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https://www.arca.fiocruz.br/handle/icict/20335
RADIS - NÚMERO 144 - SETEMBRO
Fundação Oswaldo Cruz. Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca | Date Issued:
2014
Responsible institution
Abstract in Portuguese
Às vésperas das eleições gerais no Brasil, é bom lembrar o valor do voto consciente. Ciente até das limitações das propostas em disputa, como analisa o Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes), pioneiro da defesa dos princípios da Reforma Sanitária e do SUS, que identifica a ausência de alguns temas essenciais à saúde pública nos programas de governo registrados no início de julho no Tribunal Superior Eleitoral pelos candidatos à Presidência da República.
Mais importante ainda é lembrar que a democracia representativa não é a única forma de o povo exercer o poder que lhe atribui a Constituição vigente no país. É legítimo e essencial para a construção da democracia que este poder também seja exercido “diretamente” pelos indivíduos e pelas coletividades, como indica a Carta. Na legislação do SUS, o controle social é obrigatório: estados e municípios não podem receber os repasses orçamentários se não tiverem conselhos de Saúde em funcionamento com 50% de representantes de usuários, 25% de trabalhadores e 25% de gestores dos serviços de saúde.
Nossa matéria de capa discute a importância de políticas que ampliem o exercício da cidadania na construção das políticas públicas, em contraponto ao enorme peso que interesses de mercado têm em detrimento das necessidades e anseios da população. De projeto de iniciativa popular nasceu o modelo de sistema de saúde universal aprovado pelos constituintes de 1988. Uma combinação virtuosa da voz do povo com a prerrogativa assegurada aos legisladores de votar as leis, no que também podem ser ajudados por meio de plebiscitos e referendos.
Da participação social resultaram, segundo o Ipea, dezenas de políticas públicas ambientais, de segurança alimentar, de proteção à criança e ao adolescente, e leis como o Estatuto do Idoso e a Lei Maria da Penha. O pensador e escritor Frei Beto critica as reações à participação direta prevista na Constituição: “a elite se sente ameaçada, pois sabe que quanto menos desigualdade social, mais tem a perder”.
A relativa participação da sociedade na gestão do SUS nos municípios contribuiu para inovações em tomada de decisões, definição de prioridades, elaboração de orçamentos e políticas setoriais, renovação de quadros, mais transparência no uso de recursos. Por outro lado, essa modernização convive com práticas extremamente conservadoras enraizadas na gestão e nos próprios processos de participação, constata a pesquisa Municipalização na Saúde: inovação na gestão e democracia local no Brasil, que analisa a gestão da saúde nos municípios, entre 1996 e 2006, coordenada por pesquisadores da Fundação Getúlio Vargas, Fiocruz e Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.
Novas estratégias vindas da sociedade, tão importantes no enfretamento à aids a partir dos anos 1990, foi o que faltou à 20ª Conferência Internacional de Aids, realizada em julho na Austrália, avalia o jornalista Liandro Lidner. Em entrevista sobre outro tema caro à saúde coletiva, a violência na sociedade brasileira, a socióloga Cecília Minayo vê na própria sociedade, com quem o Estado se relaciona pelo uso de “coerção”, a saída pela “coesão”. Na sociedade, diz Minayo, estão “os extremos de violência”, mas também “grandes correntes de solidariedade, de mudanças sociais”.
Rogério Lannes Rocha
Editor-chefe e coordenador do Programa Radis
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