ambiente de trabalho, higiene no trabalho: (i) Abordagem multicausal e interprofissional, (ii) Centrada nas relações técnicas do trabalho, (iii) Intervenção baseada na diminuição da frequência e no nível de exposição e (iv) Relação risco X doença 32 2.4 O CAMPO DA SAÚDE DO TRABALHADOR O conceito da saúde do trabalhador situa-se no quadro geral das relações entre saúde e trabalho e apresenta-se como um modelo teórico de orientação às ações na área da atenção à saúde dos trabalhadores, em seu sentido mais amplo, desde a promoção, prevenção, cura e reabilitação, incluídas, as ações de vigilância sanitária e epidemiológica 32 . Dessa forma, a saúde do trabalhador agrega um conjunto de conhecimentos oriundos de diversos campos, tais como Medicina Social, Saúde Pública, Saúde Coletiva, Clínica Médica, Medicina do Trabalho, Sociologia, Epidemiologia Social, Engenharia, Psicologia, entre tantos outros, que aliados ao saber do trabalhador sobre seu ambiente de trabalho e suas vivências das situações de desgaste e reprodução, estabelecem uma nova forma de compreensão das relações entre saúde e trabalho e propõe uma nova prática de atenção à saúde dos trabalhadores e intervenção nos ambientes de trabalho. O campo da saúde do trabalhador é um campo tanto de produção de conhecimentos, como de práticas no âmbito da saúde pública, que tem por base os princípios do SUS, que abrangem acesso universal, integralidade da atenção, com ênfase nas ações de prevenção e promoção, descentralização e participação social 9 . Ao longo da história, diversas foram as tentativas de se obter uma política ou um modelo para a promoção da saúde do trabalhador, que contemplasse de forma justa as necessidades dos trabalhadores. Primeiro o desenvolvimento da medicina do trabalho, que tem o olhar voltado para o corpo do trabalhador, cujo instrumental utilizado será integralmente a clínica médica, promovendo uma relação monocausal entre o médico e o corpo do trabalhador. Em segundo lugar, através da saúde ocupacional, identificou-se a necessidade de olhar para o ambiente físico do trabalho, onde criaram-se diversos instrumentos como normas regulamentadoras, limites de tolerância, análise do ar, ruídos, a fim de identificar possíveis agentes físicos causadores de doenças profissionais 34 . Embora todos esses modelos de atenção à saúde do trabalhador tenham importância em suas especificidades, ainda contemplam apenas uma tímida parte das necessidades dos trabalhadores, mostram-se insuficientes e, por oras, até mesmo amenizadores das injustiças e injúrias causadas aos trabalhadores no mundo do trabalho. 33 Entre idas e vindas em busca de soluções para tantas injúrias e injustiças que envolvem os trabalhadores, a partir do final da década de 70, num processo de redemocratização, emergiram inúmeros movimentos sociais que influenciaram a configuração do campo da saúde do trabalhador, que tem seu referencial teórico nos processos de trabalho e no olhar do trabalhador como ator e agente ativo. O termo “saúde do trabalhador” surge no Brasil no bojo do Movimento pela Reforma Sanitária, que se intensificou no país a partir da década de 1980, tendo, na Reforma Sanitária Italiana, seu exemplo inspirador 35 . A união dos esforços de profissionais de saúde, tanto da academia quanto de serviços, articulados com os trabalhadores, dentro da emergência do Novo Sindicalismo, estabeleceu as bases desse conjunto de saberes e práticas denominado Saúde do Trabalhador. Ele nasce como contraponto aos modelos hegemônicos das práticas de intervenção e regulação das relações saúde-trabalho da Medicina do Trabalho, Engenharia de Segurança e Saúde Ocupacional. A modificação da terminologia dos serviços de atenção à saúde de Serviços de Medicina do Trabalho e/ou Saúde Ocupacional para Serviços de Saúde do Trabalhador segue uma tendência mundial nos países que passaram por movimentos semelhantes, como nos aponta Parmeggiani 36 . O momento culminante de mobilização popular pela saúde do trabalhador no Brasil dá-se na VIII Conferencia Nacional de Saúde, em 1986, e na I Conferência Nacional de Saúde do Trabalhador, também em 1986. A afirmação do movimento dentro do campo institucional acontece na IX Conferência Nacional de Saúde e na II Conferência Nacional de Saúde do Trabalhador em 1994 37 . Consolida-se, dessa forma, como conceito dentro dos textos legais da Constituição de 1988 e na Lei Orgânica da Saúde 38 . Tem-se a seguinte definição legal no artigo VI da lei 8.080: “conjunto de atividades que se destina, através de ações de vigilância epidemiológica e vigilância sanitária, à promoção e proteção da saúde dos trabalhadores, assim como visa à recuperação e reabilitação da saúde dos trabalhadores submetidos aos riscos e agravos advindos das condições de trabalho”. Enquanto na medicina do trabalho e na saúde ocupacional os trabalhadores são vistos como pacientes e objetos de intervenção profissional, no campo da saúde do trabalhador eles são considerados os sujeitos políticos e coletivos, que possuem saberes enriquecidos de experiências que são fundamentais para a transformação do processo de trabalho 9 . Dessa forma, o campo da saúde do trabalhador se diferencia, principalmente, por analisar os processos de trabalho e promover a participação ativa do trabalhador, valorizando seus saberes como fator essencial para a promoção de sua saúde. 34 2.4.1 Os processos de trabalho O trabalho é um processo entre o homem e a natureza, que, através da atividade orientada a um fim, o transforma 39 . Em qualquer atividade humana o processo de trabalho envolve a componente ‘matéria prima’, que será o objeto de estudo. Os meios de trabalho, que é tudo que se encontra entre o objeto, o trabalhador e o trabalho propriamente dito, que é a força de trabalho humana, que tem valor de uso 39 . O trabalho atravessa todas as transformações sociais. Desde a matéria prima, que é resultado de trabalho anterior, até o próprio resultado do processo 40 , no entanto, na visão capitalista, todo este processo assume a característica de mercadoria. O trabalho perde, no decorrer do tempo seu valor, que passa para o produto que será vendido. Na lógica capitalista sem percebermos nos tornamos vítimas e ao mesmo tempo colaboradores do processo de exploração. E, muitas vezes, reproduzimos a desumanização do trabalho, que foi resultado da ação humana. Como exemplo simples, podemos citar que ao comprarmos um produto damos características a este, de acordo com sua marca, e não como um objeto que fora fruto de trabalho anterior construído por determinados trabalhadores, e transferimos os méritos do trabalhador, do seu serviço e sua criatividade, à marca do produto, ou empresa que vende o produto. Para o capitalista o valor do trabalho é apenas o consumo da mercadoria, força de trabalho por ele comprada que necessita que acrescente a ela meios de produção para seu consumo 39 . E a ganância capitalista leva ao excesso de consumo, então, perde-se a produção para necessidade e cria-se uma produção voltada a contemplação dos desejos humanos. Ao desenvolver o processo de valorização, o capitalista busca produzir um valor de uso que tenha um valor de troca. E desta forma, produz uma mercadoria em que seu valor seja maior que todos os valores atribuídos a sua construção, como os meios de produção e a forma de trabalho empreendida. Portanto, o objetivo é que tenha não somente um valor, mas mais que um valor, uma mais-valia 39 . O conceito de processo de trabalho foi elaborado para interpretar o modo de acumulação de capital no trabalho produtivo industrial e das fabricas, que também transparece na medicina do trabalho e na saúde ocupacional, e embora possua a mesma racionalidade técnica e organizacional no processo de valorização econômica, este se tornou atualmente muito mais complexo no pós-reestruturação produtiva 9 . 35 Estas e outras questões promoveram a busca por um novo olhar para a saúde dos trabalhadores, que sofreu influências de outros países que lutavam por melhorias das condições de trabalho, assim, por exemplo, na Itália, através do movimento operário, em 1970, é proposto o “Estatuto dos Trabalhadores” que incorporaram princípios fundamentais da agenda do movimento dos trabalhadores como: a não delegação da vigilância da saúde ao Estado; a não monetização do risco, a validação do saber dos trabalhadores; avaliações e estudos independentes; fiscalização acompanhada e o melhoramento das condições de trabalho 8 . O Modelo Operário Italiano (MOI) valoriza a participação efetiva do trabalhador. Tem sua origem e formulação realizada por um grupo de operários e profissionais em Turim, na década de 60. Onde se produziu um método de produção de conhecimento para a ação operária, num campo reconhecido como de confrontação e conflitos de classes 32 . O principal propósito do MOI era combater a nocividade nos ambientes de trabalho, transformando-se em referencial metodológico para as questões ambientais no trabalho 43 . Neste método, define-se o ambiente de trabalho como “o conjunto das condições de produção, nas quais a força de trabalho e o capital se transformam em mercadoria e lucro”, ou seja, busca-se diferenciá-lo da forma como é conceituado na medicina do trabalho, caracterizando-o como a expressão concreta ou meio do processo de valorização capitalista 32 . Durante o desenvolvimento do método foram definidos quatro grupos: o primeiro abrange os fatores que representam os fatores de dentro e fora da fábrica como temperatura, ruído, ventilação iluminação; o segundo abrange os fatores de risco característico do respectivo ambiente, no caso da fábrica, poeiras, gases, vapores, entre outros, o terceiro grupo representa a fadiga derivada do esforço físico, e o quarto grupo inclui o restante dos fatores que causam fadiga, ou seja, os ritmos de trabalho, a monotonia e repetitividade, tensão nervosa, posições incomodas e a responsabilidade inadequada. E nessa construção, ressalta-se características fundamentais que o distingue dos outros métodos já empregados, como o compartilhamento de conhecimentos entre o trabalhador e o técnico manipulador do conhecimento específico, a contribuição e valorização da experiência operária, promoção do conhecimento ligado à ação transformadora e a participação e intervenção operária dotada e valorizada de saberes 32 . 36 Dessa forma, esse método se constitui um importante referencial para a configuração do campo da Saúde do Trabalhador, pois traz importantes feitos que dão base para a luta do movimento social na busca por justiça e dignidade à classe trabalhadora. Nas décadas de 70 e 80 tivemos um conturbado período de reestruturação econômica e produtiva, que alterou em muito a organização produtiva, através de um novo processo de acumulação: acumulação flexível: esta entrou em conflito com a rigidez do modelo fordista, de excesso de produção, para uma nova forma de exploração do capital, que se baseia no surgimento de setores de produção inteiramente novos, novas maneiras de serviços financeiros, novos mercados, organização comercial, tecnológica e organizacional, com vários padrões de desenvolvimento desigual 41 . As formas de exploração passaram do interior das fábricas, que ainda havia uma organização e sistematização dos serviços, apesar de também exploratória, para trabalhos precários, sem vínculos, subempregos, subcontratações, trabalho temporários, de acordo com a demanda, entre outros. Claro que associado a isto, temos um enfraquecimento sindical 41 , a fragmentação das categorias profissionais que enfraqueceu o poder democrático dos trabalhadores em geral 29 . Onde trouxeram o “medo do desemprego” e aumentaram ainda mais a submissão humana à exploração do capital. Os arranjos de empregos flexíveis à primeira vista podem parecer, de certa forma, benéficos, por fornecer ao trabalhador a “flexibilidade do processo produtivo”, porém, se analisarmos em sua totalidade, este apresenta importantes pontos negativos com relação à segurança no emprego, aos direitos trabalhistas, níveis salariais entre outros 41 . O que leva a compreensão da transferência do trabalho “intra-muros” para “dentro do trabalhador”, como se internalizado nele, e este trabalhador passa a trabalhar intermitentemente, principalmente, quando relacionado a vínculos trabalhistas frágeis como terceirização, subempregos, trabalhos por demandas, entre outras formas subumanas e vulneráveis. Para Antunes 42 , não há nada essencialmente novo no impulso para a flexibilização, o que existe é uma tendência perigosa de se exagerar na flexibilidade e mobilidade geográfica, deixando-nos cegos para a força que os sistemas fordistas ainda têm. Tivemos mudanças semelhantes na organização industrial, em que a subcontratação organizada abre oportunidades para pequenos negócios, permitindo até mesmo sistemas mais antigos de trabalho, como domésticos, artesanais e paternalistas (“patronos”, “padrinhos” e 37 até estruturas referentes à máfia) revivam e floresçam, só que agora como peças centrais do sistema produtivo 41 . Portanto, antes de ser mencionado o setor saúde do trabalhador na lei 8080/90 38 , já havia uma reflexão na área de como fazer para prevenir acidentes relacionados ao processo de trabalho, e promover a promoção da saúde nos ambientes de trabalho pautado no SUS. Na Lei orgânica da saúde nº 8080/90 há a definição de Saúde do Trabalhador na perspectiva da integralidade, atribuindo ao órgão nacional do SUS, o Ministério da Saúde, a coordenação da Política Nacional de Saúde do Trabalhador, e aos estados e municípios desenvolver ações à saúde e à segurança do trabalhador. As ações de Saúde do Trabalhador incluem a promoção, proteção, recuperação e a reabilitação, abrangendo: a assistência ao trabalhador, formal ou informal, vítima de acidente de trabalho ou portador de doença profissional e relacionada ao trabalho; participação social no âmbito de competência do SUS, na normatização, fiscalização e controle das condições de produção, extração e armazenamento, transporte distribuição e manuseio de substâncias, de produtos, de máquinas e de equipamentos que apresentam riscos à saúde do trabalhador; avaliar o impacto que as novas inovações tecnológicas apresentam à saúde; informatizar o trabalhador sobre os riscos de acidentes de trabalho, bem como os resultados de fiscalizações, avaliações ambientais e exames de saúde realizados de seu direito, de admissão e demissão, de acordo com os preceitos da ética e moral profissional; ter a colaboração das entidades sindicais na revisão periódica da listagem oficial de doenças originadas do processo de trabalho; garantir ao sindicato dos trabalhadores de requerer ao órgão competente a interdição de máquinas inapropriadas para uso, havendo exposição a risco iminente para a vida e saúde dos trabalhadores. De acordo com Gomes 9 , a saúde do trabalhador se configura no campo do saber da saúde coletiva e está composta pelo tripé epidemiologia, administração e planejamento em saúde e ciências sociais em saúde, somando-se a essas outras disciplinas auxiliares como demografia, estatística, antropologia, ecologia, toxicologia, geografia, ergonomia, engenharia de produção, entre muitas outras. Dentre esse processo de construção tivemos grandes influencias na gênese social desse campo. Dentre elas, pode-se destacar o grande avanço da produção acadêmica nos setores de medicina preventiva e da saúde pública, que apoiada na medicina social Latino- 38 americana, ampliou o quadro demonstrativo de saúde doença incluindo a categoria trabalho como um dos determinantes sociais. O movimento de Reforma Sanitária brasileira teve várias iniciativas sociais voltadas para a universalização e a promoção da saúde, dentre as quais também foi de grande importância a contribuição da experiência italiana, que valoriza o trabalhador como o sujeito para a transformação dos processos de trabalho, contribuindo significativamente para a institucionalização da área de Saúde do Trabalhador 9 . O fortalecimento do movimento dos trabalhadores pela conquista de direitos de cidadania, e direito livre a organização que promoveu o aumento das reivindicações associadas com a força e o importante papel exercido pelo departamento Intersindical de Estudos e Pesquisas de Saúde e dos Ambientes de Trabalho (DIESAT). A criação dos programas de Saúde do Trabalhador e Centros de Referencia em Saúde do trabalhador com graus diversos de participação de representantes dos trabalhadores no desenvolvimento de ações com o intuito de constituir de forma participativa serviços de saúde no campo como política pública, em concordância com a Organização Internacional do Trabalho 45 . Nos princípios e diretrizes do SUS declarados na lei orgânica de saúde 8080/90, no art.7, são desenvolvidos com base nas diretrizes previstas no art. 198 da Constituição Federal 14 , os quais se correlacionam com ações desenvolvidas pelo programa de Saúde do Trabalhador, dentre esses princípios podemos citar: “Integralidade de assistência, entendida como conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema”, onde se enquadra a Saúde do Trabalhador. A regionalização e hierarquização da rede de serviços de saúde correspondem ao processo de territorialização da saúde do trabalhador, onde temos a Rede Sentinela, a estrutura da saúde do trabalhador 46 . 39 2.4.2 Política Nacional de Saúde do Trabalhador A Política Nacional de Saúde do Trabalhador para o SUS 47 tem por propósito “a promoção da saúde e a redução da morbimortalidade dos trabalhadores, mediante ações integradas, intra e intersetorialmente, de forma contínua, sobre os determinantes dos agravos decorrentes dos modelos de desenvolvimento e processos produtivos, com a participação de todos os sujeitos sociais envolvidos”, através do desenvolvimento de ações pelo SUS, organizadas em todos os níveis de atenção, tendo como diretrizes: atenção integral da saúde dos trabalhadores, envolvendo a promoção de ambientes e processos de trabalho saudáveis, o fortalecimento da vigilância de ambientes, os processos e agravos relacionados ao trabalho, a assistência integral à saúde dos trabalhadores e a adequação e ampliação da capacidade institucional; articulação Intra e Intersetorial; estruturação de Rede de Informações em Saúde do Trabalhador; apoio ao Desenvolvimento de Estudos e Pesquisas em Saúde do Trabalhador; desenvolvimento e Capacitação de Recursos Humanos e participação da comunidade na gestão das ações em saúde do trabalhador”. Para sua implementação no SUS, esta política tem como estratégia a criação da RENAST que deverá articular o Ministério da Saúde, as Secretarias de Saúde dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Esta integra a rede de serviços do SUS voltados à promoção, à assistência e à vigilância, para o desenvolvimento das ações de Saúde do Trabalhador de forma descentralizada e hierarquizada, em todos os níveis de atenção do SUS, incluindo as de promoção, preventivas, curativas e de reabilitação 47,48 . A RENAST 48 , deve ser implementada através da estruturação dos CERESTs; da inclusão das ações de saúde do trabalhador na atenção básica, por meio da definição de protocolos, estabelecimento de linhas de cuidado e outros instrumentos que favoreçam a integralidade; da implementação das ações de promoção e vigilância em saúde do trabalhador; da instituição e indicação de serviços de Saúde do Trabalhador de retaguarda, de média e alta complexidade já instalados, aqui chamados de Rede de Serviços Sentinela em Saúde do Trabalhador e da caracterização de Municípios Sentinela em Saúde do Trabalhador. 40 2.5 PROMOÇÃO DA SAÚDE 2.5.1 Bases Conceituais e Históricas Tradicionalmente, o olhar sobre o processo saúde-doença nos indivíduos é fragmentado, como se produzir saúde fosse combater um processo de adoecimento mono ou multicausal, onde busca-se um agente específico causador da doença, um ambiente propício e um sujeito vulnerável, como na história natural das doenças, modelo ainda hegemônico. No entanto, a política de promoção da saúde atualmente discutida, traz a mudança de paradigma deste modelo para uma nova visão que se estabelece como base para a saúde coletiva, de olhar os determinantes sociais que alteram ou agravam estas situações, como equidade, distribuição de renda, participação da população na construção das políticas públicas e no controle das ações governamentais 22 . Nessa perspectiva, o termo promoção da saúde foi recentemente retomado, início dos anos 70, num processo de redemocratização e luta por ideais da reforma sanitária, e traz como principio fundamental a saúde como um direito que perpassa os muros do setor saúde 49 . E tem sido muito discutido nacional e internacionalmente, principalmente, Canadá, Estados Unidos e na Europa Ocidental, trazendo uma concepção com base no conceito ampliado de saúde. No discurso vigente, a promoção da saúde busca romper e superar a orientação predominantemente centrada no controle da enfermidade, valorizando a saúde como componente central do desenvolvimento humano, ressaltando os fatores necessários para assegurar a qualidade de vida e o direito ao bem estar 50 . No entanto, esse termo vem de longa data. E, Para se chegar ao conceito mais abrangente e atualmente discutido sobre promoção da saúde, ocorreram transformações sociais, ao longo dos anos, que foram fundamentais para seu delineamento. Em 1946 Sigerist, um dos primeiros autores que fez uso do termo, afirmou a promoção da saúde como um dos quatro pilares essenciais da medicina: promoção da saúde, a prevenção de doenças, a recuperação dos enfermos e a reabilitação. Em sua concepção, a saúde se promove proporcionando condições de vida decentes, boas condições de trabalho, educação, cultura física e formas de lazer e descanso 20 . Em 1965, Leavell e Clarck, apresentaram o termo promoção da saúde como o nível primário da prevenção ao desenvolverem o modelo da história natural das doenças 18 . 41 Neste modelo da história natural das doenças, temos dois períodos, o epidemiológico e o patológico. No primeiro, o foco está nas relações suscetível-ambiente; no segundo o foco está para dentro do corpo, do organismo. Entende-se que esses dois períodos se completam: o meio ambiente é onde ocorre as pré-condições, e o meio interno, lócus da doença, onde se processaria, progressivamente, uma série de modificações bioquímicas, fisiológicas e histológicas, próprias de uma determinada enfermidade 51 . Estando a prevenção primária no período pré- patogênese, implica em se desenvolver uma saúde ótima pela proteção específica entre o homem e seu agente patógeno, ou construir barreiras entre o homem e os agentes patógenos do meio. Nesse contexto, a educação e a motivação sanitária constituem elementos importantes para este objetivo. Assim como um bom padrão de nutrição, aconselhamentos, educação sexual, moradia adequada, recreação e condições agradáveis no lar e no trabalho, entre outros. Dessa forma, trata-se de um enfoque no indivíduo ou um coletivo limitado 3 . Todavia, constatou-se que esse “olhar promocionista” não serviria para as doenças genéticas e outras que envolvem mais que mudanças de estilos de vida e prevenção. No campo da saúde do trabalhador, dentre outros exemplos, temos a questão do uso do agrotóxico, onde não basta fornecer medidas de proteção como EPI’s e informações sanitárias, quando a origem causadora dos adoecimentos, tanto dos trabalhadores como da população consumidora, está na comercialização do produto. Dessa forma, e vulgarmente falando, estaremos “enxugando gelo”, já que a intervenção vai além da prevenção, mas a partir de acordos intersetoriais para a construção de políticas públicas saudáveis que levem a transformações e substituições. Para se promover a promoção da saúde torna-se necessário a utilização de diversos meios trabalhando em conjunto, pois de com Poland 52 , existem diversos programas hoje rotulados como de “promoção da saúde” que satisfazem a todos ou apenas a alguns dos critérios teóricos da promoção da saúde. E, ainda de acordo com o autor, torna-se tentador querermos indicar apenas as atividades que possuem critérios como de promoção da saúde, porem isso excluiria uma larga gama de intervenções que, de fato, contribuem para se promover a saúde. Para a plenitude da promoção da saúde torna-se necessário assegurar a complementaridade das ações, de maneira equitativa e na distribuição em diversos níveis de intervenção e em muitos ambientes 52 . 42 Há críticas e polêmicas quanto à distinção entre promoção e prevenção. Pois, muitas vezes, as práticas de promoção partem do mesmo princípio científico que embasa a prevenção, cuja racionalidade é a mesma do discurso preventivo 18 , e estas, raramente, se apresentam de forma explícita. O termo “prevenir” tem o significado de preparar; chegar antes; dispor de maneira que evite dano ou mal, ação antecipada, o que compete na prática ações de divulgação de informações científicas e de recomendações normativas de mudanças de hábitos 53, “Promover” significa dar impulso a; fomentar; originar; gerar dessa forma, promoção se define de maneira bem mais ampla que prevenção, já que não se dirige a uma determinada doença ou desordem, mas para aumentar a saúde e o bem estar gerais. Tendo como estratégias a ênfase nas transformações de vida e de trabalho que conformam as estruturas subjacentes aos problemas de saúde, demandando uma abordagem intersetorial 54,55 . As várias concepções de promoção da saúde podem ser divididas em dois grandes grupos: no primeiro, a promoção se dirige à transformação dos comportamentos dos indivíduos, ou seja, todos os fatores que estiverem ao alcance dos indivíduos, como hábito de fumar, aleitamento materno, dieta, atividade física, direção consciente no trânsito, entre outros. No entanto, o que vem a conceituar a abordagem moderna de promoção é a constatação do papel protagonista dos determinantes gerais sobre as condições de saúde, onde a saúde é produto de um amplo aspecto de fatores relacionados com a qualidade de vida, incluindo um padrão adequado de alimentação e nutrição, saneamento e habitação, boas condições de trabalho, oportunidades de educação durante toda a vida, ambiente físico limpo, apoio social para famílias e indivíduos, entre outros fatores compreendidos num sentido amplo, e satisfeitos por meio de políticas públicas e de ambientes favoráveis ao desenvolvimento da saúde e do esforço da capacidade dos indivíduos e das comunidades 56 . “A miséria do povo, mãe das enfermidades” frase utilizada por Johann Peter Frank, diretor geral de saúde pública da Lombardia Austríaca e professor da Faculdade de Medicina, ao alegar que as más condições de vida e de trabalho eram as principais causas das doenças, e de que eram preciso mais que reformas sanitárias, mas, também, amplas reformas sociais e econômicas 57 . Diversos movimentos contribuíram para a retomada do termo promoção da saúde num sentido mais abrangente, em que não basta apenas uma ação específica, mas sim um conjunto de ações que envolvem questões políticas, sociais e econômicas. E assim, podemos 43 destacar importantes movimentos, nacionais e internacionais, que levaram a construção da Política Nacional de Promoção da Saúde com o conceito atual. Declaração de Alma-Ata, em 1978, reunião ocorrida em Riga, URSS, foi a primeira Conferencia Internacional sobre Cuidados Primários de Saúde, reafirma a saúde como um direito fundamental do ser humano, para a melhor qualidade de vida e para a paz mundial, e a importância de associá-la aos cuidados primários de saúde, como educação, suprimento de alimentos, saneamento básico, acesso ao controle e prevenção de doenças endêmicas, atenção materno infantil, entre outras ações básicas propostas para todos no ano 2000. E esta trouxe importantes questões que culminaram novos movimentos como a I Conferencia Internacional sobre Promoção da Saúde 50,58 . A Carta de Ottawa, considerada uma das fundadoras do conceito atual de Promoção da Saúde, traz um conjunto de intenções, em Ottawa, Canadá, durante a Iª Conferencia Internacional de Promoção da Saúde, como a construção de políticas públicas saudáveis, criação de ambientes favoráveis à saúde, reforço da ação comunitária (empowerment coletivo), desenvolvimento de habilidades pessoais (empowerment individual) e a reorientação de sistemas e serviços de saúde. Ou seja, reafirmando a importância do coletivo nas ações para a saúde e a intersetorialidade das ações 50 . A declaração do México há a conscientização da importância da promoção da saúde como um componente fundamental das políticas e programas públicos em todos os países na busca de equidade e melhor saúde. Sugere pôr a promoção da saúde como prioridade, incluir participação social e associá-la a planos de ações nacionais 50 . Declaração de Adelaide reafirmou cinco linhas de ação da carta de Ottawa, onde quatro dessas se encontram dentro das políticas públicas saudáveis: apoio à saúde da mulher, alimentação e nutrição, tabaco e álcool e criação de ambientes favoráveis 50 . Declaração de Sundsvall, ocorrida na III Conferencia Internacional de Saúde, 1991, traz enfoque para a construção de ambientes favoráveis promotores de saúde, e afirma a necessidade de aniquilar situações de iniquidades. E afirma quatro estratégias fundamentais para promover a criação de ambientes favoráveis no nível das comunidades como: reforçar ações comunitárias por grupos femininos, capacitar comunidade e indivíduos sobre sua saúde e ambientes, através de participação nas tomadas das decisões, construir alianças para a saúde e ambientes favoráveis, mediar interesses conflitantes na sociedade 50 . 44 Para Buss 58 , o documento de lançamento da Promoção da Saúde na América Latina, Declaração de Bogotá, afirma que deve-se buscar a implementação de condições que garantam o bem-estar geral como propósito fundamental do desenvolvimento, e torna-se um desafio transformar condições excludentes, conciliando os interesses econômicos com os propósitos sociais para o bem de todos. A declaração de Santafé de Bogotá, Colômbia, 1992, explicita a necessidade de se criar condições que garantam o bem estar geral como propósito fundamental do desenvolvimento, assumindo a relação mútua entre saúde e desenvolvimento, e afirma a importância de se conciliar os interesses econômicos com os processos sociais 50 . A declaração de Jacarta, IV Conferencia Internacional de Promoção da Saúde, Indonésia, 1997, inclui o setor privado no apoio à promoção, propõe como prioridades, responsabilidade social, aumento de investimentos para fomentar a saúde, consolidar e estabelecer parcerias em prol da saúde, aumentar a participação social e autonomia dos sujeitos e promover infraestrutura necessária para o desenvolvimento de ações de promoção 50 . Em suma, todas essas conferencias e respectivos movimentos sobre promoção da saúde deixa claro que para se promover a Promoção da Saúde deve-se dispor de diversas ações abrangentes trabalhando em conjunto e com o olhar voltado aos determinantes sociais de saúde (DSS) 50,58 . A Política Nacional de Promoção da Saúde (PNPS) 2 , aponta como objetivo geral promover a qualidade de vida e reduzir vulnerabilidade e riscos à saúde relacionados aos seus determinantes e condicionantes, modos de viver, condições de trabalho, habitação, ambiente, educação, lazer, cultura, acesso a bens e serviços essenciais 2 . É reconhecida como uma das estratégias de produção da saúde, articulada a outras políticas e tecnologias desenvolvidas no SUS. Embora, a PNPS 2 , traga para o campo da saúde aspectos amplos de se promover saúde, como a intersetorialidade das ações; a territorialidade; participação social; transversalidade das ações; entre outras, estas vão de encontro com as próprias ações específicas indicadas pela política. Quando analisamos as ações específicas, como alimentação saudável, prática corporal/atividade física, prevenção e controle do tabagismo, redução da morbimortalidade em decorrência do uso abusivo de álcool e outras drogas, redução da morbi-mortalidade por 45 acidentes de trânsito, prevenção da violência e estímulo da paz, promoção do desenvolvimento sustentável, o que faz com que haja divergências na forma de operacionalizá-la, gerando conflitos ao tentar distingui-la de práticas preventivas com o olhar ainda voltado para o modelo biomédico. No entanto, a Promoção da Saúde, em seu principio e diretriz, é uma proposta que visa mudanças no modelo de atenção de todos os programas do âmbito da saúde coletiva 59 . E o que ainda está caminhando são as formas que lhe são atribuídas ao operacionalizá-la. Desta forma, cabe sempre uma reflexão sobre como ela se operacionaliza na prática, ou seja, que ações práticas lhe são concebidas. A declaração de Santafé de Bogotá, ao apontar estratégias para a promoção da Saúde, na America Latina, afirma como um dos compromissos necessário é o estímulo à investigação em Promoção da Saúde, a fim de gerar ciência e tecnologia apropriada e disseminar o conhecimento resultante 58 . 2.5.2 Promoção da Saúde para a Saúde do Trabalhador Desde a década de 70, a Promoção da Saúde vem sendo muito discutida em todos os campos da saúde coletiva 18,21,22 , e especificamente, na saúde do Trabalhador, esta traz uma série de discussões que não só permeiam o campo, como reforça elementos vitais para o desenvolvimento e execução da Política Nacional de Saúde do Trabalhador e Trabalhadora. Dentre os principais elementos da promoção da saúde que devem ser trabalhados no campo da Saúde do Trabalhador temos: a transversalidade das ações, a intersetorialidade, a vigilância, a territorialidade, a participação social e autonomia, desenvolvimento de políticas públicas para melhoria da qualidade de vida e promoção de ambientes saudáveis com ênfase sobre os determinantes sociais 2,18,59 . A articulação transversal é uma estratégia da promoção da saúde que fornece visibilidade aos fatores que colocam a saúde da população em risco e às diferenças entre necessidades, territórios e outras culturas presentes em nosso país, flexibilizando a criação de mecanismos que reduzam as situações de vulnerabilidades, promovendo a equidade com a participação e controle social na gestão das políticas públicas 2 . A Política Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (PNSTT) visa, em seus objetivos, ampliar o entendimento de que a saúde do trabalhador deve ser concebida 46 como uma ação transversal, devendo a relação saúde-trabalho ser tratada em todos os pontos e instâncias da rede de atenção 10 . A promoção da saúde apresenta-se como um mecanismo de fortalecimento e implantação de uma política transversal, integrada e intersetorial, que faça dialogar diversas áreas do setor sanitário, os outros setores do governo, o setor privado e não governamental e a sociedade, compondo redes de compromisso e co- responsabilidade quanto à qualidade de vida da população em que todos sejam partícipes na proteção e no cuidado com a vida 2 . A intersetorialidade é tida como a articulação das possibilidades de diversos setores distintos pensarem a complexidade das questões de saúde, co-responsabilizando-se na formulação de intervenções que propiciem soluções plausíveis 2 . A questão da intersetorialidade é de extrema importância para o campo da saúde do trabalhador, embora seja preciso ser melhor definida e trabalhada, pois ainda não se sabe quando e de que forma devem ser desenvolvidas ações intersetoriais 22 . A vigilância em saúde do trabalhador, no âmbito da promoção da saúde, implica também uma ação intersetorial, que promove a pactuação das ações entre gestores, construção de redes, mobilização social e articulação com todos os níveis de atenção. A vigilância em saúde, no âmbito da promoção da saúde, deve contribuir para além de uma perspectiva de prevenção de doenças e reprodução de conceitos clássicos de doença, como transmissão de riscos e reduzidas à aplicação de técnicas e normas 18,60 . Nessa perspectiva, a promoção da saúde estreita sua relação com a vigilância em saúde, promovendo a articulação de um movimento integrador na construção de consensos e sinergias, na construção de agendas governamentais que possibilitem o fortalecimento do protagonismo dos cidadãos através da participação social, na elaboração e implementação das políticas públicas 2 . A nova perspectiva da vigilância em saúde propõe um novo modelo, que busque superar os paradigmas médico-assistencialistas e sanitários, em consonância com as propostas de promoção da saúde, onde se privilegia a construção de políticas públicas, atuação intersetorial e intervenções particulares e integradas de promoção, prevenção e recuperação 47 em torno de problemas e grupos populacionais específicos, tendo por base planejamento das ações e análise das situações de saúde nos territórios 22 . Nesse contexto, a territorialidade se constitui um elemento primordial para a promoção da saúde do trabalhador, pois no âmbito do trabalho, no território, podem se expressar a produção, o consumo e a interação humana. Dessa forma, os territórios ganham vida, que se expressa não somente pelas historias de pessoas e lugares, pela cultura, pelos movimentos sociais e ações políticas, mas também por ecossistemas, constituindo-se redes de interações num universo diversificado de subpopulações, processos de trabalho, equipamentos técnicos públicos e privados 61 . Os conflitos vivenciados nos território não podem mais ser vistos apenas com base nas relações sociais e da centralidade capital versus trabalho, e sim no contexto da relação social mais geral entre o ser humano, a sociedade e a natureza, envolvendo questões que se relacionam com o metabolismo social decorrentes dos processos e condições gerais de produção e consumo, da complexidade de um capitalismo globalizado, que induz a fragmentação dos territórios, da degradação ambiental associadas à exploração do trabalho, que se distribuem espacialmente em situações de vulnerabilidades e dos riscos ecológicos globais 62 . O mapeamento dos problemas de saúde trabalho e ambiente em dado território permite a análise de uma dada realidade. Dessa forma, cabe aos profissionais de saúde pública levantar as principais atividades nele existentes, a fim de reconhecer seus limites e os atores políticos atuantes, contribuindo assim, também, para a vigilância em saúde 61 . Dos objetivos da Política Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora (PNSTT), está o fortalecimento da vigilância, que pressupõe a identificação das atividades produtivas da população trabalhadora e das situações de risco à saúde dos trabalhadores no território. E nesse contexto, traz a participação dos trabalhadores e suas organizações como primordiais para promoção da democracia e justiça social 10 . A participação social na saúde do trabalhador tem origens históricas, no Modelo Operário Italiano, como já discutido anteriormente, foi um grande marco na década de 70, para a transformação dos processos de trabalho e compartilhamento de saberes, e este também é trazido pela promoção da saúde como essencial para o desenvolvimento da autonomia. 48 Portanto, todas essas questões acima discutidas contribuem para a melhoria da qualidade de vida no trabalho e promoção de ambientes saudáveis. No entanto, a melhoria da qualidade de vida no trabalho implica, também, a discussão de questões que envolvem as tecnologias e seus impactos para a saúde e meio ambiente, salários, promoções, incentivos e participação no lucro das empresas, como também incentivo à criatividade, autonomia, grau de controle e aumento de poder dos trabalhadores nas transformações dos processos de trabalho 24,32 . Embora a melhoria da saúde seja o avo almejado por diversos programas de saúde pública, esta é a consequência e não o objeto das ações trabalhadas nos programas destinados à Saúde do Trabalhador. Portanto, ao se propor a promoção da saúde do trabalhador implica proporcionar ambientes de trabalho saudáveis e prazerosos e relações trabalhistas mais justas resgatando a dignidade do trabalhador. A 3ª Conferência Internacional de Promoção da Saúde, realizada em Sundsvall, Suécia em 1991 50 , embora se direcione mais para a questão da precariedade de vida de determinadas populações, traz a importância dos ambientes saudáveis como ambientes promotores de saúde, alegando que estes são interdependentes e inseparáveis, assim como devem ser incluídos como prioridades nas políticas públicas. Ainda de acordo com a Conferência de Sundsvall 50 , há um elo inseparável entre desenvolvimento humano e meio ambiente, onde desenvolvimento implica melhoria da qualidade de vida e saúde, ao mesmo tempo em que se promove a preservação da sustentabilidade do meio ambiente. O meio ambiente tem recebido grande relevância com abordagens ecossistêmicas, fazendo parte do próprio conceito ampliado de saúde. Dessa forma, a perspectiva ecossistêmica enriquece o campo da saúde do trabalhador por buscar compreender os problemas em seu contexto e complexidade, assim como, também traz para a resolução dos problemas todos os atores sociais, como população, governantes, gestores, empresários, profissionais, trabalhadores e técnicos, na adoção de uma perspectiva inter e transdisciplinar 9 . Portanto, todas essas questões acima mencionadas, se relacionam e unidas ganham forças para a implementação de uma política sólida para a efetiva promoção da saúde do trabalhador. 49 3 PERGUNTA CONDUTORA Quais os sentidos produzidos de promoção da saúde no campo da Saúde do Trabalhador e suas possíveis operacionalidades? 50 4 JUSTIFICATIVA A importância da saúde do trabalhador tem sido evidenciada tanto pelas pesquisas realizadas quanto pelas novas políticas de saúde formuladas. A política nacional de Saúde do trabalhador expressa potenciais problemas, destacando-se questões como a subnotificação das doenças profissionais e dos acidentes de trabalho; a competência das ações, a fragmentação de responsabilidades a partir da existência de diversas instituições e órgãos com atribuições de intervenção na área; as dificuldades na formação de recursos humanos, entre outras; o que denota uma situação frágil pelo que esta representa frente ao quadro dramático de morbimortalidade da população trabalhadora brasileira. Justifica-se, também, a realização da pesquisa, pela importância de se realizar estudos que promovam e enriqueçam discussões de significados ainda polissêmicos (promoção da saúde), embora muito importantes para a saúde da população. E, assim, trazer subsídios para a reflexão sobre a configuração do objeto da pesquisa no campo da Saúde do Trabalhador. Existem poucos estudos realizados nos Centros de Referência em Saúde do Trabalhador com o tema proposto, embora este seja reconhecido como fundamental para qualquer política que discorra sobre saúde da população. Por ser um campo, também, que se apresenta continuamente sendo reconstruído, torna-se fundamental discorrer sobre temas abrangentes que dão a base de sustentação à Política da população trabalhadora. 51 5 OBJETIVOS 5.1 Objetivo Geral Compreender e interpretar os sentidos produzidos sobre promoção da saúde pelos trabalhadores do Centro de Referencia em Saúde do Trabalhador (CEREST). 5.2 Objetivos Específicos Identificar na visão dos atores o papel e significado da promoção da saúde no campo da saúde do trabalhador; Descrever os sentidos produzidos de promoção da saúde quando na operacionalização de suas ações pelos profissionais do CEREST; Identificar a estrutura atual do setor; Realizar uma discussão e reflexão dos sentidos produzidos e a operacionalização possível da promoção da saúde pelos trabalhadores do CEREST. 52 6 TRAJETÓRIA METODOLÓGICA 6.1 DESENHO DO ESTUDO A partir das inquietações que levaram ao estudo, buscou-se compreender os sentidos produzidos de promoção da saúde pelos trabalhadores do campo da Saúde do Trabalhador através de uma pesquisa qualitativa. Por ser esse campo da promoção da saúde do trabalhador, em sua origem polissêmica, apresenta questões não resolvidas e inconclusivas, que devem ser pensadas em sua cientificidade como uma ideia reguladora e de alta abstração, que se caracteriza como um campo da pesquisa social 63 . Pesquisa social em saúde refere-se a todas as investigações que tratam do tema saúde/doença e de sua representação, como as instituições políticas, de serviços, profissionais e usuários 63 . Ainda segundo Minayo 64 , a pesquisa qualitativa procura responder as questões muito particulares, que não devem ou não deveriam ser quantificadas. Trabalha com o mundo dos significados, das aspirações, dos motivos, das crenças, das atitudes e valores como partes da realidade social. A abordagem qualitativa permite o aprofundamento no mundo dos significados, onde a realidade não é visível, mas precisa ser exposta e interpretada, em primeira instancia pelos próprios pesquisadores 64 . Neste estudo, valorizou-se a qualidade dos discursos e não a quantidade do que foi dito sobre promoção da saúde no campo da saúde do trabalhador, e para que se buscasse a resignificação das falas, tornou-se essencial analisa-las através da análise de discurso, o que permitiu compreender os sentidos produzidos pelos trabalhadores imbricados pela experiência em campo. As Ciências Humanas levam em conta a historicidade do objeto de estudo, pois as sociedades humanas possuem no presente, fatos que são marcados pelo passado e projetados para o futuro, deixando marcas, numa reconstrução do novo que surge 63 . Uma análise qualitativa para ser fidedigna precisa conter em sua busca os termos estruturantes da investigação qualitativa, ou seja, os verbos: compreender e interpretar; e os 53 substantivos: experiência, vivência, senso comum e ação social. E para ter qualidade depende também da arte, da experiência e da capacidade de aprofundamento do investigador que dá o tom e o tempero do trabalho que elabora 64 . Ainda segundo a autora, para se fazer ciência é preciso trabalhar ao mesmo tempo com teoria, método e técnicas, numa perspectiva mútua. Levando-se em conta o modo de fazer, que depende do que o objeto demanda, além da resposta ao objeto, que depende das perguntas, dos instrumentos e das estratégias que são utilizadas na coleta dos dados. Seguindo o pensamento de Minayo 63 , Esta pesquisa parte da visão de mundo das teorias compreensivas em que os fatos humanos não são suscetíveis de quantificação e objetivação porque cada um deles tem sentido próprio e identidade peculiar, onde não há ultima palavra na historia que contenha o verdadeiro sentido. Embora as abordagens nas teorias compreensivas sejam inúmeras, temos elementos comuns a todas como: o foco na experiência vivencial e reconhecimento da complexidade das realidades humana; o contato dos indivíduos se realizam nos seus próprios contextos sociais; a relação entre pesquisador e pesquisado enfatiza um encontro intersubjetivo, face a face e empatia entre ambos; os resultados buscam explicitar a racionalidade dos contextos e a lógica interna dos diversos atores e grupos que estão sendo estudados; apresentam a realidade de forma dinâmica e evidenciam o ponto de vista dos vários atores ante um projeto social sempre em construção e em projeção para o futuro e suas conclusões não são universalizáveis, embora a compreensão de contextos peculiares permita inferências mais abrangentes, que a análise das microrrealidades e comparações 63 . Buscou-se nesta pesquisa uma visão fenomenológica, onde considera-se, no campo da saúde, que a cura provem da interação dos valores, símbolos sistemas de significados compartilhados nos grupos de referencia. Sendo estes grupos os, principais, protetores dos indivíduos contra grandes estruturas impessoais e anônimas nas quais eles se tornam um número. De acordo com esse princípio os fenomenologistas propõem uma reforma do sistema de saúde baseada em valores culturais dos indivíduos, dos seus mediadores (os grupos) e de seus ecossistemas 63 . No construto teórico que embasou a analise dos dados, foram utilizados autores de diferentes Escolas e realizada uma triangulação teórica coerente. Os autores mais utilizados foram os da Escola Francesa e da Escola Anglo Saxonica. E dentre os principais autores 54 trabalhados nas perspectivas destas Escolas, temos: Orlandi, Michel Pêcheux e Michel Foucault, Goffman, e M. Bakthin. 6.2 CENÁRIO DO ESTUDO O presente estudo foi realizado no setor da Divisão de Saúde do Trabalhador, que está localizado na Secretária de Estado de Saúde, da Subsecretária de Vigilância em Saúde, e faz parte da Coordenação de Vigilância Ambiental em Saúde e Saúde do Trabalhador. A equipe atual se encontra composta por profissionais de diversas áreas (administração, psicologia, medicina do trabalho, fonoaldiologia, enfermagem, técnico de enfermagem e engenharia), que atuam na Vigilância em Saude do Trabalhador, na elaboração de políticas voltadas para a área, e compoem também o Centro de Referência Estadual em Saúde do Trabalhador (CEREST) do Estado do Rio de Janeiro. O CEREST tem por função dar subsídio e suporte técnico para o SUS e para os outros centros de referencia regionais, nas ações de promoção, prevenção, vigilância, diagnóstico, tratamento e reabilitação em saúde dos trabalhadores urbanos e rurais. Suas atividades só fazem sentido quando articuladas aos demais serviços da rede do SUS, orientando-os e fornecendo retaguarda nas suas práticas. Visa, assim, que os agravos à saúde relacionados ao trabalho possam ser atendidos em todos os níveis de atenção do SUS, de forma integral e hierarquizada. A partir de abril de 2011 foi realizada uma divisão interna, informal, pelo diretor da Divisão de Saúde do Trabalhador da Secretaria Estadual de Saúde do Rio de Janeiro (Figura 1), a fim de otimizar o envolvimento regular e significativo dos colaboradores nos projetos, implantando-se a seguinte estrutura organizacional: (i) núcleo de formação e capacitação em Saúde do trabalhador; (ii) núcleo de administração financeira e insumos; (iii) núcleo de comunicação em saúde; (iv) núcleo de pesquisas e projetos; (v) núcleo de vigilância em saúde do trabalhador; (vi) núcleo de planejamento, logística e apoio aos CERESTs; e (vii) núcleo de Controle Social. 55 Figura 1. Estrutura organizacional da Divisão de Saúde do Trabalhador da Secretaria de Estado de Saúde do Estado do Rio de Janeiro Secretária de Estado de Saúde do Estado do Rio de Janeiro Divisão de Saúde do Trabalhador e Centro de Referencia em Saúde do Trabalhador do Estado do Rio de Janeiro (CEREST) Fonte: dados da pesquisa 6.3 SUJEITOS DO ESTUDO Foram selecionados sete funcionários, dos 18 (dezoito) ativos no setor. Esta escolha justifica-se pelo fato de possuírem cinco anos ou mais de experiências e atuarem como equipe do CEREST, exercendo funções de coordenação dos projetos promovidos e serem os principais Superintendencia de vigilância epidemiológica e ambiental Subsecretária de Vigilância em Saúde Coordenação de Vigilância Ambiental em Saúde e Saúde do Trabalhador 56 responsáveis por cada núcleo, da divisão interna, envolvidos nas ações que buscam a manutenção e melhoria da saúde dos trabalhadores. A representatividade está posta nessa pesquisa, pelo fato do entrevistado poder expressar um conjunto de vivencia de seu grupo. 6.4 TÉCNICAS DA PESQUISA Fez-se necessário o uso da técnica da entrevista para responder ao objetivo central da pesquisa, ou seja, compreender e interpretar os sentidos produzidos sobre promoção da saúde pelos trabalhadores do Centro de Referencia em Saúde do Trabalhador (CEREST) do Estado do Rio de Janeiro e aos objetivos específicos: identificar a visão dos atores sobre o papel da promoção da saúde no campo da saúde do trabalhador; descrever os sentidos produzidos de promoção da saúde quando na operacionalização de suas ações pelos profissionais do CEREST; identificar a estrutura atual do setor; construir categorias de discussão sobre promoção da saúde a partir dos sentidos produzidos pelos trabalhadores do CEREST; realizar uma discussão e reflexão dos sentidos produzidos e a operacionalização possível da promoção da saúde no setor. 6.4.1 Entrevistas A entrevista caracteriza-se como a estratégia mais utilizada para a coleta de dados, pois fornece informações relacionadas ao objeto da pesquisa, alem de ser uma técnica privilegiada de comunicação 63 . As entrevistas semiestruturadas foram realizadas na própria Secretaria de Estado de Saúde, em sala reservada, fornecendo, assim, privacidade aos entrevistados. As perguntas foram formuladas pela combinação de perguntas fechadas e abertas, orientadas por um roteiro com as questões consideradas mais relevantes e versavam sobre a opinião dos atores sobre o papel e importância da promoção da saúde no campo da saúde do trabalhador; a realização ou não das ações de promoção da saúde; dentre as realizadas quais as principais; a capacidade de intervenção do setor no âmbito da promoção; as relações inter e intrasetoriais; as perspectivas e os desafios do setor em relação a promoção da saúde. Antes de cada entrevista foi apresentado ao entrevistado um termo de consentimento livre e esclarecido (APÊNDICE A), aprovado pelo Comitê de Ética, assinado pelo entrevistado, garantindo o anonimato de acordo com as normas estabelecidas pela Resolução CNS nº 466/2012 do Ministério da Saúde para a realização de pesquisas com seres humanos. 57 As entrevistas foram gravadas e o material transcrito o mais detalhadamente possível, destacando pausas, alterações na entonação vocal, suspiros, risos e outras manifestações. Foi adotado um sistema de transcrição bem simples como: AP = pesquisador; ET= entrevistado; ..... = pequenas pausas; [inúmeros] = pausas maiores com marcação de tempo; ??? = palavras pouco claras; ( 0 ) = palavras incompreensíveis; sublinhado = ênfase; //palavras// = fala em voz baixa; ((entonação de confirmação do que fala)); ??palavras?? = pergunta confirmativa, CAIXA ALTA = voz alta; As manifestações “emocionais” foram postas entre parênteses, como risos, suspiros, tom irônico, gestos, mudança de comportamento, entre outras. Após as transcrições emergiram categorias que foram relacionadas à literatura e ao contexto socioideológico do entrevistado, oportunizando a formulação dos significados, através dos efeitos de sentidos produzidos no acontecimento da entrevista. 6.5 A FORMA DE ANÁLISE A polissemia do termo, e as diversas vias que poderiam levar a produção de sentidos no campo, optou-se pela realização da análise de discurso, como forma de análise dos dados, por promover uma triangulação entre aquilo que o pesquisador vivência, o conhecimento teórico e a fala do sujeito e por permitir compreender as falas e identificar as singularidades possíveis nos discursos produzidos pelos trabalhadores e criar categorias relacionadas ao objeto da pesquisa. A análise de discurso se constitui num método que absorve importantes conceitos da Linguística como a não transparência da linguagem e a associação dos termos; da psicanálise de Freud como o inconsciente e o deslocamento do homem para o sujeito, do materialismo histórico de Marx como as relações sociais e ideológicas. Portanto, podemos dizer que a análise de discurso é uma forma material, linguística e histórica que produz sentidos que expressam uma relação essencial entre conteúdo e forma. No entanto, essa análise, não se restringe a seguir algumas premissas dessas bases teóricas, mas, também, questioná-los em alguns aspectos e, por vezes, opor-se a ela 24,65 , concordando com Maingueneau 65 : “O sentido oculto deve ser captado, o qual, sem uma técnica apropriada, permanece inacessível” Na análise do discurso não se trata apenas da transmissão da informação, mas da busca daquela informação a partir de um contexto, que é guiado pela historia, pela língua e pelo inconsciente do sujeito. 58 Na perspectiva da linguística considera-se, principalmente, a importância de o pesquisador compreender a não transparência da linguagem, que por si só tem seu sistema de regras formando seu objeto próprio termo a termo, tornando-se necessário que o pesquisador reconheça a existência do que se fala, como se fala e sua relação com o mundo/linguagem e pensamento. E a partir disto, compreender a não linealidade do discurso, e reconhecer as especificidades de cada fala, realizando uma associação de termos na produção de efeitos de deriva 24 . Portanto, durante o tratamento dos dados, nessa pesquisa, foi privilegiado buscar o sentido e sua interpretação, não apenas pelo conteúdo, mas pela forma e o conteúdo, associando os termos dos discursos a fim de formar um mosaico significante. A análise de discurso ao questionar a não transparência da linguagem torna-se importante compreender, que o entrevistado nunca diz tudo, e nem sempre o que ele disser vai transparecer o que ele pensa sobre o objeto em pesquisa, o que cabe ao pesquisador manter um olhar atento e capcioso sobre o que é dito, não dito, seus implícitos e gestos, compreendendo a incompletude do discurso do sujeito. Pois de acordo com Arendt 66 , podemos dizer o que o sujeito é, porem quem ele é, jamais poderá ser dito, pois está implícito tanto em suas palavras como em seus atos. Devido a isto, não foi buscada a saturação do objeto, mas o esgotamento das falas onde o sujeito diz tudo dentro daquele acontecimento, e as singularidades das falas onde são buscados os núcleos dos discursos, posto que na análise de discurso há incompletude. De acordo com Orlandi 67 , os sentidos não são esgotados no ato imediato, mas fazem efeitos diferentes para diferentes interlocutores, e em diferentes momentos, onde não temos controle sobre isso. Na perspectiva do sujeito, na visão da Escola Francesa e seus respectivos autores Orlandi 68,69 e Pêcheux 70 este sujeito é descentrado, ou seja, não possui controle sobre o meio e sobre si mesmo, que, também se antecipa, é simbólico e afetado pela memória e ideologia histórica. Dessa forma, ele produz resignificações de sua experiência vivida, imbricadas por sua memória, ideologia e historia. Foi buscado nas falas dos entrevistados aquilo que eles gostariam de falar a respeito do objeto pesquisado, o que eles se identificaram e a partir dos seus discursos construir nossas interpretações. 59 A memória discursiva restabelece os implícitos, ou seja, os pré construídos, elementos citados e relatados, de que necessita sua leitura: a condição do legível em relação ao próprio legível. Essa memória, por não estar ligada ao tempo, desfaz a fala sob forma de sequência lógica. E isto permite que os equívocos sejam deslocados durante o discurso 70 A memória, enquanto fonte de formulação do discurso, implica em um processo de (re)significação individual e coletivo da história do sujeito, no momento discursivo. Toda memorização é um acontecimento que abriga o entrelaçamento entre passado, presente e futuro, sem ser determinada pelo tempo cronológico. Esse acontecimento é produzido a partir daquilo que é registrado, marcado, impresso como “ferida”. Em seu deslocamento comporta divisões, disjunções, retomadas, conflitos, regularização, desdobramentos e réplicas. A memória permite o sujeito fazer, não somente repetições, mas promove os deslizamentos, produzindo outros significados, ou seja, efeitos de deriva 70 . Dessa forma, muitas falas que o entrevistado enunciou durante o acontecimento da entrevista, não seguiram uma linealidade, o que coube o pesquisador descrever os implícitos na condição do legível que surgiu desreguladamente. Dessa forma, os equívocos foram deslocados e/ou desregulados no ato da entrevista. E durante o tratamento dos dados foram agrupados em categorias maiores para que pudessem se desvelar em categorias menores, que foram surgindo durante a análise dos dados. De acordo com Brandão 71 , na perspectiva da análise do discurso, a noção de sujeito deixa de ser uma noção idealista, imanente: o sujeito da linguagem não é o sujeito em si, mas tal como existe socialmente, interpelado pela ideologia. Dessa forma, o sujeito não é a origem, a fonte absoluta do sentido, porque na sua fala outras falas se dizem. De acordo com Authier 72 , as palavras são carregadas de sentidos, que não falam por si, mas por outros, estes outros que são os sujeitos. Para Orlandi 68, “a ilusão discursiva do sujeito consiste em pensar que é ele a fonte, a origem do sentido no que diz”. Portanto, devemos, como pesquisador, compreender o sujeito afetado por sua ideologia e história, para, assim, poder compreender e interpretar seu discurso equivocado. Na perspectiva do materialismo histórico pode-se compreender o sujeito como um ser inserido na história, a partir de uma dialética de condução e reprodução. 60 O sujeito na análise do discurso é um sujeito livre e ao mesmo tempo submisso, por sofrer asujeitamentos, afetado pelo simbólico e pelo sistema significante (a língua, o inconsciente, a historia, a ideologia etc.,) 69 . Dessa forma esse sujeito é entendido a partir de um processo significante em que as falas não são ditas por acaso, mas intencionadas. Esse sujeito trabalhado nesta pesquisa é entendido como um sujeito descentrado, já que não tem controle sobre o modo como é afetado pela língua e pela história, resultando em produções significantes e intercaladas pelo inconsciente e ideologia 68 . O sentido que é produzido nesta pesquisa é resultado de um sentido restrito e de um sentido amplo, no primeiro caso, de acordo com Orlandi 69 , está relacionado às circunstancias da enunciação e se expressa mais imediatamente no momento da entrevista, já no segundo, sentido amplo, é analisado de acordo com a sociedade e suas instituições históricas na produção do acontecimento histórico e sócio ideológico em que se insere o contexto vivenciado pelo entrevistado. O sentido é uma relação determinada pelo sujeito afetado pela língua com a história. Pois não há discurso sem sujeito, nem sentido sem ideologia 68 . Portanto, é um sujeito assujeitado a partir do momento em que é afetado pela complexidade do social, e pela ambiguidade do singular que o constitui. Esse sujeito se manifesta no intradiscurso, por meio de deslocamentos inconscientes que resulta de articulações que o tornam fugidio, incompleto e ondulante e simbólico. No contexto amplo compreendeu-se a formação discursiva, que é a constituição do sentido e de identificação do sujeito, onde se determina o que se diz numa posição dada em uma conjuntura sócio histórica, pois nem tudo pode ser dito, num determinado contexto, para todas as pessoas e da mesma forma 69,73,74 , o sujeito não tem uma visão de mundo estática, nem estrutural, já que ela pode resignificar de forma mutável, dependendo do contexto que o sujeito e seu discurso está inserido. Considera-se discurso a união entre forma e conteúdo que se constituem em um acontecimento, a partir de um resultado significante de um sujeito afetado pela ideologia e história 68 . 61 Ao analisarmos os discursos produzidos pelos trabalhadores do campo, foi observado, não somente a transmissão da informação, mas também, o social e o histórico, o sistema e a realização, o subjetivo e o objetivo, o processo e o produto 68 . Nos discursos produzidos temos dois eixos: um vertical que é o interdiscurso, ou seja, vários discursos relacionados que já foram ditos e estão ligados à memória, e o eixo horizontal que está dentro do discurso do sujeito e pode ser chamado de intradiscurso e que produz sentido, o que se diz no momento da entrevista relacionado a atualidade e a singularidade do que é dito 68,75 . Portanto, nas falas analisadas, após as transcrições, foram buscados, primeiramente, os interdiscursos e depois os intradiscursos produzidos pelos sujeitos. Os intra e inter discursos tem efeitos no sujeito, como o esquecimento ideológico (onde aprendemos e esquecemos este aprendizado) e o esquecimento enunciativo (que é atropelado pela linguagem e pelo mundo, onde não há uma relação linear, mas uma relação com o social e com a história 68 . Dessa forma, foi buscado tentar criar um conceito dizendo de outras formas. E diante dessas relações de forças subjetivadas entre as pessoas, o pesquisador, neste estudo se pois numa posição de hierarquização em relação ao entrevistado, a fim de otimizar o ato da entrevista. A interligação entre o passado, o presente e o futuro foi levado em consideração nas conclusões do que foi dito pelo entrevistado. Foi considerado, durante as entrevistas, o processo de antecipação do sujeito que anuncia dizeres que ele pressupõe que o pesquisador gostaria de ouvir, e acaba por enunciar frases e palavras que interessa, mas que se distanciam da produção de suas singularidades. Entretanto, durante as entrevistas realizadas, foi possível perceber a antecipação do sujeito nos seus “achismos” anunciando dizeres do censo comum ao tentar prever o que o pesquisador gostaria de ouvir sendo dada uma atenção especial para desconstruir os equívocos do discurso. Entende-se por equívoco a ilusão de enunciar algo novo como se fosse a verdade absoluta, no entanto se revela como repetições históricas promovidas pela memória 68 . Foram observados e dada devida importância aos gestos dos sujeitos, durante as entrevistas e na análise do material produzido. Pois, os gestos apresentam as especificidades 62 mediadoras dos movimentos corporais, e portanto, permite outras observações além das intertextuais. E pode ser caracterizado como uma prática discursiva por apresentar-se como um discurso que não é textual 76 . Os gestos são atos considerados na totalidade de seu desenrolar, percebido, observado e captado enquanto tal, onde proporcionam ao pesquisador a visibilidade da conduta, das intenções, dos sentimentos e emoções com relação ao tema, que se concretizam no trajeto do sujeito 76 . Os gestos que promoveram maior relevância e que causaram impacto durante as entrevistas foram registrados no caderno de campo para futura análise e compreensão para, se necessário for, relacioná-los ao acontecimento da entrevista, destacando-se os que tiveram maior relevância com o objeto em pesquisa. Nesta pesquisa ao analisar o material, foi feita uma relação entre a forma com que a fala foi pronunciada, seu conteúdo e os gestos dos sujeitos. Pois os gestos também podem expressar uma antecipação e desvendar questões que se não observados, passam despercebidas. Nesta pesquisa, procurou-se compreender o que as falas quiseram dizer, buscando em cada fala o seu núcleo. Foi evitado o excesso de subjetividade, procurando perceber o que faz sentido na fala, evitando os pré-conceitos relacionados ao objeto em questão para não induzir questões já relatadas no campo. Para o estudo da forma nos discursos produzidos foi observado o silêncio. Pois este é repleto de significados. Já que este não é o não dito, e pode ser compreendido, mas jamais interpretado 77 . O silêncio não é pensado como falta, mas a linguagem que é o excesso. Este é trazido à discussão para permitir uma reflexão sobre a linguagem. Este permite que o diálogo continue sem a fala. Pensar o silêncio na Análise de Discurso implica em uma compreensão não tradicional do silêncio, ou seja, uma conceituação contrária ao silêncio como vazio. Portanto, rompe com paradigma da linguagem verbal – com a barreira dicotômica entre a fala e a não fala. 63 O silêncio não é observável de forma direta, mas pleno de sentidos e significações, depende do contexto, que o antecede e precede - do acontecimento. O silêncio abre a disponibilidade para trabalhar as contradições constitutivas do sujeito. Rompe com a linearidade e a literalidade; oferece um campo de possibilidades para que a análise percorra diferentes direções; descentra a linguagem verbal criando um outro espaço privilegiado para compreensão, o espaço do múltiplo. Descentra o verbal, pois permite a continuidade do diálogo. Dessa forma, para trabalhar o silencio e identificá-los foram sinalizadas as pausas não respondidas, ou seja, as falta de respostas seguidas por pausa. 64 7 RESULTADOS E DISCUSSÃO Os sentidos produzidos pelos entrevistados foram interpretados a fim de buscar significados. Na interpretação não se separou a forma do conteúdo. Pois entre o sentido e a interpretação temos a compreensão. Dessa forma, para a interpretação foi preciso primeiro compreender. Foram identificados nesta pesquisa os tipos de discursos presentes nos diálogos, para saber o nível que se encontraram os interlocutores durante a produção dos discursos, pois dependendo do tipo do discurso pode-se perceber um efeito. Neste, predominou-se o polêmico e o lúdico, e evitou-se o autoritário, embora também presente em algumas falas. Procurou-se durante as entrevistas, seguir na direção do discurso lúdico e polêmico, e evitou-se o discurso autoritário, tratando-se o ato da entrevista como uma interação entre sujeitos e não sujeito e objeto. O tipo de discurso resultou do funcionamento discursivo, e este por sua vez é a atividade estruturante de um discurso determinado, posto que não existe relação desinteressada 75 . A tipologia, ao ser estabelecida nos discursos analisados, distingue o tipo de discurso, que poderá ser lúdico, polêmico ou autoritário, de acordo com a interação e polissemia dos sentidos produzidos 78 . A interação tem a ver com o modo que os interlocutores se consideram, podendo haver uma maior ou menor troca de papéis entre o locutor e o ouvinte. Quanto a polissemia, está relacionada com o objeto do estudo e como os interlocutores se expõem a ele. Ou está coberto pelo dizer e o falante o domina ou é constituído na disputa em que os interlocutores tentam domina-lo 78 . Caracteriza-se como discurso lúdico aquele que não tem problema com simetria ou assimetria, já que ele é reversível, a linguagem se dá por prazer de estar produzindo aquele discurso, há relação com a referência com a possibilidade de haver uma multiplicidade de sentidos e tem tendência a polissemia. O discurso polêmico se caracteriza por procurar a assimetria, ver a linguagem para fins imediatos, práticos, futuros, onde se busca os objetivos, a referencia é disputada, procura ver o que todo mundo diz, mas também o que é do sujeito, o que é diferente, busca-se a singularidade. O discurso autoritário procura a assimetria de cima 65 para baixo, para fins mediatos, a referencia é determinada pelo interlocutor, é único, há a paráfrase 75 . Ao entrevistar os atores da pesquisa foi buscado o deslocamento do sentido quando observada a dificuldade de interação entre os interlocutores da pesquisa. Existiram momentos, até bem comuns, durante as entrevistas realisadas em que o entrevistado se colocou numa posição de aprendiz, perguntando por vezes se estava certo o que ele falara sobre promoção da saúde, no entanto foi deslocado o sentido para desconstruir o autoritarismo promovendo um discurso do tipo lúdico e polêmico. Na interlocução evitou-se o discurso do tipo autoritário para proporcionar uma via aberta na produção de sentidos, pois o discurso autoritário não comporta a polissemia. Privilegiou-se o intercâmbio entre discurso lúdico e polêmico, pela possibilidade de se produzir efeitos de sentido, ou múltiplos sentidos. Ora os discursos analisados eram lúdicos ora polêmicos e dificilmente autoritário. Os discursos não foram lineares, mas houve uma reversibilidade de discursos, que interagiram no momento do acontecimento. No texto, o sentido literal por si mesmo só é relevante à medida que, em seu deslizamento, produz múltiplos sentidos, então o sentido literal, no processo de significação, se revelou em efeitos de deriva. Ao analisarmos os dados também foi necessário ler, escrever, compreender e interpretar. Ler é se permitir penetrar, ser permeado, atravessado, afetado pelo sentido em suas várias formas. Descrever é o momento de compreensão dos elementos discursivos (esquecimento, silêncio) deslizando do sentido para o significado. E a Interpretação implica no movimento, produz significado, singulariza, busca a singularidade do sentido, não apreendido diretamente. Considera as contradições de quem fala e de quem analisa 79 . Ler, descrever e interpretar aconteceram sempre apoiados em contextualização histórico-social dos sujeitos (pesquisador-pesquisado) e revelaram em seu processo incompletude 79 . 66 Portanto, na formulação e interpretação dos conceitos, foi tido o cuidado de manter- se distante dos pré-conceitos já concebidos na área da saúde pública sobre o setor do campo da saúde do trabalhador a fim de deixar fluir os discursos sem induções. Na realização da análise dos dados e durante a discussão das falas vamos nos reportar às falas dos entrevistados e aos seus significados. Neste percurso, construímos as categorias conceituais que estão relacionadas aos objetivos da pesquisa e que compõem o roteiro utilizado na entrevista. São elas: 7.1. Promoção da Saúde / ações de Promoção da Saúde 7.2. Intersetorialidade 7.3. Participação dos Trabalhadores 7.4. Estrutura do setor 7.5. Desafios Em cada uma destas categorias conceituais foram analisados os discursos dos entrevistados, relacionando-os aos seus respectivos temas, onde foram identificados os núcleos essenciais das falas permitindo surgir, a partir dos discursos dos trabalhados, categorias empíricas, que foram fruto de nossas análises e resultado dos efeitos de deriva, que nesta pesquisa se encontram com a denominação de mosaico significante. A fim de organizar melhor os discursos com relação às categorias conceituais e suas respectivas análises, os discursos relacionados a cada categoria conceitual, foram repartidos de forma que cada parte encontra-se acompanhada de seus respectivos resultados e discussões na respectiva ordem: núcleos essenciais, discurso referido dos entrevistados, desvelamento de sentidos para qualificativos substantivados, denominados de categorias empíricas, e por ultimo discussão dos dados. Portanto, neste estudo, a análise é feita de todo contexto, unindo-se forma e conteúdo, ou seja, não somente os enunciados, mas também, seus gestos enunciados. Como relata Foucault 80 , não se determina a unidade discursiva somente por uma forma determinada de enunciados, mas, também observações tornadas mediatas por instrumentos, protocolos de experiências de laboratórios, cálculos estatísticos, constatações epidemiológicas, entre outros, onde é essencial caracterizar e individualizar a coexistência desses enunciados dispersos e heterogêneos. 67 Para permitir melhor tratamento dos dados, durante este percurso, devido a reversibilidade das falas e às importantes questões levantadas para o campo, enumeramos os núcleos essenciais das falas dos sujeitos organizados na forma de mosaico significante. Fonte: Elaborada pela autora 68 7.1 PROMOÇÃO DA SAÚDE / AÇÕES DE PROMOÇÃO DA SAÚDE A opção por esta categoria conceitual advém do pressuposto da importância da promoção da saúde para o campo de saúde do trabalhador e da polissemia do termo que, embora fundamental nos discursos atuais de saúde pública, se apresenta de diversas formas quando em sua operacionalidade. Neste percurso, buscou-se compreender e interpretar os sentidos produzidos, pelos trabalhadores do CEREST, e o desvelamento de seus significados sobre a promoção da saúde e sua operacionalidade no campo prático da Saúde do Trabalhador, a fim de responder aos objetivos da pesquisa. Com relação a esta categoria conceitual, encontramos discursos, predominantemente, lúdicos em que os sujeitos fazem menção à ideologia e a memória histórica, apresentando discursos positivos e prazerosos, e alguns discursos polêmicos, que, ao longo do acontecimento das entrevistas, foi possível compreender singularidades que apresentaram o deslocamento do foco da vigilância, hegemônica, historicamente, nos discursos da saúde do trabalhador, para a promoção da saúde, embora fazendo parte desta, numa visão mais abrangente. ênfase, cerne principal, gênese, objetivo, norte, fundamental, o fio condutor das ações “A promoção da Saúde na saúde pública, como um todo.... é a nossa ênfase, ou seja, na saúde coletiva como um todo.” “o que a gente enfatiza é o trabalhador trabalhar de forma saudável e a promoção da saúde é o nosso objetivo final. É o nosso objetivo,” “A promoção da saúde é o nosso norte” “ Acho que é fundamental a promoção da saúde.” “O que acontece é o seguinte eles dizem como fazer, mas a operacionalidade é difícil.” “No momento não..... há controvérsias, mas se eu for fechar agora num ponto bem critico resumido eu acho que nãofazemos promoção da saúde “ “Eu penso que a promoção da saúde está muito enraizada no conceito de saúde do trabalhador.” “Porque um não vai conseguir caminhar sem o outro, porque eu estou dizendo isso, porque a gênese de saúde do trabalhador, ela na sua aplicação, ela tem a promoção da saúde como cerne principal, o fio condutor na saúde do trabalhador. Ele perpassa e vão perpassar sempre pela promoção da saúde.” importantíssimo, imprescindível, desejo 69 Os interdiscursos dos trabalhadores do Cerest, logo de início, apresentaram-se predominantemente lúdicos, permeados pela ideologia e história onde os sujeitos se reportaram ao conceito moderno de promoção da saúde como fundamental para o êxito das políticas públicas de saúde, como relata Silva 59 a promoção da saúde tem sido muito discutida e divulgada em fóruns e debates da saúde, nacional e internacionalmente, caracterizando-se como um dos principais pilares para o alcance de melhores condições de saúde da população. E se expressaram de forma prazerosa, ressaltando sua importância para as políticas de saúde, resignificando o sentido de desejo, de algo imprescindível para o desenvolvimento das ações no campo da Saúde do Trabalhador, como no discurso do entrevistado: “Acho que é fundamental a promoção da saúde”. É o nosso objetivo”, que se desvela no discurso atual dos trabalhadores do Cerest, como o foco para se pensar Saúde do Trabalhador, concordando com Minayo 81 , quando afirma que seria de suma importância que a Saúde do Trabalhador rompesse com a dicotomia entre a assistência e vigilância e estimulasse a formulação de estratégias para a prevenção de agravos e promoção da saúde. Em alguns momentos do início das entrevistas, foi percebido uma aproximação das falas pronunciadas com o novo conceito de promoção da saúde, mais discutido, atualmente, na literatura, em que a promoção da saúde é discutida como importantíssima para as políticas de saúde por buscar uma mudança no olhar médico-assistencialista 59,20, como no dizer: “é fundamental a promoção da saúde (pronunciado com ênfase), está muito enraizada no conceito de saúde do trabalhador”, como uma repetição histórica, em que, os sujeitos se antecipam através do equívoco histórico de que realizar a promoção da saúde é imprescindível para o êxito de quaisquer políticas de saúde e deve ser discutido em todas as políticas do campo da saúde, assim, como também, pela saúde do trabalhador. No entanto, ao longo do acontecimento, foi desvelado, durante a análise dos significados que, embora, seja considerada fundamental para o campo e haja esse foco voltado para a promoção da saúde, paradoxalmente, os trabalhadores entrevistados afirmaram não saberem como realizá-la, e/ou que não realizam promoção da saúde, como no discurso: “O que acontece é o seguinte eles dizem como fazer, mas a operacionalidade é difícil, No momento não..... há controvérsias, mas se eu for fechar agora num ponto bem crítico resumido eu acho que não fazemos promoção da saúde, onde na análise do intradiscurso, que de acordo Pêcheux 70 o acontecimento desloca e desregula os implícitos que se associam ao sistema de regulação anterior, onde “estes implícitos” são a condição do legível ao próprio legível, percebemos que o fato de não se realizar ações consideradas de maior importância para os trabalhadores do 70 setor, como vigilância e intersetorialidade, permitiram-se a formulação de discursos negativos como a afirmação da não realização da promoção da saúde pelos trabalhadores do setor, embora se realize outras ações como palestras, capacitações, assessoria técnica aos outros Cerests regionais, que, também estão pautadas na promoção da saúde, como relata Buss 58 , ora as ações de promoção podem ser consideradas ações que dependem das atitudes individuais, como ações de educação em saúde, ora podem ser ações que independem das atitudes dos indivíduos para com sua própria saúde, como a construção de políticas públicas no campo, onde estas diferentes vias de se pensar e executar a promoção da saúde geram discursos polêmicos e polissêmicos. Contudo, o termo promoção da saúde se desvelou nos sentidos produzidos, pelos entrevistados, em significados de desejo, de algo importantíssimo, imprescindível, como se alcançá-la fosse a contemplação do que se espera da política atual de saúde do trabalhador. Este contexto permitiu compreender a singularidade, desvelada pelos sujeitos, de um rompimento com o equívoco histórico de ser a vigilância o cerne de se realizar saúde do trabalhador, e que embora a maioria tenha contemplado a vigilância como uma das principais ações do campo, esta não se apresentou como o foco central, mas como parte das ações que, em conjunto, contribuem para a promoção da saúde do trabalhador. Logo, foi possível perceber uma nova forma de se pensar a realização da saúde do trabalhador, com uma visão mais abrangente, olhando o trabalhador como um ser humano que está envolvido com seus determinantes sociais, que não se limita aos ambientes de trabalho, mas está relacionado a todos os fatores que refletem seu modo de viver. A análise da discursividade dos trabalhadores do Cerest permitiu compreender uma relação dos discursos produzidos com o materialismo histórico, onde, o linguístico e o histórico são indissociáveis no processo de construção dos sentidos que significam, que se associam ao valor simbólico e visam o devir, que no discurso político busca-se uma legitimidade histórica 75,82 . Houve um tempo em que realizar saúde do trabalhador era sinônimo de realizar vigilância, devido ao processo histórico e ideológico que configurou o campo, que, inclusive, no Cerest Estadual foi efetuada de diversas formas, como inspeção, fiscalização, em ação conjunta com a vigilância sanitária 7 , ocasionando louváveis conquistas para o campo, onde os trabalhadores entravam nas empresas e inspecionavam processos de trabalho danosos, que, inclusive, ainda ocorre em alguns CERESTs pelo Brasil. Dessa forma, a menção à vigilância, ainda sempre presente nos discursos dos trabalhadores, se desvela num 71 significado de busca pela legitimação do campo, por terem sido estas ações, embora remotas, concretizadas significativamente. No entanto, embora essa memória histórica influencie a forma de agir e pensar de seus atores, ao longo do acontecimento, houve um deslocamento de sentido para uma nova forma de se pensar saúde do trabalhador, que desloca o foco da vigilância para a promoção da saúde, que também, se reflete no contexto social que vivenciamos hoje, com novos desafios trazidos pela aceleração produtiva e a vulnerabilidade do mercado de trabalho, em que, embora a vigilância ainda seja considerada uma das ações mais importantes para a legitimidade do campo, esta se apresenta, atualmente, nos discursos dos entrevistados, como parte das ações de promoção da saúde, permitindo a compreensão de um olhar mais abrangente, como afirma Machado 83 , uma vigilância que permita a transformação do trabalho no sentido da promoção da saúde. trabalhar de forma saudável, um melhor acesso do trabalhador ao seu setor de trabalho, entender o porquê está adoecendo, determinantes, olhar ampliado, ambiente saudável, qualidade de vida, melhores oportunidades, MANTER UM AMBIENTE QUE NÃO ADOEÇA O INDIVÍDUO, seguro. “quando a gente trabalha identificando doenças e tentando entender o por quê está adoecendo, mas o nosso norte é a promoção da saúde.” “as ações de promoção da saúde são mais genéricas, mais gerais, e não estão voltadas unicamente para um tipo de adoecimento, como por exemplo...” “mas a promoção da saúde ela é mais ampla, que alimentação saudável, prática de exercícios são ações de promoção da saúde do geral,” “é justamente olhar o processo de trabalho pra tentar minimizar ali os determinantes que estão relacionados ao trabalho.” “é ter uma visão integral desse processo, como esse processo interfere na saúde ou na vida saudável dele.” “ter uma visão bem ampla do processo. as uma questão que acho importante é um ambiente saudável,” “quer dizer, esse ambiente é fundamental. só que ambiente de trabalho é uma coisa muito mais ampla, você tem que analisar,” “Seria a gente criar ou estabelecer ambientes saudáveis.” “pensar nessa promoção uma melhor qualidade ambiente saudável, um melhor acesso do trabalhador ao seu setor de trabalho, um melhor acesso a ele ao setor de saúde”, que é uma coisa muito mais abrangente que promover,” “promoção é a questão da qualidade de vida, dá ao trabalhador a conscientização de que ele tem direito a ter uma qualidade de vida melhor.” “que ter melhores condições” “a pensar na qualidade de vida por completo,” “também melhores oportunidades” “promover ambientes saudáveis de trabalho,” 72 “olhar ampliado” “Olha é um campo vasto, que está se fazendo ainda que está se construindo, que está feito, a promoção da saúde é....., ela vem antes de qualquer coisa”. “ambiente saudável. Um ambiente de trabalho saudável. Condições de trabalho saudáveis, quando eu falo ou afirmo condições de trabalho e ambientes saudáveis, mas um ambiente com mínimo de estresse.” “Então eu diria a promoção de um local de trabalho saudável, com relações saudáveis.” “PROMOÇÃO DA SAÚDE É MANTER UM AMBIENTE QUE NÃO ADOEÇA O INDIVÍDUO.” “A vigilância, não deixa de ser de promoção a partir do momento que eu com a vigilância eu tento garantir o ambiente saudável, eu tento garantir um trabalho, dentro do possível, seguro, né, é.... ao meu ver essa seria uma das formas de promoção da saúde, né, evitar acidentes, que tenha um ambiente saudável...” segurança, integralidade, perspectiva, melhoria Nestes discursos, tal como percebemos no anterior, predominou-se um interdiscurso lúdico, de forma prazerosa, que produziram deslizamentos de sentidos resignificando a promoção da saúde, na percepção dos trabalhadores entrevistados, em categorias empíricas de integralidade, segurança, perspectiva e melhoria. A integralidade se desvela nos discursos como um olhar voltado para diversos fatores e não somente os ambientes de trabalho, como o acesso deste trabalhador ao local de trabalho, como no discurso: “é ter uma visão integral desse processo, como esse processo interfere na saúde ou na vida saudável dele, um melhor acesso do trabalhador ao seu setor de trabalho”. Percebemos o significado de segurança relacionada a promoção de ambientes saudáveis através das ações de vigilância, como no discurso: “ A vigilância, não deixa de ser de promoção a partir do momento que eu com a vigilância eu tento garantir o ambiente saudável, eu tento garantir um trabalho, dentro do possível, seguro.” O significado de perspectiva se desvela nos discurso no sentido de promover ações que ofereçam mais oportunidades a este trabalhador, o que permite a compreensão de uma estratégia para a minimização da agressividade das relações vulneráveis do mercado de trabalho, como no discurso:“pensar na qualidade de vida por completo, também melhores oportunidades”, E, o significado de melhoria está relacionado às condições de vida e trabalho, com um olhar ampliado de saúde, com foco na saúde e não na doença. Nesse acontecimento, pudemos compreender que para se realizar promoção da saúde no campo da saúde do trabalhador é preciso ir além do setor saúde, a fim de promover uma “melhor qualidade de vida” e a efetividade das políticas públicas, onde os trabalhadores vivem e trabalham. Como relata Dias 45 , a orientação da promoção da saúde no campo da 73 saúde do trabalhador privilegia as ações sobre as condições de vida das pessoas e do coletivo, no território onde vivem e trabalham. Em outro momento, através de um discurso polêmico e autoritário, um dos entrevistados aumenta a entonação da voz para enfatizar que não deve olhar, somente, para o ambiente de trabalho, mas, também, para outras questões relacionadas à qualidade de vida, como o transporte utilizado pelo trabalhador, como no dizer: “não adianta falar PROMOÇÃO DA SAÚDE DO TRABALHADOR, EU VOU PENSAR SÓ NO LOCAL DE TRABALHO?, OLHA O DESLOCAMENTO DELE, (NÉ)...” o que permite compreender, na análise da forma e conteúdo, que o gesto de se aumentar o tom de voz e gesticulação ao falar, pode estar associado a uma reação de indignação com relação às ações que não competem apenas ao campo de saúde do trabalhador, em que o sujeito, afetado, argumenta de forma autoritária, que realizar promoção da saúde vai além do setor saúde do trabalhador, o que permite a compreensão de uma busca pelo compartilhamento da responsabilidade, onde percebemos o pressuposto de que a saúde do trabalhador não irá resolver o problema da população trabalhadora sozinha, mas necessita que outros setores, da saúde ou não, também, façam sua parte. Esse pressuposto só foi possível porque de acordo com Authier 72 , as palavras são porosas e carregadas de significados, que se fazem embutidos nos núcleos de outros discursos, que se desnudam em outras palavras caleidoscópicas. Nesse contexto, os gestos do entrevistado, podem também refletir a constante luta que vivencia o setor na busca de ações que promovam a promoção da saúde do trabalhador, onde o sujeito afetado pelo empírico produza discursos polêmicos que se desvelem em indignação e revolta. criar mecanismos que inibam, que evitem, ou que transforme esse processo de trabalho “mas a promoção da saúde ela é mais ampla, alimentação saudável, pratica de exercícios são ações de promoção da saúde do geral, já na saúde do trabalhador quando colocamos ela numa perspectiva de saúde ambiental, a gente também esta falando dessa forma mas ampla de promoção”. “perpassa e vão perpassar sempre pela promoção da saúde. Ou seja, por você criar mecanismos que inibam o, que evitem, ou que transforme, é..... Esse processo de trabalho e as consequências que esse processo de trabalho vai ter na saúde dos trabalhadores, ou seja, qual o impacto desse processo de trabalho nas condições de saúde e vida dos trabalhadores “. 74 “é lógico, é claro, então a gente vai estar trabalhando e aplicando como prevenção, e o que é essa prevenção, prevenir para remediar, como Foucault diz, também não serve, não vou prevenir, tendo uma prevenção que é..... eu gosto muito dessa expressa (risos) que é insalubre (risos), insalubridade, periculosidade, eu estou prevenindo, estou, mais não adianta, não vou mercantilizar a saúde do trabalhador, eu não vou pagar, ele sabe que daqui a 30 anos ele vai adoecer, então eu vou pagar esse pouquinho, não vou fazer isso, ...“ “prevenir pra remediar não é o caminho, o caminho é substituição”. prevenção, inibição, transformação Durante a análise dos interdiscursos produzidos pelos trabalhadores do CEREST, embora alguns entrevistados relatem a promoção, como uma ação mais completa e mais ampla que visa a transformação dos processos de trabalho, encontramos discursos que permitem compreender uma confusão entre os significados dos termos “prevenção” e “promoção”, como se fossem sinônimos, como no discurso: “alimentação saudável, prática de exercícios são ações de promoção da saúde do geral” que de acordo com Czeresnia18, há uma pequena e radical diferença entre prevenção e promoção, pequena porque as duas práticas fazem uso do conhecimento científico, e radical porque no caso da promoção as mudanças são profundas, onde, na maioria das vezes, promovem uma nova concepção de mundo, indo além de uma aplicação técnica e normativa, que não basta conhecer o funcionamento das doenças e encontrar mecanismos de controle, mas alcançar a transformação do meio. é pensar em todos os campos, não é fácil, a cristalização desse conceito de promoção da saúde, o termo por si só é muito vasto, buscar uma forma sempre de cristalizar esse conceito, porque já seria um ponto pacífico para o ser humano. “é pensar em todos os campos, né, entendeu? ao indivíduo, ao ser humano não só em saúde do trabalhador, então a promoção da saúde, ela vem antes de qualquer coisa, partido, religião ou trabalho, a saúde tem que estar presente pra que eu seja um individuo pleno, né, como define a organização mundial da saúde né, a sensação física, espiritual, é política, de todas as direções e bem estar dos indivíduos, né, então, quer dizer.... acho que eu sou uma sonhadora, promoção da saúde, acho que eu não deveria me preocupar com isso porque já seria um ponto pacífico para o ser humano”. “isso aí é fácil e muito difícil de responder, porque você teria que ver assim.... um ambiente saudável.” 75 “Então é através da promoção da saúde, e de suas vertentes, quer seja, vigilância, quer seja educação, quer seja, qual a forma que você vai estar dando, qual o formato, que você vai estar dando pra essa promoção da saúde, que o termo por si só é muito vasto e a gente tem que buscar uma forma sempre de cristalizar esse conceito que não é fácil, a cristalização desse conceito de promoção da saúde, que é a grande questão.” abrangência, dificuldade, legitimidade, indiscutibilidade Como percebemos nos discursos dos trabalhadores do CEREST, embora a promoção da saúde seja apresentada como fundamental para a Saúde do Trabalhador, ela se desvela no significante de abrangência, que compreende o deslocamento de sentido para o significado de dificuldade, por se contemplar num campo vasto de ações que reunidas irão proporcionar melhores condições de vida e trabalho para população trabalhadora. Logo, ao longo do acontecimento dos discursos, percebemos o deslizamento de sentido de abrangência para dificuldade, quando no discurso:“que o termo por si só é muito vasto e a gente tem que buscar uma forma sempre de cristalizar esse conceito que não é fácil,” em que o entrevistado relata que essa abrangência reflete dificuldade ao operacionalizá-la, que embora, sua importância seja indiscutível, como no discurso: “porque já seria um ponto pacífico para o ser humano” sua inoperância está relacionada à falta de legitimidade do campo, como no discurso:” buscar uma forma sempre de cristalizar esse conceito” que permite a compreensão do pressuposto da necessidade de legitimar a promoção da saúde no campo para poder operacionalizar suas práticas, diante da complexidade do campo, que gera discursos polêmicos e polissêmicos. A busca pela legitimidade do conceito de promoção da saúde, permite a compreensão de se tentar reduzir a abstração do termo, sua abrangência, numa forma mais concreta, que assegure o alcance dos objetivos, que possa se dar como uma força política e forneça credibilidade por parte da sociedade, sem ter que recorrer ao uso da força na realização de suas decisões. Como aponta Bobbio 84 , a legitimidade pode remeter dois significados, um mais genérico como o sentido de justiça ou racionalidade, mais utilizado no ramo das ciências jurídicas, e outro mais específico e mais utilizado no âmbito político, como o significado de um atributo do Estado, que adquire um grau de consenso em suas decisões, suficiente para impor a obediência sem o uso da coação, a não ser em casos esporádicos. Por ser o campo da saúde do trabalhador em sua essência político, foi possível compreender, nesse contexto, que a legitimidade forneceria um determinado poder ao setor, que permitiria a operacionalidade 76 dos projetos almejados como a vigilância e outras ações que vão de encontro com interesses econômicos e políticos, embora o poder nem sempre seja permanente e legítimo. Nos discursos produzidos pelos trabalhadores do Cerest, embora a vigilância seja considerada uma das mais importantes ações de promoção da saúde, que o setor almeja realizar, atualmente, um dos grandes entraves de se realizar a vigilância em saúde do trabalhador (VISAT), é a falta de reconhecimento da vigilância como uma ação legítima que resulte na obediência alheia. Segundo o sociólogo alemão Max Weber 85 , a legitimidade seria numa sociedade entre governantes e governados, o direito por parte dos primeiros de comandar e o dever, por parte dos segundos de obedecer, onde cita três possíveis fundamentos para a legitimidade da dominação política: crença na tradição, fundamento carismático e fundamento racional baseado na legalidade. Portanto, se tratando do campo da saúde do trabalhador, diante da conjuntura atual, em que há inúmeros embates com diversos setores da sociedade, leva-nos a crer que o uso da legitimidade baseada na legalidade torna-se um dos caminhos mais viáveis. educação, assessoria técnica, trabalhos intrasetoriais, capacita profissionais da atenção básica, levantamento das condições de saúde deles, palestras, é uma gota no oceano, é trabalho de formiguinha. “a gestão Estadual implementou a concepção de que os CERESTs não tem que fazer assistência paralela, mas fornecer assistência técnica.” “existe um projeto rural que a gente está inserido, onde estão sendo feitos trabalhos educativos, existe uma ação das pessoas, que estão sendo analisados e é uma ação também de educação;” “No Projeto Rio Rural a gente capacita profissionais da atenção básica, como médicos enfermeiros....”. “a gente faz mais trabalhos intrassetorial, essas coisas” “o que a gente faz lá na agricultura bem ou mal é uma ação de promoção da saúde” “No momento não..... há controvérsias, mas se eu for fechar agora num ponto bem crítico resumido eu acho que não, um ou outro faz palestras pra determinados agravos, é....., é.....buscam discutir alguns fóruns com a saúde do trabalhador, mas isso todos é......” “fazemos levantamento das condições de saúde deles, não é nada demais não só que é um projeto da agricultura que a gente tá inserido...” “o que nós estamos tentando realizar diante da dificuldade política..... ,é uma barreira que nós temos, são algumas coisas.... é, algumas capacitações..... pra identificar e melhorar a qualidade de vida de alguma forma por exemplo trabalhador que está tendo contato com agrotóxico, tá sendo realizado...... é com a intenção de melhorar a qualidade de vida desse pessoal, identificar as contaminações..... é fazer campanhas educativas.....” 77 cada um aqui consegue fazer alguma coisa..... “Então, estou lhe mostrando que por mais que a gente queira, as vezes não é tão fácil assim fazer a promoção da saúde //com ações que vão gerar essas coisas, né// (expressão de tristeza). O que nós estamos fazendo aí, é..., quer dizer //é uma gota no oceano//.” “Então, quer dizer, //é trabalho de formiguinha// (expressão facial de tristeza),” “Muitas, de educação pra mim é a principal, fundamental, eu acho que é através da educação que a gente vai conseguir afastar essa invisibilidade, pra ter um caráter mais efetivo das nossas ações é através da educação, e junto com a educação a gente vê toda essa questão da prevenção, da promoção, da vigilância, vigilância é uma forma de promoção da saúde, hoje lá na secretária a gente tá dentro da vigilância em saúde, vigilância em saúde significa promoção da saúde.” “a gente veio trabalhando a promoção da saúde através de capacitação, porque mais uma vez o estado não pode interferir diretamente das ações de saúde do município.” “então quando você começa a fazer isso você tem por exemplo algumas ações em prol da promoção..... embora eu ache que isso ainda é muito pouco.” capacitação, supervisão, atenção à saúde, intrasetorialidade, impotência Nos discursos, dos entrevistados, analisados como: “estamos tentando realizar diante da dificuldade política..., e cada um aqui consegue fazer alguma coisa.....”, foi possível perceber o pressuposto de que são poucas as ações possíveis de se realizar, embora muito desejadas, refletindo o significado de impotência do setor para o êxito do programa. Dentre as ações possíveis, consideradas pautadas na promoção da saúde pelos trabalhadores do CEREST, percebe-se na maioria dos interdiscursos dos sujeitos entrevistados a realização de atividades voltadas para a capacitação, a fim de orientar a conduta dos outros CERESTS regionais, trabalhadores e profissionais de outros setores, como da agricultura e da saúde, como nos discursos: “assessoria técnica, trabalhos intrasetoriais, capacita profissionais da atenção básica, levantamento das condições de saúde deles, palestras,” que permite o deslizamento de sentido para ações de promoção da saúde no âmbito da capacitação em saúde, através de supervisão e atenção à saúde, que são planejadas dentro do próprio setor pela equipe do Cerest, portanto intrasetoriais, como no discurso: “a gente faz mais trabalhos intrassetorial, essas coisas”. Estas ações relatadas nos interdiscursos dos entrevistados contemplam apenas uma parte dentro do conjunto de ações que resultam na promoção da saúde, posto que promover no conceito de promoção da saúde, como relata Czeresnia 18 , é muito mais ampla que prevenir, já que enfatiza a transformação das condições de vida e de trabalho, que demandam atividades intersetoriais e efetividade da qualidade de vida e bem estar geral da população. 78 Neste contexto, vários são os discursos dos trabalhadores entrevistados, que permitem resignificar que as atividades realizadas ainda estão muito aquém do que o CEREST deva fazer como pudemos perceber nas falas: “O que nós estamos fazendo aí, é..., quer dizer //é uma gota no oceano//”, “...Então, quer dizer, //é trabalho de formiguinha//” (expressão facial de tristeza)” que embora desvele o subentendido de impotência em seu intradiscurso, devido aos gestos de tristeza, angustia, e dos relatos sobre as dificuldades para a completude das ações, que são tidas como imperceptíveis, insignificantes, traz o paradoxo, no mesmo fato, de se comparar ao labor das formigas, que são persistentes, carregam até cem vezes o peso de seu corpo e não param de trabalhar, ou seja são persistentes, permitindo a produção de um discurso positivo. Nesse contexto em que se une a forma tida com expressão de tristeza e o conteúdo do enunciado: “é apenas uma gota no oceano”, nos discursos produzidos pelos trabalhadores do CEREST, permite o deslizamento de sentido para o subentendido de um sofrimento psíquico desvelado durante o acontecimento do intradiscurso pelo sujeito, em que esse labor é desprezado, tido como insignificante diante das inúmeras ações que ainda precisam ser realizadas. Quando Arendt 66 faz uma crítica sobre a não distinção pela modernidade de labor e trabalho, relaciona o desprezo pelo labor à resultante luta acirrada do homem contra a necessidade e uma impaciência com relação a todo esforço que não deixe qualquer vestígio, qualquer grande obra, digna de ser lembrada. Nesse, o labor representa a ação, enquanto o trabalho traria o resultado ligado ao produto final. Diante dessas discussões, torna-se interessante ressaltar que num setor por demasiado complexo, como dos CERESTs, que envolve diversos interesses de difícil consenso, a realização de qualquer ação, por menor que seja sua repercussão, são muito significativas frente às barreiras e dificuldades políticas enfrentadas pelos trabalhadores do setor. contabilizar mortes, a gente vai continuar trabalhando com as distorções, contabilizar multilados, criam-se sistemas pra contabilizar, espírito de porco “o que estamos fazendo hoje na saúde do trabalhador é contabilizar mortes. contabilizar multilados, e aí, essa contabilidade é feita através dos sistemas, que criam-se sistemas pra contabilizar” “depende do foco ou do objeto que a gente vai tratar, porque dependendo do foco ou do objeto e da necessidade que a gente tenha da promoção ou do objeto que a gente vai estar trabalhando, ela não vai ter efetividade, a gente vai continuar 79 trabalhando com as distorções, a gente vai continuar trabalhando com ações, ações de promoção, são pontuais” “os gestores das saúdes ou o prefeito ou a gestão municipal, não interessa a eles que você mantenha isso de forma bem clara e objetiva todas as notificações..... em que você penetre nos ambientes de trabalho e que todas as doenças, todos os agravos, né, que os trabalhadores são suscetíveis, que eles sejam notificados, pois existe um espírito de porco, do meu ponto de vista, que os trabalhadores são suscetíveis, que eles sejam notificados, pois existe um espírito de porco, do meu ponto de vista, tá, que a experiência que eu tenho de 08 anos que não existe interesse do gestor da saúde municipal, nem do gestor do município, que as empresas que estão em atividades nos seus municípios sejam vistoriadas, e quando vistoriadas que as declarações é..... que as notificações de agravos na ST de cunho obrigatório, que apareçam no sistema de informação, (t.03), falta de efetividade, distorção, mortalidade, mutilação, desinteresse, descaso Neste contexto, os trabalhadores do CEREST produziram discursos polêmicos, que permitiram deslizamentos de sentidos das ações realizadas para o pressuposto de um sistema conivente com a situação atual, como no discurso: “criam-se sistemas pra contabilizar, contabilizar mortes, multilados” que permite o deslizamento para “espírito de porco”, que pode estar associado às dificuldades de agir frente aos embates políticos e econômicos, que acaba por se situar numa condição cômoda, embora de cúmplice dos “multilados”. Os registros, embora insuficientes quando comparados à realidade, tem um importante papel epidemiológico no campo da saúde do trabalhador, como relata Minayo 9 , estes ainda se apresentam insuficientes para apresentar um diagnóstico da situação dos trabalhadores brasileiros que possa guiar um plano de ação, que fundamente políticas viáveis com a real necessidade da população trabalhadora, que dada à conjuntura atual, qualquer análise dos agravos à saúde dos trabalhadores será parcial e incompleta. Neste discurso dos trabalhadores do Cerest, onde as palavras são porosas e caleidoscópicas 72 , percebemos significados de falta de efetividade e desinteresse, que permitem o deslocamento de sentido para mutilação, quando no discurso: “não existe interesse do gestor da saúde municipal, nem do gestor do município, que as empresas que estão em atividades nos seus municípios sejam vistoriadas”, para o pressuposto, em que a indignação percebida não está em notificar, mas em apenas contabilizar, sem responder às demandas ou tomar atitudes efetivas e transformadoras dos processos de trabalho danosos, impedindo a recorrência das iniquidades no mundo do trabalho. 80 A forma com que são realizadas as ações em saúde do trabalhador parece, seguir unicamente um processo investigativo que não tem meio e fim, apenas se inicia e que, infelizmente, por ser ainda inconsistente, sua contribuição ainda é insuficiente, não contemplando às demandas da sociedade. Em outro momento do acontecimento do discurso, o sujeito permitiu o desvelamento de sentido da fala: “espírito de porco, que não existe interesse do gestor da saúde municipal, que as empresas que estão em atividades nos seus municípios sejam vistoriadas” para o resignificado de descaso, isto porque se busca o registro das iniquidades com maior ênfase, em detrimento das respostas às demandas que surgem. O que alimenta um sistema de rebote, em que a investigação ganha mais importância que a resolução, não que não se queira resolver, mas que a política que se constrói permite essa compreensão para os atores envolvidos e sensibilizados com o a experiência prática do campo. De acordo com Vasconcellos 31 , ao observar a trajetória institucional da Saúde do Trabalhador, evidenciou que a Saúde do Trabalhador configurou-se num campo de políticas públicas não assumidas de forma prioritária pelo Estado Brasileiro, embora as relações saúde-trabalho tenham tamanha relevância para a saúde pública. Infelizmente, nos deparamos, constantemente, com essa triste realidade, onde quando relatados os acidentes de trabalho, que viram notícias cinematográficas, como exemplo o caso do pedreiro, noticiado, que foi atingido por um ferro que atravessou o seu crânio, quando na execução de um trabalho inseguro e com periculosidades, a atenção foi toda voltada para o milagre da sobrevivência, onde se tornaram quase que invisíveis a ação do Estado frente ao drama e trabalho inseguro que vivem estes trabalhadores. E exemplos não faltam, como as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) do governo, onde não nos foram apresentados preocupações com os trabalhadores temporários, que foram contratados para a realização das obras, que dirá dos trabalhadores informais que permanecem numa infinidade de riscos e ainda são invisíveis a um Estado, que deveria ser de direitos e deveres. seria, poder trabalhar, fazer as ações, Estamos tentando, vigilância, evitaria a gente estar trabalhando na consequência 81 “A vigilância que é mais diretamente ligada a ... promoção da saúde ... e a educação em saúde que é uma importante ação de promoção da saúde.” “a vigilância em saúde é o elemento fundamental, o controle social, não é isso?, através dos sindicatos, categorias, que estão previstos tanto na constituição federal, como na Estadual, na lei orgânica, como fazer vigilância com a equipe de saúde do trabalhador, na saúde do trabalhador” “..... a vigilância que a gente fala é fazer uma vigilância dos ambientes de trabalho, ou seja, pessoas capacitadas em vigilância em saúde do trabalhador... não só capacitadas dentro da pesquisa, mas claro que isso é fundamental, mas são pessoas de várias áreas, que atuem, no campo da saúde.” “a gente faz mais trabalhos intrassetorial, essas coisas, mas a vigilância a gente não faz, o poder de fiscalização a gente até tem mais não está autorizado, mas dentro da legislação a gente tem o poder, a gente pode fiscalizar, a gente sempre fiscalizou (há dois anos atrás), só que a gente abdicou desse poder, porque a vigilância sanitária diz que só ela que pode.” “eu acho que a vigilância seria uma ação sendo feita completa é...... você poder trabalhar com a questão da promoção..... que quando você fala em vigilância você tem que entender que você não faz vigilância só no ambiente de trabalho, ambiente de trabalho é uma ação secundaria, é daquilo que você vai identificar, e lá você vai fazer as ações e fiscalizações..... nessa você vai olhando pro sistema de informações que você tem do SUS, o SINAN, além das informações que nos chegam através dos sindicatos, dos representantes dos trabalhadores, e aí sim, você estaria fazendo ações em loco, dos ambientes de trabalho.....,” “Estamos tentando mudar o código sanitário em questão no RJ, tá mais de 5 a 6 anos que ele tá pronto, só que ele está, de certa forma ..... mantido longe dessas discussões pela própria Secretaria de Saúde, então tem que perguntar pra secretária de saúde porque o código sanitário está pronto a mais de 05 anos e não foi aprovado.” “então é aquela coisa dizer vamos fazer a promoção da saúde, mas mostrar como é que vai ser feita aquela coisa, essas ações de promoção da saúde..... promoção e vigilância, que era o que evitaria a gente estar trabalhando na consequência, ou seja, depois que o acidente acontece, depois que o trabalhador adoece, não é feito.” Desejo Nos interdiscursos, dos entrevistados analisados, percebemos um discurso reversível entre o polemico e o lúdico. No lúdico produziu-se um discurso de forma prazerosa sobre as ações que poderiam alavancar e facilitar as ações de promoção da saúde na saúde do trabalhador, como a vigilância e a intersetorialidade. No discurso polêmico o sujeito permite compreender que estas ações, embora consideradas vitais para o programa, significam, apenas, objetos de desejo, que por velhos e novos motivos, como a falta de aprovação para o uso do código sanitário, embates políticos com a vigilância sanitária, e a falta de um projeto operacionalizável, falta de intersetorialidade, dentre outros, impedem sua operacionalização. Neste acontecimento, onde se predominou o discurso polêmico, pudemos compreender em seus significados, que diversos foram os obstáculos revelados pelos 82 trabalhadores do campo, que através das suas experiências relatadas contribuíram para compreender porque este campo é tido como conflituoso e complexo para o êxito das ações de promoção da saúde. 7.2 RELAÇÕES INTERSETORIAIS Optou-se por criar esta categoria conceitual, por ser uma das principais estratégias que propiciam o desenvolvimento das ações de promoção da saúde. E por ser o campo da saúde do trabalhador, um campo abrangente e complexo, que realiza ações heterogêneas, estas relações são essenciais para o êxito da política de promoção da saúde do trabalhador. dificuldade de interação, esses órgãos não dialogam, questão da intersetorialidade é difícil aqui na secretaria...., há uma falta de conversa muito grande aqui dentro da Secretaria de Saúde do Estado do RJ, o problema é integrar....., vigilância aqui também que não se integra, os programas não se comunicam, a vigilância em saúde hoje no Estado do RJ está desarticulada, não está instruído institucionalmente, o nível de organização ainda é jurássico. “há muita dificuldade de interação entre os setores da secretária” “as vigilâncias trabalham em separado... você tem vigilância em ST, vigilância sanitária, vig. ambiental... só que esses órgãos não dialogam, a principal causa disso é que não existe interesse nenhum dos gestores para que isso ocorra, muito pelo contrário, tá eles até evitam que isso ocorra, visto é o nosso código sanitário, que não sai”. “um Sistema fechado.....” “Isso é um afunilamento que estamos discutindo até agora,” “No Projeto Rio Rural a gente capacita profissionais da atenção básica, como médicos enfermeiros..... porém a pessoa que conversava com a atenção básica saiu e ficou parado.....” “Não fazem questão de juntar o povo pra se reunir..... trabalhamos em caixinha.” “hoje em dia. tu sabe as intenções do cara.... pedem sala p/ reuniões... e não tem nada registrado sobre os acordos intersetoriais.... mas você tenta trazer outros setores...” “A ATENCAO BASICA, OUTROS MOVIMENTOS, e o pessoal da saúde, mas eles não se falam.” “a questão da intersetorialidade é difícil aqui na secretaria....” “Não são fáceis a intersetorialidade, a burocracia também,.... mas a maior barreira é a falta de conhecimento da saúde do trabalhador do SUS pelos gestores.” “e tem a vigilância aqui também que não se integra.... então como vamos discutir a promoção? realmente teria que ter a intersetorialidade.” “o problema é integrar...” “porque há uma falta de conversa muito grande aqui dentro da Secretaria de Saúde do Estado do RJ, eu acho, que não sei se é da própria dificuldade da política 83 atual, né da macropolítica, que emperra todos os setores, e aí quando emperra todos os setores, né, os setores acabam trabalhando muito individualmente, o que já é difícil trabalhar individualmente, você imagina em conjunto.” “Se você não está instruído institucionalmente pra você defender uma ideia, uma política, um modo, de operar, como que você vai defender?..... eu não posso chegar lá e falar por mim..... entendeu? porque tem uma instituição por trás.” “O que eu vejo, é que na saúde do trabalhador, né, o gestor não basta ser técnico, ele tem que ter uma boa habilidade política e uma boa habilidade pra transitar entre os outros setores pra que a gente possa ganhar espaço nos diversos setores, né.” “A GENTE NÃO TEM A INTER SETORIALIDADE NOS GOVERNOS FEDERAIS, NÓS TEMOS UM SUS QUE TEMOS O MTE, MS E NENHUM DOS DOIS CHEGAM A CONCLUSÃO NENHUMA SOBRE A VIGILANCIA DE ST.” “ENTAO É MUITO DIFICIL VOCÊ FALAR DE PROMOÇÃO DA SAÚDE A NIVEL MUNICIPAL E ESTADUAL SE O FEDERAL NÃO SE ENTENDE, NÃO É VERDADE..... MTE, DA ECONOMIA E DA SAÚDE NO PAPEL. (expressão de indignação)...Desculpa! (risos)” “mas os programas não se comunicam, a vigilância em saúde hoje no Estado do RJ está desarticulada, vou usar um eufemismo o nível de organização ainda é jurássico.” ausência de intersetorialidade Nos interdiscursos dos trabalhadores do CEREST, é possível perceber que ora eles se apresentam lúdicos expressando a importância da intersetorialidade para o desenvolvimento das ações, ora polêmicos ao se discutir os motivos que impedem o não alcance da intersetorialidade, permitindo o deslocamento de sentido para a falta de uma política que contribua para que esse processo ocorra de forma permanente, independente da gestão. Segundo Machado 22 , não são claros o papel e os limites das ações intrassetoriais da saúde, de como, quando e de que forma devem ser desenvolvidas ações intersetoriais. A hegemonia da lógica do modelo médico assistencialista acaba por dificultar a gestão intersetorial por não reconhecer que as problemáticas das relações trabalho-saúde vão além do setor saúde. A intersetorialidade é um dos pilares para se realizar promoção da saúde. Sua importância se expressa, principalmente, na resolução de problemas que ultrapassam a competência de um ou mais setores. Quando a intersetorialidade não pode ser realizada diversos projetos ficam à deriva, ou seja, se perdem sem serem executados. Como aponta Lacaz 86 , a intersetorialidade é muito importante como estratégia de articulação com as instancias da atenção básica, Programa de Saúde da Família, urgência e emergência, media e alta complexidade, e também com as instancias das vigilâncias em saúde do trabalhador como 84 a epidemiológica, sanitária e ambiental, principalmente, para romper com a lógica médico- assistencialista. No contexto do intradiscurso são produzidos sentidos que resignificam impotência, como no discurso: “não tá fácil, tá difícil, ficou parado,” com relação as inúmeras tentativas de se relacionar com os outros setores. E por ser um tema que afeta o sujeito consciente de sua importância, este produz discursos polêmicos como: “mas a maior barreira é a falta de conhecimento da saúde do trabalhador do SUS pelos gestores”, em que permite a compreensão da falta de reconhecimento da importância da saúde do trabalhador para as outras políticas de saúde. Desde início da década de 90, havia muita dificuldade de se estabelecer articulações intersetoriais mais sólidas e efetivas entre setores governamentais de saúde, trabalho e previdência como relata Vasconcellos 30 , restringindo, ainda mais, o poder de realização de ações heterogêneas. Dessa forma, embora diversos discursos relacionados tenham sido pronunciados de forma lúdica com relação a importância das relações intersetoriais para o alcance de ações heterogêneas, permitiu compreender nos discursos polêmicos dos entrevistados, singularidades associadas à gestão, como nos discursos: “Se você não está instruído institucionalmente pra você defender uma ideia, uma política, um modo, de operar, como que você vai defender?..... eu não posso chegar lá e falar por mim..... entendeu? porque tem uma instituição por trás.” e também: “O que eu vejo, é que na saúde do trabalhador, né, o gestor não basta ser técnico, ele tem que ter uma boa habilidade política e uma boa habilidade pra transitar entre os outros setores pra que a gente possa ganhar espaço nos diversos setores, né.” que se desvelam, na compreensão dos significados, de que o gestor tem o papel essencial de formular situações que favoreçam as relações intersetoriais, embora, como constatado historicamente, essas relações sejam difíceis e conflituosas. No entanto, para o envolvimento de outros setores com o setor saúde do trabalhador, é preciso criar relações que interessem que permitam o diálogo entre outros setores ao ponto de promoverem uma integração mútua, como relata Bordieu 87 , a obra de arte só adquire sentido para quem é dotado de um código segundo o qual ela permite ser decodificada, onde o espectador desprovido do código específico sente-se submerso, afogado. Dessa forma, não existem relações desinteressadas, mas uma relação de interesses mútuos, que permita uma reciprocidade dos atores envolvidos. Como afirma Artmann 88 , a intersetorialidade possui um 85 enfoque interdisciplinar, e não apenas uma mera junção de setores, sem nexos conceituais e metodológicos. No entanto, a Saúde do Trabalhador, mais especificamente o Cerest, lida com questões que ultrapassam o setor saúde, que para alcançarem a promoção da saúde precisam se relacionar com outros setores, onde a intersetorialidade é uma estratégia fundamental para o alcance dos objetivos, já que a promoção da saúde, como relatados nos discursos analisados, se contempla num conjunto de ações diversas que promovem qualidade de vida à população trabalhadora, tanto formais quanto informais. Portanto, estas questões importam serem levantadas, embora o setor desvele, em seus discursos, o significado de ausência de intersetorialidade, a fim de que haja uma reflexão que traga subsídios para promover mudanças na forma de agir ou pensar às ações que poderiam fortalecer os relacionamentos intersetoriais, que apesar de conflitantes e complexos, é uma grande estratégia para enfrentar muitas dificuldades do setor público e buscar ajuda, como racionamento de recursos, ideias inovadoras, compartilhamento de saberes, entre outros benefícios, que compensam essa luta. 7.3 PARTICIPAÇÃO DOS TRABALHADORES A escolha desta categoria conceitual se embasou na reflexão da importância e conquista histórica da participação dos trabalhadores no compartilhamento de saberes, como no Movimento Operário Italiano, e em outras conquistas que permitiram a configuração do campo. E, também, por se constituírem como estratégias fundamentais a realização das ações de promoção da saúde no campo, optou-se por investigar como estão se dando estas participações nos Centros de Referencia em Saúde do Trabalhador. No entanto, cabe destacar, de acordo com Silveira 89 , que o controle social dos serviços que compõem a Renast, ocorrem mediante a participação de organizações de trabalhadores e empregadores, das Conferencias de Saúde, dos Conselhos de Saúde, das Comissões Intersetoriais de saúde do trabalhador (Cist), sendo que, no âmbito dos Cerests, para o êxito destas relações, devem ser criados e implementados conselhos gestores. Dos representantes sim, você entra em contato direto com os trabalhadores, Hoje, na prática eu não vejo o envolvimento do controle 86 social, Não existe conselho gestor em todos todos os CERESTs, enxugar gelo, hoje a gente tenta, é o trabalhador desvelando, mostrando a realidade, ter o trabalhador como proponente da ação não como um mero objeto das teses, “Dos representantes sim, você tem os sindicatos dos trabalhadores, CIST, que há em algumas regiões...” “agora com esse evento do Rio Rural você entra em contato direto com os trabalhadores....” “profissionais que atuam e p/ o controle social também. Hoje, na prática, eu não vejo o envolvimento do controle social. eu não vejo o envolvimento.” “né, o CEREST do RJ caiu muito a questão da procura de trabalhadores encaminhados pelos sindicatos, os sindicatos também quando encaminham, eles trabalham na lógica de enxugar gelo, pra encaminhá-los, pra fazer um nexo de causalidade na rede mais ou menos nesse sentido, tá, então eu acho que o envolvimento do controle social trabalhando com a saúde do trabalhador eu acho extremamente importante” “Não existe conselho gestor em todos os CERESTs. Então para que isso pudesse ocorrer de forma normal, teria que ter um conselho gestor pra cada CEREST, porque é formado pela equipe e pelo controle social.” “Ainda tem regiões que estão tentando montar as suas CISTs” “porque você não faz ST sem o trabalhador, então antes a ST do Estado estava rompida com os conselhos, com o controle social, e hoje a gente tenta trazer mais o trabalhador como preponente das ações não como método, como objeto de estudo, isso é muito importante dentro de ST, do campo é você ter o trabalhador como proponente da ação não como um mero objeto das teses, das pesquisas, das análises médicas, é o trabalhador no sentido mesmo da ST, é o trabalhador fazendo o campo, construindo o campo.” “não é a saúde que vai cuidar do trabalhador, não o trabalhador construindo juntos as condições que vão gerar melhorias na sua vida e nas condições de saúde(t.7)” “ Ocorre através das CISTs que são os centros de saúde do trabalhador dentro dos conselhos de saúde, então a gente tenta promover, que são os trabalhadores que vão dizer lá nos municípios do que eles precisam, é o trabalhador que precisa de capacitação, é o trabalhador desvelando, mostrando a realidade, que as vezes a gente quer arbitrar uma realidade....” ausência do controle social, impotência Os discursos dos trabalhadores do CEREST apresentaram reversibilidade entre o discurso lúdico e o polêmico. No lúdico, permitiram deslocamentos de sentidos, de forma prazerosa, através da memória histórica, de trazer o trabalhador como preponente das ações nas políticas de saúde, como no Modelo Operário Italiano (MOI), na busca de compartimento de saberes e ações, como relatado pelo entrevistado: “hoje a gente tenta trazer mais o trabalhador como preponente das ações não como método, como objeto de estudo, isso é muito importante dentro da Saúde do Trabalhador”, onde apontam, que tentativas tem sido feitas para aumentar a participação dos trabalhadores nas políticas, como o incentivo às implantações das Comissões Intersetoriais de Saúde do Trabalhador (Cist), que embora, 87 insuficientes, existem como instancia de controle social do SUS, desde início da década de 90, com o objetivo de assessorar o Conselho Nacional de Saúde (CNS), embora não possua poder deliberativo ou resolutivo, e estabelecer propostas na formulação de políticas para a área 90 . No entanto, na maior parte das vezes predominou-se o discurso polêmico, em que o sujeito, afetado pela experiência de trabalho e descentrado, produziu singularidades que refletiram as dificuldades e motivos que emperram o desenvolvimento das ações, como no relato: “Não existe conselho gestor em todos os CEREST ainda tem regiões que estão tentando montar as suas CISTs”, ou seja, o que permite compreender que, embora sejam instancias essenciais para o diálogo com o controle social, ainda são insuficientes, ausentes e vulneráveis frente a lógica do mercado capitalista, onde os interesses políticos e financeiros de quem detém o poder ainda são privilegiados, em detrimento das necessidades da população trabalhadora. Como aponta Vasconcellos 90 , embora, a Cist seja considerada um rico espaço de reflexão política, ainda se encontra muito restrita, tanto pela sua representatividade, quanto pela baixa repercussão de suas representações nas bases do campo. Além disso, após mudanças governamentais em 1993-1994, perdeu sua força inicial e se transformou num espaço formal, técnico, sem capacidade político constitucional de encaminhar propostas concretas para articulações governamentais. Diante destas discussões, fica claro, que ainda temos muito que caminhar para alcançar maior envolvimento do controle social, através de relações sólidas e efetivas, posto que nesta relação assimétrica, embora esteja claro a importância destas relações para o campo e o esforço do setor para melhorá-las, como apresentaram os discursos analisados, ainda são impotentes para a efetividade das ações de promoção da saúde no campo, que devido às fortes influências e mudanças políticas, governamentais, que surgem ao longo do tempo, tornam-se fragilizadas e vulneráveis em suas decisões, resignificando ausência do controle social. 7. 4 ESTRUTURA DO SETOR A escolha de se investigar sobre a estrutura do setor, se baseou em compreender como a organização está estrutura e capacitada para a realização das ações de promoção da saúde no campo da saúde do trabalhador, e também, por ser considerada uma importante aliada, de grande peso, para as relações de trabalho e ações desenvolvidas pelo setor. Como 88 relata Helman 91 , o ser humano possui dois corpos, o físico e o social, e na nossa sociedade o corpo social (político) exerce um controle poderoso sobre todos os aspectos do corpo individual, como vestimenta, sua forma, posturas, comportamentos, suas atividades, saúde e doença. Neste percurso, de acordo com os relatos dos entrevistados, obtivemos discursos positivos e prazerosos com relação ao quantitativo de pessoal técnico, capacitados e especializados. No entanto, com relação à parte física do setor, como o espaço, a organização do setor, os recursos materiais e financeiros, a manutenção de ferramentas e seu relacionamento com os demais setores da secretária para a operacionalização da promoção da saúde, aconteceram discursos negativos e polêmicos, que permitiram o surgimento de singularidades que refletiram um sofrimento psíquico, vivenciado pelos trabalhadores do setor, relacionado com a busca incessante para se constituir um corpo, uma identidade, que forneça maior visibilidade ao setor e produza a efetividade das ações. equipe muito capacitada, em termos quantitativos temos o suficiente, equipe é multiprofissional, força, capacitação e garra “temos uma equipe muito capacitada” “Em termos quantitativos temos o suficiente, ...nem sempre eles estão funcionando de forma adequada” a nossa equipe é multiprofissional, sendo que as condições de trabalho, que você possa desenvolver toda a capacidade destes profissionais em ST são dificultadas pela própria falta de interesse, né, da SES” . nós temos um corpo técnico adequado”. “força, capacitação e garra nossa equipe tem muito todos ali são apaixonados pela saúde pública” profissionalismo, compromisso Como pudemos perceber nestes discursos analisados, foi possível compreender discursos positivos com relação à satisfação do quantitativo técnico e suas respectivas capacitações para a realização das atividades em prol da promoção no campo da saúde do trabalhador. Este contexto, permitiu o desvelamento para o significado de um setor em que se busca compromisso com relação a obtenção de capacitação e envolvimento técnico com a área, onde, além disso, com relação aos discursos dos entrevistados, todos relataram ter de seis a catorze anos de experiência no campo, e possuírem, além de nível superior, alguma 89 especialização relacionada à área, como mestrado e/ou doutorado na área de saúde pública, médicos do trabalho, engenheiro agrônomo, curso de especialização de saúde do trabalhador, que demonstra conhecimento técnico e multiprofissional prévio sobre a área. No entanto, embora haja uma equipe envolvida, com os saberes acadêmicos referentes ao campo, foram relatados, pelos entrevistados, diversos problemas com relação à estrutura, que impedem e/ou dificultam o desenvolvimento das ações em promoção da saúde. Destes, foram citados como principais: a falta de recursos materiais e financeiros, burocracia, letargia, a descontinuidade das ações, falta de vontade política, falta de um norte ou de uma identidade que fortaleça a política e permita ações operacionalizáveis, entre outros, que se desvelaram num adoecimento psíquico apresentado pelos trabalhadores do setor durante outros momentos das entrevistas, como a seguir: de cima pra baixo, alguma coisa é feita só que é muito menor..... não temos nenhum laboratório, são insuficientes, tem que ter melhor estrutura, quando você vem pra cá a realidade é outra, bem distante do que você discute lá....., os recursos não estão sendo repassados, não consigo carro, financiamento, letargia, os setores que ganham ou geram recursos financeiros, eles funcionam muito bem. “não temos nada” “sei que envolve uma serie de coisas.....envolve recursos, só “que o que acontece, os recursos não estão sendo repassados a eles, então um elemento fundamental.....” “como nós Centros de Referencia não temos acesso aos nossos recursos?” “isso desmotiva..” “Nós não temos nenhum laboratório, o Lacen, nada” “eles usam os recursos de cima pra baixo sem consultar ninguém” “a gente fala a mesma coisa a 500 anos, como você pode ter vigilância sem ter laboratório, a gente só se reúne quando ALGUEM RESOLVE.... (agitação fisico- motora)” “as parcerias com os laboratórios são insuficientes, tem que ter melhor estrutura, como em outros países...” “alguma coisa é feita só que é muito menor.....” “quando você joga num campo da academia você tem uma discussão muito teórica, e quando você vem pra cá a realidade é outra, bem distante do que você discute lá..... então você busca “...olha tem conhecimento, tem financiamento.... mas chega aqui eu vejo que o financiamento é amarrado, que eu não tenho o estado reconhecendo a saúde do trabalhador, identificando o que é a saúde do trabalhador....” “o nosso plano de saúde (PAS), foi cortado 75% das nossas ações foram cortadas pela subsecretária de saúde.” “A lei sai, mas o dinheiro pra que aquela coisa seja realizada não tem!” “A burocracia atrapalha porque não consigo carro, não consigo ação, é driblar essa demora essa letargia” “É obvio, o que é essa burocracia? a forma como está estruturada “porque pra você fazer ação de promoção, você tem que ter um plano de carreira, salário, tem que ter estrutura de saúde, e tem que ter uma política norteadora, e bem definida, por exemplo, na época de dengue para tudo, para tudo por causa da dengue .” 90 “Só quando tivermos dinheiro, como não teremos nunca (risos) nunca faremos (entonação irônica)... essa é a política (risos).” “os setores que ganham ou geram recursos financeiros, eles funcionam muito bem .” “impossibilita você não ter um carro, não ter uma sede do CEREST, que te dê ferramentas, a gente precisa de ferramentas pra trabalhar, a gente tem essas ferramentas teóricas, mas que não consegue usar (expressão de revolta, indignação.” ” o gestor não basta ser técnico, ele tem que ter uma boa habilidade política e uma boa habilidade pra transitar entre os outros setores pra que a gente possa ganhar espaço nos diversos setores” autoritarismo, precarização, desorganização Em outros momentos do acontecimento da entrevista, com os trabalhadores do CEREST, os discursos dos entrevistados refletiram, através da análise da forma e conteúdo, situações de autoritarismo vivenciadas pelos funcionários do setor, como podemos constatar em: “eles usam os recursos de cima pra baixo sem consultar ninguém, o nosso plano de saúde, (PAS), foi cortado 75% das nossas ações foram cortadas pela subsecretária de saúde” onde é possível compreender que embora se cultue no sistema público uma política mais democrática, participativa, como bottom-up (de baixo para cima), onde ao se implementar decisões ou utilizar os recursos são consultados os atores da ponta responsáveis pela execução das tarefas, que possuem saberes que facilitam o empreendimento dos recursos, na prática é muito comum a utilização do sistema top-down (de cima para baixo), onde são tomadas decisões que, além de se apresentarem autoritárias, impedem o êxito de outros serviços que não participam dos processos decisórios, e que se participassem iriam ter uma contribuição ímpar das reais necessidades da sociedade 92 . Essa desorganização do sistema, essa falta de diálogos entre os atores que constroem as políticas, onde os que liberam os recursos não consultam os atores que os utilizam, se torna mais uma barreira para o êxito dos projetos no campo da promoção da saúde para a saúde do trabalhador no setor. Além disso, esses acordos, que ocorrem de “cima para baixo”, não são regulamentados e, na maioria das vezes, passam a depender da gestão política do setor para seu êxito, onde, podemos perceber nos relatos dos entrevistados: “o gestor não basta ser técnico, ele tem que ter uma boa habilidade política”, em que permite a compreensão de que a continuidade da política é determinada, principalmente, pela boa vontade política, onde mostra que ainda vivemos em tempos de “clientelismo”, onde se formam elos de favores e interesses que se desvelam em autoritarismos na utilização dos recursos públicos e do poder 91 político nas decisões, e não acordos éticos que deveriam privilegiar o bem público em prol da saúde de todos. Em outros relatos como: “impossibilita você não ter um carro, não ter uma sede do CEREST, que te dê ferramentas, a gente precisa de ferramentas pra trabalhar, a gente tem essas ferramentas teóricas, mas que não consegue usar (expressão de revolta, indignação).” torna possível compreender que há uma intensa precarização dos recursos materiais e financeiros, que se reflete em barreiras que impedem a realização de diversas ações de promoção da saúde no campo, que embora possua um arcabouço teórico de leis, normas, portarias, enfim, que afirmem os direitos e deveres da política, no campo prático divergem da realidade, paradoxalmente, onde persiste a burocracia, a letargia na aprovação dos projetos e recursos, a inacessibilidade de recursos materiais e financeiros, gerando desânimo, desmotivação, indignação e impotência, e permitem o desvelamento de sentido para o significado de um setor desorganizado e desestruturado, que está adoecendo seus próprios trabalhadores. não temos referencia e contra referencia, em termos quantitativos temos o suficiente, ... nem sempre eles estão funcionando de forma adequada, tudo misturado..... Divisão com CEREST, não temos um local, falta identidade, ter um corpo, era pra ser uma coisa orgânica..... falta uma diretriz norteadora, falta de uma política estadual, o que a gente escuta nos setores é que as equipes não querem trabalhar porque funcionário público é vagabundo, esse samba de crioulo doido, desmotivado, não vai querer ter a menor condição de emancipar, você tem que ter um plano de carreira, salário, tem que ter estrutura de saúde, se ele faz um trabalho que deu certo oh! beleza, se ele faz um trabalho que deu errado oh! (esplanada de mãos, gestos que expressam uma pessoa que se dá mal). “é o Estado grande e é uma cidade muito grande, nós não temos referencia e contra referencia, sejam eles trabalhadores ou não.” “Na prática não temos um local..... para o CEREST” “os médicos aqui é tudo misturado..... Divisão com CEREST. Em termos de estrutura, em termos de eficiência prática, hoje tem muito pra caminhar .” o que falta na saúde do trabalhador do SUS, é ela ter um corpo, uma cara, porque ela não aparece no SUS, ela é encolhida no SUS...”. “era pra ser uma coisa orgânica....” “mas a falta de uma política estadual em saúde do trabalhador prejudica isso, a promoção da saúde.” “falta uma diretriz norteadora nesse sentido. né, de trabalhar a prática, o campo ideológico ele é muito trabalhado, mas eu acho que ainda falta muito a gente ter uma ideia de como formatar isso, para o desenvolvimento das ações práticas.” “O que a gente escuta nos setores é que as equipes não querem trabalhar porque funcionário público é vagabundo, não é porque você não tem uma linha de 92 raciocínio clara e definida, você não tem uma política que te fortaleça, você simplesmente tem uma confusão, esse samba de crioulo doido que é a Secretária, entendeu?” “Até o técnico que tem essa boa ideia, visão, se ele faz um trabalho que deu certo oh! beleza, se ele faz um trabalho que deu errado oh! (esplanada de mãos, gestos que expressam uma pessoa que se dá mal).” “Eu não lido com números eu lido com morte, então um trabalhador da saúde que vai pra lá fazer a divisão desmotivado, a necessidade de ter matricula no município, matricula no Estado, consultório pra ganhar 1.600,00 lá, ele não vai querer ter a menor condição de emancipar, de querer trocar essa estrutura, ele não quer trocar essa estrutura” “porque assim força, capacitação e garra nossa equipe tem muito todos ali são apaixonados pela saúde pública, porque se assim não fosse não estariam aqui até hoje, porque o salário é uma droga! Mas a gente é muito emperrado”. “porque pra você fazer ação de promoção, você tem que ter um plano de carreira, salário, tem que ter estrutura de saúde, e tem que ter uma política norteadora, e bem definida, por exemplo na época de dengue para tudo, para tudo por causa da dengue.” “os setores que ganham ou geram recursos financeiros, eles funcionam muito bem” “Falo da SES, mas você pode aplicar p/ qualquer uma das secretarias.” ausência de diálogos, indefinição, invisibilidade, desmotivação, desvalorização, sofrimento psíquico Neste acontecimento, onde os discursos, tal como o anterior, apresentaram-se, predominantemente, polêmicos, onde os sujeitos se apresentaram afetados pelo tema em questão, como percebemos nos dizeres: “é tudo misturado..... Divisão com CEREST” para o significado de indefinição do setor, onde os trabalhadores alegam não ter um espaço físico e estruturado para se organizarem como Centro de Referencia em Saúde do Trabalhador, onde o espaço era, inicialmente, da Divisão de Saúde do Trabalhador, e hoje pertence aos dois setores acarretando numa fusão em que desapareceram as fronteiras que delimitavam às ações e objetivos de cada um, fazendo com que executassem as mesmas funções, dentro do que se considera possível. Em outros discursos, como: “a falta de uma política estadual, uma diretriz norteadora nesse sentido né, de trabalhar a prática”, em que os entrevistados relataram a dificuldade da operacionalização da política nacional, devido sua inoperância frente às barreiras políticas e econômicas hoje existentes, que impedem o desenvolvimento das ações, necessitando de uma política mais específica, mais tangível e mais definida, como uma política Estadual em Saúde do Trabalhador, que permita trabalhar o território de acordo com seus trâmites e especificidades, que mostre o passo a passo da operacionalidade das ações para o alcance das metas, como por exemplo, a operacionalização da vigilância, a 93 intersetorialidade, que a política Nacional cita, mas que não estabelece meios que permita ou esclareça sua operacionalidade. Estes contextos permitem a compreensão de que a falta de uma identidade está relacionada, não somente a falta de um espaço e a junção de dois setores, mas também, com a dificuldade de se representar o setor através das ações que deveriam ser realizadas. Onde a falta de efetividade das ações se reflete num setor indefinido, que não construiu sua logomarca perante a sociedade e por isso, ainda invisível, como podemos perceber no discurso: “o que falta na saúde do trabalhador do SUS, é ela ter um corpo, uma cara, porque ela não aparece no SUS, ela é encolhida no SUS.... ainda falta muito a gente ter uma ideia de como formatar isso, para o desenvolvimento das ações práticas.” em que se almeja ações que forneçam maior visibilidade para o setor. Houve um tempo, na saúde do trabalhador, em meados dos anos 90, em que haviam ações efetivas, militância, envolvimento assíduo do controle social 30 , porem com o passar dos anos, esta forma de agir, se tornou ineficiente, pois alem de possuir uma política nacional muito abrangente, que não leva em consideração as especificidades territoriais, econômicas, populacionais, de cada Estado, não se adéqua às novas mudanças no mercado de trabalho, como a aceleração produtiva, o desemprego estrutural, a vulnerabilidade da mão de obra, entre outros, acarretando numa indefinição de qual seria a nova forma de agir para fornecer efetividade das ações, perdendo ao longo do tempo sua identidade, sua ideologia histórica gloriosa, e se transformando num campo indefinido, desorganizado e cada vez mais desconhecido perante à sociedade. Todo este contexto se desvela em outros discursos singulares, como: “o que a gente escuta nos setores é que as equipes não querem trabalhar porque funcionário público é vagabundo, esse samba de crioulo doido, não vai querer ter a menor condição de emancipar, você tem que ter um plano de carreira, salário, tem que ter estrutura de saúde”, que permite a compreensão do surgimento de um processo de desmotivação e desânimo que tem suas origens tanto nas condições precárias de trabalho oferecidas, como também, no não reconhecimento de seus pares. Como relata Helman 91 , as fronteiras da imagem corporal não são estáticas, podem ser alteradas com o estado emocional, como na doença e incapacidade, e em muitas situações, essas “peles simbólicas”, são sentidas como potencialmente frágeis e facilmente rompidas por outras pessoas. Porque o não reconhecimento dos pares pode levar a exclusão do setor com relação aos outros setores da Secretária de Estado de Saúde, até mesmo 94 de forma traumática, resultando em outras barreiras físicas e emocionais como a falta de diálogos, de intersetorialidade, de compartilhamento de saberes e recursos. Como relata Helman 91, o status dos indivíduos está fisicamente “escrito” sobre a superfície de seus corpos e este pode sinalizar pertencimento a algo considerado importante para o indivíduo que o busca. Quando no relato: o que falta na saúde do trabalhador do SUS, é ela ter um corpo, uma cara, porque ela não aparece no SUS, ela é encolhida no SUS....” permite compreender o desejo por uma identidade permanente e fixa, que tenha uma política palpável e executável, que forneça visibilidade e reconhecimento do setor perante a sociedade. É inevitável a percepção, nesta pesquisa, de se constatar um setor dúbio, que vive um dilema paradoxal, onde luta pela melhoria e qualidade de vida da população trabalhadora, mas que precisa construir um ambiente de trabalho próprio saudável, que tenha condições mínimas para a realização da promoção da saúde no campo, como podemos perceber em outro momento da entrevista no discurso: “se continuar do jeito que tá, a gente está fadada ao fracasso e esse discurso de promoção da saúde não vem que não cola”, que se refletem em discursos que se desvelam em significados de falta de perspectivas diante das dificuldades que enfrenta o setor que precisa realizar ações palpáveis mas não sabem como operacionalizá- las de forma que sejam concretizadas e promovam efetividade no meio. Estes reflexos se desvelam, também, em outros relatos, na produção de sentidos negativos que se desvelam num processo de desmotivação nos dizeres dos funcionários do setor, num contexto que permite compreender um processo de sofrimento psíquico relacionado às condições de trabalho oferecidas pelo programa, que se refletem na forma como o serviço é executado, como nos dizeres: “pra ganhar 1.600,00 lá, ele não vai querer ter a menor condição de emancipar, de querer trocar essa estrutura, ele não quer trocar essa estrutura, porque pra você fazer ação de promoção, você tem que ter um plano de carreira, salário, tem que ter estrutura de saúde”. Como relata Vidal93, a evocação do sofrimento não se dá de forma direta ou consensualizada, mas de tudo aquilo que impede uma produção ativa, um investimento. Dessa forma, além das dificuldades enfrentadas pelo setor adoecerem seus funcionários, através de um sofrimento psíquico desvelado nos discursos dos entrevistados, também, interfere na forma com que as ações são executadas, em que os trabalhadores se encontram desgastados e desmotivados com as injurias da política, sem terem a menor vontade de emancipar, situação que se metamorfoseia em mais uma barreira impeditiva para o êxito da política. 95 se eu for falar num congresso para o Brasil inteiro, eu vou falar de uma maneira muito mais bonita, mostrar o pavão um pouco mais bonito do que ele é de verdade “Nós precisamos dos nossos superiores pra puxar essa política.” “O que eu sei que em SP, quando vamos no Renastão a vigilância ainda é insipiente em todos os Estados. Não é uma...... eu estou falando na realidade, se eu for falar num congresso pro Brasil inteiro, eu vou falar de uma maneira muito mais bonita, e mostrar o pavão um pouco mais bonito do que ele é de verdade, entendeu?, mas como isso é uma pesquisa acadêmica, eu estou dizendo pra você do que eu acho mesmo do que falta., é...né aqui pra gente.” interdição, medo, eufemismo, cumplicidade Como podemos compreender neste discurso produzido, em que o entrevistado permite num ato de cumplicidade com o entrevistador, fazer um comentário dos discursos proferidos em lugares públicos pelos trabalhadores do Cerest, de que não se pode falar da realidade problemática e de tudo que vivencia o setor, em qualquer lugar e para qualquer pessoa, buscando-se, por hora, uso dos eufemismos da linguística, que de acordo com Orlandi 24 , a linguagem serve para comunicar e não comunicar, sendo seus efeitos múltiplos e variáveis, que neste caso, como pudemos compreender se desvela num mosaico significante de interdição, que de acordo com Foucault 74 , é um dos procedimentos de exclusão da sociedade, e se define como um tabu do objeto, onde os buracos negros se multiplicam como nas regiões da sexualidade e da política, em que o discurso, longe de ser um elemento neutro, no qual na sexualidade se desarma e na política se pacifica, exerce os mais temíveis poderes. E também, por ser o discurso aquilo por que se luta e o poder do qual nos queremos apoderar. Neste contexto, podemos compreender que, embora no decorrer desta pesquisa, os entrevistados tenham apresentado diversos problemas e aspectos negativos relacionados à operacionalização da promoção da saúde pelo setor, por mais cruel que seja essa realidade, se envolvida num emaranhado político, corre o risco de levar a multiplicação de imensos buracos negros, com imprevisíveis consequências para o campo, onde o entrevistado ao fazer uso da interdição oportuniza a oclusão ou omissão de aspectos negativos, como no discurso: “num congresso pro Brasil inteiro, eu vou falar de uma maneira muito mais bonita, e mostrar o pavão um pouco mais bonito do que ele é de verdade,” apresentando um cenário mais positivo, embora se desvele em um possível sentimento de “medo” do que o imprevisível possa trazer como resposta aos discursos, como relata 74 , há em toda sociedade uma profunda logofobia, uma espécie de temor surdo que se desvela o acontecimento, do surgir de todos 96 esses enunciados, de tudo o que possa haver aí de violento, descontínuo, de combativo, de desordem que se desvelam perigosos, num incessante zumbido e desordenado discurso. No entanto, apresentar uma imagem positiva, também se caracteriza, dependendo da situação, como uma importante estratégia política, quando o objetivo é refletir interesses alheios, mas, contudo, importa não se esquecer de discutir a realidade, embora cruel, e cair na própria armadilha, de achar realmente que está tudo bem e não se sair mais do lugar. Este contexto permite a reflexão sobre a importância da pesquisa de campo, onde o teórico permite uma aproximação e comparação com o empírico, apresentando uma maior percepção da realidade, e oportunizar o rompimento destes procedimentos de exclusão da sociedade, em que se busca, como exemplo, na interdição formas de se camuflar realidades que poderiam contribuir com subsídios para o melhoramento das políticas públicas. 7.5. DESAFIOS A opção por se constituir esta categoria decorre da complexidade e abrangência do campo da Saúde do trabalhador no desenvolvimento das ações de promoção da saúde, e, embora, tenham surgidos novos e velhos desafios ao longo das análises de todas as categorias anteriores a esta, nesta, privilegiou-se realizar uma síntese dos principais desafios que permeiam o campo, desvendados nos discursos dos entrevistados, que de acordo com Orlandi 67 , a incompletude é característica de todo processo de significação, onde se faz a qualidade do discurso, e mesmo que se quisesse desvendar toda a verdade, esta seria incompleta. Encontramos, predominantemente, discursos polêmicos, que produziram sentidos relacionados, principalmente, às dificuldades da operacionalização das ações, consideradas primordiais para a realização da promoção da saúde no campo. Dentre, essas, temos a vigilância, a intersetorialidade, a busca por maior envolvimento do controle social com participação efetiva dos trabalhadores nas discussões das políticas do campo. E, também, novas singularidades, que surgiram durante as análises e formação das categorias empíricas, como a busca pela legitimidade do setor perante a sociedade, e uma política Estadual mais específica, que contribua para melhorias e elucidação das dificuldades enfrentados pelos trabalhadores do campo, que forneça eixos norteadores e contribua para a efetividade das ações, se metamorfoseando numa representatividade que contemple as necessidades da população trabalhadora e forneça mais reconhecimento e visibilidade ao setor. 97 “Não fazem vigilância então fica difícil, NÃO IDENTIFICA A CONDIÇÃO QUE ESSE TRABALHADOR REALIZA A ATIVIDADE, Não são fáceis a intersetorialidade, a burocracia, PAS, não atende a nossa realidade, algo mais palpável, mais real, não existe conselho gestor em todos os CERESTs, letargia, falta identidade, ter um corpo, era pra ser uma coisa orgânica, falta de uma política estadual, mas a maior barreira é a falta de conhecimento da saúde do trabalhador do SUS pelos gestores.” “Não fazem vigilância então fica difícil, se você não identifica agravos COMO VOCÊ VAI, SE VOCÊ NÃO IDENTIFICA A CONDICAO QUE ESSE TRABALHADOR REALIZA A ATIVIDADE, como você vai fazer alguma ação de promoção?” “Estamos tentando mudar o código sanitário em questão no RJ, tá mais de 5 a 6 anos que ele tá pronto, só que ele está, de certa forma.... mantido longe dessas discussões pela própria Secretaria de Saúde, então tem que perguntar pra secretária de saúde porque o código sanitário está pronto a mais de 05 anos e não foi aprovado”. “Não são fáceis a intersetorialidade, a burocracia também,.... mas a maior barreira é a falta de conhecimento da saúde do trabalhador do SUS pelos gestores.” “falta aqui no setor hoje, esse projeto, a programação da saúde hoje que projetamos, PAS, não atende a nossa realidade, ele tem que ser revisto..... então falta uma programação anual ou um projeto real pra atender as necessidades reais da saúde do trabalhador no Estado.” “Se você pensar o que falta hoje na cidade do RJ no CEREST atual . falta, uma... proposta real para os trabalhadores estaduais, nós estamos com um PAS e vemos que esse PAS, não é adequado pro Estado, temos que pensar em algo mais palpável, mais real, que nós podemos fazer, então acho que falta...” “Não existe conselho gestor em todos os CEREST. Então, para que isso pudesse ocorrer de forma normal, teria que ter um conselho gestor pra cada CEREST, porque é formado pela equipe e pelo controle social.” “O Estado está estruturado de uma forma que dificulta o exercer dessa promoção da saúde. Como que dificulta? primeira, coisa é essa burocracia documental, e essa burocracia cartorária que atravanca todas as ações, a gente precisa ter essa, acho que o nosso principal ranço que vem desde o processo de formação do nosso Estado moderno, da onde vem, é essa letargia do setor público, é essa demora, essa que quando você lida com vidas você não pode demorar, eu não lido com números!” O que acontece é o seguinte eles dizem como fazer, mas a operacionalidade é difícil. Sai a lei, mas depois você precisa de regulamentação por outras leis menores, então acontece que a lei maior sempre saí mas aquela que diz como realmente tem que fazer essa demora mais as vezes anos, né, então é aquela coisa dizer vamos fazer a promoção da saúde, mas mostrar como é que vai ser feita aquela coisa, essas ações de promoção da saúde...” “era pra ser uma coisa orgânica....” “não existe conhecimento do que o CEREST estadual está fazendo, NÉ” “Não existe o querer, tornar, fazer saúde do trabalhador no Estado. Se vive muito hoje na ST Estadual o passado, o quê, que foi feito... mas o que ela está fazendo...... falta pra mim também uma coordenação estadual nesse campo, projetos próprios da coordenação. é uma critica minha atual..... um projeto do que é fazer saúde do trabalhador.” porque a ST não tem essa cara, esse rosto no SUS. eu acho que dentro do que nós já falamos é a questão da identidade da saúde do trabalhador no SUS, A GENTE PRECISA EXPLORAR MAIS DAR ESSA IDENTIDADE porque o pessoal confunde saúde do trabalhador com medicina de saúde e segurança do trabalho.” 98 nesses 30 anos ainda não se definiu..... não se falou o que é saúde do trabalhador no SUS e para que serve ,né,” “Eu acho que o que tem que fazer no SUS é definir o seguinte: porque que tem que ter saúde do trabalhador no SUS e porque que ela veio.” “nós deveríamos no estado traduzir a política nacional para uma política estadual, e dentro dessa política estadual criar os eixos norteadores, né,” “Falta esse consenso e uma diretriz clara e específica do que se quer, enquanto política de Estado. Então quando eu falo política de Estado, não depende só do diretor da direção.” “agora o que a gente precisa ter é ao certo, é condições de materializar, se não mais uma vez eles vão ser ectoplasmicos, fantasmagóricos, vão ter esse arcabouço teórico que não é aplicável, entendeu? Não é aplicável por que? por que cada Estado e cada Município tem sua particularidade, então a rede além de produzir todo esse conhecimento ela tem que dar condições e apoio pra que a gente consiga operacionalizar aqui, na base, na ponta, se não, não é operacionalizável.” incompatibilidade, intangibilidade, invisibilidade e inoperância Os discursos produzidos pelos trabalhadores do campo da saúde do trabalhador, permitiram deslizamentos de sentidos, com relação aos desafios a serem enfrentados, para os significados de incompatibilidade da política com a realidade e consequente intangibilidade das ações, onde a própria política, da forma como foi constituída, dificulta a operacionalidade das ações, como no dizer “PAS, não atende a nossa realidade ele tem que ser revisto..... então falta uma programação anual ou um projeto real pra atender as necessidades reais da saúde do trabalhador no Estado”, onde os sujeitos entrevistados produzem deslocamentos de sentido para a existência de uma política nacional muito abrangente, inespecífica, e por isso inoperante, como no discurso: “nós deveríamos no estado traduzir a política nacional para uma política estadual, e dentro dessa política estadual criar os eixos norteadores,” que permite-nos compreender o pressuposto de que a falta de especificidades que contemple as singularidades do setor CEREST Estadual do Estado do Rio de Janeiro, inviabiliza as ações que são programadas de acordo com as políticas vigentes. Este fato nos permite compreender, nos discursos dos entrevistados, que há uma distorção entre o que é proposto pela política e o que realmente se pode realizar diante da conjuntural atual do campo. Embora, apresente todas as ações importantes que devem ser realizadas, como a vigilância, a intersetorialidade, a importância do maior envolvimento do controle social, entre outras, não apresenta sua operacionalidade ou caminhos que permitam o desenvolvimento destas ações. 99 No entanto, embora se constate na Política Nacional de Saúde do Trabalhador e da Trabalhadora 10 , que devem ser realizadas ações que visem a promoção da saúde, é preciso levar em consideração de que alcançar a promoção da saúde de forma plena no campo da saúde do trabalhador, não é o mesmo que buscá-la em outros programas de saúde pública, pois não adianta uma única receita, e por mais que as ações sejam as mesmas como a intersetorialidade, a forma como será desenvolvida e os obstáculos que encontrará, serão próprios de cada setor, e de acordo com sua realidade, que no caso do CEREST Estadual, terá que se levar em consideração as singularidades que vão de encontro com a lógica de mercado capitalista, e que ferem interesses políticos e econômicos que impedem o desenvolvimento de políticas saudáveis. Portanto, este fato, leva a letargia, burocracia, má vontade política, entre outros entraves do sistema, que tornam as ações do campo impraticáveis. Dessa forma, tem questões que vão além da gestão, mas que necessitam de legitimidade do campo para ocorrerem, que permitam chegar a um consenso entre os atores envolvidos, sugerindo caminhos mais visíveis e possíveis, através das especificidades de cada setor, como uma política estadual de saúde do trabalhador do Estado do Rio de Janeiro. Em outros momentos do acontecimento, compreendemos nos discursos dos entrevistados, que tem ações, como a vigilância, que já foram realizadas na década de 90, que permitiram conquistas gloriosas no campo, mas por questões de embates políticos, burocracia e letargia do sistema, estacionou, e embora seja mencionada, pelos entrevistados, como fundamental para a promoção da saúde, se tornou um eterno desafio, como nos discursos: “Não fazem vigilância então fica difícil, se você não identifica agravos COMO VOCÊ VAI, SE VOCÊ NÃO IDENTIFICA A CONDIÇÃO QUE ESSE TRABALHADOR REALIZA A ATIVIDADE, como você vai fazer alguma ação de promoção? Estamos tentando mudar o código sanitário em questão no RJ, tá mais de cinco a seis anos que ele tá pronto, só que ele está, de certa forma...... mantido longe dessas discussões pela própria Secretaria de Saúde, então tem que perguntar pra secretária de saúde porque o código sanitário está pronto a mais de 05 anos e não foi aprovado”, estas e outras questões nos mostram, que as dificuldades que permeiam o campo vão além do que é cabível aos técnicos do setor, necessitando de uma política que permita os trâmites que impedem o desenvolvimento das ações. A falta de uma política estadual com as especificidades que contemple as necessidades do território estadual se desvela, nos sentidos produzidos nos discursos dos entrevistados, em significados que permitem a compreensão de invisibilidade do setor perante à sociedade, em que há o deslocamento de sentidos com relação à falta de efetividade para a 100 perda de identidade e representatividade da população trabalhadora, como nos discursos: “não existe conhecimento do que o CEREST estadual está fazendo, né...... mas a maior barreira é a falta de conhecimento da saúde do trabalhador do SUS pelos gestores.” que permite a compreensão, a partir do subentendido, de que o setor não recebe a devida importância pelos demais setores da saúde pública, dificultando ainda mais as relações intersetoriais, que se refletem como outro desafio primordial para o campo. No entanto, a beleza de se pensar a saúde do trabalhador na lógica da promoção da saúde está na mudança do olhar médico-assistencialista-mecaniscista, ainda hegemônico na saúde pública, para um olhar mais abrangente de que se promover a saúde do trabalhador vai além dos muros do setor saúde, que necessita, também, olhar para os determinantes sociais e o meio ambiente em que esse indivíduo vive e trabalha. Como, por exemplo, não basta à vigilância fechar processos de trabalhos danosos, sem o sistema público oferecer novas oportunidades que garantam a este trabalhador seu mercado de trabalho, porque, para muitos, mais vale trabalhar em condições precárias a ter que ficar sem seu ganha-pão. Esta reflexão, nos permite a compreensão da complexidade do campo, e da necessidade de se trabalhar em rede, que embora tenha se construído uma política que compartilhe essa visão, como a RENAST 48 , de que a promoção da saúde do trabalhador deve se dar por meio de articulações intra e intersetoriais, não são claras as formas e caminhos para estas articulações, se refletindo apenas numa prescrição para o campo que se metamorfoseia em mais um permanente desafio. Neste contexto, percebemos que os sentidos produzidos pelos trabalhadores entrevistados, com relação aos desafios a serem enfrentados, se refletem em significantes que se revelam como imprescindíveis para a promoção da saúde, como no discurso: “uma clara e definida política em saúde, porque do jeito que está hoje a política de saúde no Estado do RJ está fadada ao fracasso, do jeito que está hoje” em que o sujeito afirma e confirma a urgência do alcance desses objetivos para o êxito da política, que, na sua visão, põem em risco o próprio programa e sua legitimidade. Em outro interdiscurso, onde as palavras são porosas 72 , como no discurso “a rede além de produzir todo esse conhecimento ela tem que dar condições e apoio pra que a gente consiga operacionalizar aqui, na base, na ponta, se não, não é operacionalizável”, permite a compreensão de que o Estado também é responsável, através de sua política, por fornecer apoio e subsídios para o programa, e que sozinho, o campo da Saúde do Trabalhador, não terá como operacionalizar a promoção da saúde. 101 De fato, o êxito das ações que promovem efetividade enriquece e legitima os programas, assim como o trabalho reflete dignidade ao indivíduo. E atrelado a isto, pudemos compreender, durante a análise dos discursos, que a falta de uma identidade, relatada pelos trabalhadores entrevistados, está mutuamente relacionada à inoperância, que causa invisibilidade do setor perante a sociedade, como no discurso: “não existe conhecimento do que o CEREST estadual está fazendo, né, não existe o querer, tornar, fazer saúde do trabalhador no Estado. Se vive muito hoje na ST Estadual o passado, o quê, que foi feito..... mas o que ela está fazendo...... falta pra mim também uma coordenação estadual nesse campo, projetos próprios da coordenação, é uma critica minha atual..... um projeto do que é fazer saúde do trabalhador.”onde permite a compreensão de que são realizados deslizamentos de sentidos com relação ao desafio de tornar o CEREST mais visível perante à sociedade, para o desafio de se buscar um eixo norteador que tornem possíveis as ações ideologicamente buscadas no presente, mas que não são possíveis de se realizar na conjuntura atual. E, quando o sujeito se silencia ao pronunciar o que o CEREST/RJ está fazendo, onde a falta é o lugar do possível, onde o silencio pode representar o múltiplo 77 , permite a compreensão, de que se faz algo ainda pouco significante frente às iniquidades atuais que atingem a população trabalhadora, que não permite o entusiasmo por seus atores como os considerados feitos do passado. Em suma, no CEREST/RJ ainda persistem novos e antigos desafios, que permanecem à espera do surgimento de novas possibilidades, principalmente, políticas econômicas que permeiam o campo. No entanto, no decorrer das análises, este estudo permitiu compreender que o principal desafio, hoje, é por uma identidade que reflita ações novas, atuais, que não seja sinônimo de um passado inexistente, mas algo recentemente construído, através de ações efetivas e por seus atores atuais, que deixe de se refletir num passado, que embora glorioso, não resolve as injurias atuais do mundo do trabalho, onde seus lutadores e heróis possam deixar suas marcas, criando uma nova identidade, que possibilite a continuidade das ações com um olhar mais abrangente focado na promoção da saúde, fornecendo efetividade das ações e maior visibilidade do setor perante a sociedade. 102 8 CONSIDERAÇÕES FINAIS Durante a trajetória da pesquisa e antes de ir ao campo empírico, havia inquietações relacionadas à importância da promoção da saúde no campo da saúde do trabalhador, seu real papel e significado para os atores e executores da política. Entretanto, a aproximação com o campo empírico revelou novas perspectivas, que propiciaram a compreensão de um deslocamento do foco da vigilância para a promoção da saúde, nos discursos dos entrevistados, tendo a vigilância como parte desta, num olhar mais abrangente. A promoção da saúde foi compreendida como o cerne da saúde do trabalhador, objetivo final e de importância indiscutível. Esta mudança de foco demonstra sintonia com o olhar ampliado de saúde, onde se reconhece os determinantes e condicionantes ambientais, sociais, econômicos e políticos, que influenciam a relação saúde-trabalho, consolidando o termo promoção da saúde no campo da saúde do trabalhador. Este estudo permitiu uma singular riqueza de saberes que versaram entre a experiência empírica e os condizeres teóricos, permitindo compreender, a partir de seus atores, o enredamento da operacionalização da promoção da saúde no campo da saúde do trabalhador diante da polissemia do termo. A partir da aproximação com o campo teórico-prático, constatou-se que embora a promoção da saúde seja reconhecidamente fundamental para o campo, sua abrangência abarca grande abstração dificultando sua operacionalidade no campo. As ações de promoção da saúde, embora incompletas e fragmentadas, acontecem mais no âmbito da capacitação em saúde, supervisão e atenção à saúde, onde ocorrem reuniões orientadoras, assessorias técnicas, palestras e capacitação de diversas categorias de trabalhadores, onde identificamos desvelamentos de sentido para um setor ainda muito aquém do potencial existente, que possui uma equipe capacitada, especializada, com grandes projetos e ideologia, sonhadora, mas que se revela impotente diante de uma conjuntura que não percebe vontade política para intersetorialidade, em que há precarização dos recursos materiais e financeiros, dos instrumentos de trabalho e desvalorização profissional, condições estas, fundamentais para o desenvolvimento de uma política pautada na promoção da saúde. Todos esses impasses, associados a um sistema que se apresenta autoritário com relações, por vezes, clientelistas, se expressam através da falta de diálogos entre as equipes dentro, também, da própria Secretária de Estado de Saúde, comprometem e/ou inviabilizam a continuidade das ações e projetos formulados pelo setor pautados na promoção da saúde, como a vigilância e pactos intersetoriais imprescindíveis para o êxito da política e legitimação 103 do campo da saúde do trabalhador perante a sociedade. Outra consideração, que se apresentou singular neste estudo, foi a possibilidade de ouvir o trabalhador, que expressou seus sentimentos e sua historia profissional, com relação aos desafios e angústias de se trabalhar num Centro de Referencia em Saúde do Trabalhador, num contexto por demasiado complexo, que reflete as mazelas da organização do trabalho. Contudo, embora ainda necessite de mais pesquisas neste campo, possibilitaram a compreensão de um sofrimento psíquico, desvelado nos discursos dos entrevistados, relacionado com a desorganização do setor e possível desvalorização profissional perante seus pares, refletindo desmotivação para a execução das tarefas. O olhar desta pesquisa se direcionou ao trabalhador, incumbido de contribuir para a eficiência e efetividade das políticas voltadas para a promoção da saúde dos trabalhadores, mas que também adoecem, e estão expostos aos riscos inerentes a organização e condições de trabalho, que também necessitam de saúde. Em outros momentos do acontecimento, percebemos discursos polêmicos com relação ao sistema público, de fatores que embora remotos, ainda persistem contribuindo para a inoperância das ações, como a letargia, burocracia, descaso dos governantes, entre outros que dificultam o movimento dos processos vitais para a promoção da saúde. Contudo, percebemos que todos esses fatores contribuem para a aparente invisibilidade das ações no campo, que impedem a construção de uma identidade, reclamada nos discursos, pela falta de representatividade do setor, que não consegue contemplar suas raízes históricas e ideológicas, perante a sociedade. Dessa forma, ao longo desta caminhada, é imprescindível a percepção da necessidade de se qualificar antes de quantificar para dar maior visibilidade e legitimidade ao setor. Compreendemos que para a saúde do trabalhador ter êxito na operacionalidade da promoção da saúde, com ações efetivas, no campo da saúde do trabalhador, a fim de promover melhorias nas condições de trabalho e qualidade de vida da população trabalhadora, algumas sugestões são propostas a seguir e construídas de acordo com os resultados do estudo, de forma singular, competindo, também, a outros órgãos responsáveis pelo enredamento da política, como o Ministério da Saúde: _ Construção de uma política Estadual, mais específica, que alem de identificar as singularidades de cada território em seu âmbito político, social e econômico, apresente o método a ser utilizado para operacionalizar as ações de promoção da saúde. _ facilitar, incentivar e/ou regularizar reuniões intersetoriais, de forma que estas se tornem 104 obrigatórias e envolvam outros setores importantes relacionados com o campo, como a Vigilância Sanitária, o Ministério do Trabalho e Emprego e a Previdência Social. - Criar prazos viáveis para a resolução das legislações que comprometem as ações de vigilância em saúde do trabalhador, como o código sanitário. _ Incentivar a criação das CISTs e Conselhos gestor Estaduais e municipais. _ Promover ações que garantam a participação dos trabalhadores, formais ou informais, para atuarem na construção da política não apenas como reivindicadores, mas como formuladores, inclusive, em encontros nacionais do campo como a Renast, a fim de que a voz do trabalhador seja ouvida e sua história profissional contada. _ Compartilhar informações sobre a repartição dos recursos materiais e financeiros nos programas da saúde coletiva. _ Propor ações que valorizem os profissionais que atuam neste campo por demasiado complexo. _ Promover maior divulgação do campo e de suas ações a fim de promover maior visibilidade do setor perante a sociedade. Por fim, estas considerações compreendem que todo discurso se realiza em sua incompletude, enriquecendo o estudo com suas singularidades e resignificações. 105 REFERÊNCIAS 1. Ministério da Saúde (Brasil). VIII Conferencia Nacional de Saúde, 1986. Relatório final. http://conselho.saude.gov.br/biblioteca/Relatorios/relatorio_8.pdf (acesso em 20 Jan de 2011). 2. Ministério da Saúde (Brasil). Política Nacional de Promoção da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde. – (Série B). Textos Básicos de Saúde) Brasília: Ministério da Saúde, 2006. 60 p. 3. Buss PM, Pellegrini FA. A Saúde e seus Determinantes Sociais. Phisis: Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, 2007, 17(1):77-93. 4. Anand S, Bärnighausen T. Health workers at the core of the health system: Framework and research issues. Health Policy, 2012, 105(2–3): 185-191. 5. Hofmann F, Stöbel U. Occupational health in health care workers. Public Health Forum, 2011, 19(3): 26.e1-26.e3. 6. 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Ferrarezi, Políticas públicas: coletânea Brasília: Enap. 2006, p. 225-247. 93. Vidal, MC. A materialidade da Organização do trabalho como objeto da intervenção ergonômica. In: Filho JFS. Jardim S. Organizadores. A Danação do Trabalho: relações de trabalho e o sofrimento. Rio de Janeiro. Ed: Te Corá, 1997, p.89-138. 112 APÊNDICE A. Termo de Consentimento Livre e Esclarecido A realização do presente trabalho está de acordo com Resolução CNS 196/96, item IV, e foi baseado na compreensão da Promoção da Saúde na Saúde do Trabalhador como instância privilegiada na transformação das relações saúde, trabalho e ambiente, optando-se assim por refletir sobre sua concepção e operacionalidade de suas ações no Estado do Rio de Janeiro. Você está sendo convidado para participar da pesquisa: Sentidos da promoção da saúde no campo da Saúde do Trabalhador: do abstrato à operacionalidade, desenvolvida por Ana Paula Carneiro Carvalho, discente de Mestrado em Saúde Pública da Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca da Fundação Oswaldo Cruz (ENSP/FIOCRUZ), sob orientação do Professor Dr. Aldo Pacheco Ferreira.O objetivo deste trabalho é compreender a concepção de Promoção da Saúde para a Saúde do Trabalhador e de como ela se operacionaliza em ações do campo da Saúde do Trabalhador no Estado. Para tanto, serão realizados levantamentos documentais dessas ações e entrevistas com os distintos atores envolvidos neste processo. Você foi convidado a participar da entrevista, mas sua participação não é obrigatória. Sua participação consistirá em responder as perguntas de uma entrevista que seguirá um roteiro semiestruturado, apresentado ao entrevistado com antecedência. Garantimos que a Instituição e o entrevistado não terão nenhuma participação nos custos da pesquisa, preservando a identidade do entrevistado e excluindo a possibilidade de riscos a sua saúde. Todas as etapas do estudo serão realizadas pela autora do estudo com os resultados utilizados exclusivamente para fins acadêmicos. Nestes termos, lhe é garantido o direito de recusa ou retirada deste consentimento, assim como, o de determinar que sejam excluídas do material da pesquisa informações que já tenham sido dadas. Sua recusa não trará nenhum prejuízo em sua relação com o pesquisador ou com a Instituição. As entrevistas serão registradas na forma de áudio e posteriormente transcritas. O tempo da entrevista se dará em aproximadamente uma hora. O material gravado ficará sob a guarda da própria pesquisadora, que se compromete a garantir a inacessibilidade do conteúdo a pessoas que não sejam a pesquisadora e o orientador. Ao final da pesquisa, todo material será mantido em arquivo, por pelo menos 5 anos, conforme Resolução CNS nº 466/2012 e orientações do CEP/ENSP. O benefício (direto ou indireto) relacionado com a sua colaboração nesta pesquisa é o de possibilitar uma reflexão sobre a necessidade da articulação entre as intervenções e pesquisas, através de uma reavaliação das práticas, além de uma apropriação recíproca dos saberes, promovendo conhecimento e uma aproximação do tema promoção da Saúde na Saúde do Trabalhador. Os dados não serão divulgados de forma a possibilitar sua identificação. Você receberá uma cópia deste termo onde consta o telefone e o endereço institucional do pesquisador principal e do CEP, podendo tirar suas dúvidas sobre o projeto e sua participação, agora ou a qualquer momento. Este é redigido em duas vias, sendo uma para o participante e outra para o pesquisador. _____________________________________________________________________ Pesquisadora: Ana Paula Carneiro Carvalho: ENSP - ESCOLA NACIONAL DE SAÚDE PÚBLICA SERGIO AROUCA. Rua Leopoldo Bulhões, 1480 - Manguinhos, Rio de Janeiro. CEP: 21041-210 - Tel: (21) 84718441 Comitê de Ética em Pesquisa – CEP/ENSP Rua Leopoldo Bulhões, 1480, Térreo – Manguinhos, Rio de Janeiro. CEP: 21041-210 – Tel: (21)25982863 Declaro que entendi os objetivos, riscos e benefícios de minha participação na pesquisa e concordo em participar Nome e assinatura do entrevistado:____________________________________________________________ 113 APÊNDICE B. Roteiro da entrevista Identificação da pessoa entrevistada - Entrevista nº _____ Data: ______________ Nome:_________________________________________________________________________ Escolaridade: Formação:__________________________________________________________ Profissão/ Ocupação atual:_________________________________________________________ Tempo de atuação no setor de Saúde do Trabalhador?___________________________________ 1. Qual o papel da Promoção da Saúde no campo da Saúde do Trabalhador? 2. Qual a importância das ações de promoção da saúde para a saúde do trabalhador? Em qual âmbito da ST ela atua ou deveria atuar? 3. O CEREST realiza ações de Promoção da Saúde na Saúde do Trabalhador (ST)? 4. Qual a sua percepção sobre a Promoção da Saúde e de ambientes e processos de trabalho saudáveis que cita a atual política Nacional de Saúde do Trabalhador e Trabalhadora (Portaria 1.823/2012)? 5. Quais os tipos de ações que se operacionalizam de Promoção da Saúde do trabalhador? Dentre essas, quais considera mais importantes para o campo da ST? 6. Quando são realizadas ações de promoção da saúde, estas se baseiam em algum critério ou estratégia? 7. Qual a sua compreensão sobre a capacidade de atuação da Promoção da Saúde em Saúde do Trabalhador hoje no Estado do Rio de Janeiro? Segundo seu ponto de vista, qual o potencial de resolutividade e o impacto dessa atuação? 8. Como se dão as relações de intra e intersetorialidade no desenvolvimento das ações de Saúde do Trabalhador? Outros setores da saúde são requisitados no desenvolvimento dos projetos? Quais? 9. Quais os principais desafios para a ampliação do potencial de ação/transformação da Promoção da Saúde no campo da Saúde do Trabalhador no Estado do Rio de Janeiro no contexto atual? 10. Há alguma ação desenvolvida pelo setor, que haja participação do trabalhador? Quais? Qual o grau de participação destes? 11. Para terminarmos a entrevista, gostaria de concluir perguntando se teria alguma outra informação relacionada a Promoção da Saúde do Trabalhador que por acaso não tenha sido explorada nesta entrevista, mas que você gostaria de comentar?