Estudo de acompanhamento de um grupo de mães de crianças com microcefalia em Minas Gerais: da mobilização, organização, às reivindicações de direitos no contexto de Zika

Abstract

A associação da alteração do padrão de ocorrência de microcefalias relacionadas ao vírus Zika no ano de 2015, trouxe enormes e complexos desafios para o sistema de saúde brasileiro, para a ciência e para a sociedade em geral. A reflexão e discussão sobre essas questões apontaram para a fragilidade dos serviços de saúde em atender as demandas advindas desse novo cenário sanitário imposto pela ocorrência do vírus Zika, a necessidade e importância de re-organização desses serviços, a premência do envolvimento da sociedade de forma mais participativa e efetiva nas políticas de saúde e a garantia dos direitos sociais no Brasil. Foi realizado um estudo de caso único, norteado pela abordagem qualitativa , cuja unidade de análise foi o Grupo de Mães de Anjos de Minas. O objetivo do estudo foi acompanhar esse grupo de mães de crianças com microcefalia buscando compreender como saúde e direitos humanos se conectam no contexto de Zika. Para contemplar esse objetivos foram realizados: revisão integrativa da literatura sobre a conexão entre saúde, direitos humanos e Zika; identificação e descrição de documentos, entre os anos de 2015 e 2020, referentes a: ações governamentais realizadas por meio do Sistema Único de Saúde (SUS) relacionadas ao ZIKV, ações de organizações não governamentais e de grupos de pessoas afetadas pelo ZIKV; entrevistas semi estruturadas e observação participante buscando identificar redes de solidariedade acionadas e construídas pelas mulheres mães de crianças com microcefalia, para a garantia de cuidados a saúde e direitos e compreender as percepções de mães de crianças com microcefalia sobre a constituição do grupo Mães de Anjos de Minas, sobre o vírus Zika e suas conexões com direitos humanos. Para análise dos resultados foi utilizado analise de conteúdo. Identificou-se a poucos estudos no campo de direitos humanos, saúde e a Síndrome Congênita do Zika Vírus. Houve um esforço do SUS em responder à epidemia. Houve a organização da sociedade civil a partir do fenômeno Zika e da sua associação à microcefalia. Identificamos que o Grupo Mães de Anjos de Minas, constitui-se de mulheres mães que residem em todo o estado de Minas Gerais, no entanto a sua maioria está na Região Metropolitana de Belo Horizonte. A trajetória construída pelo grupo baseia-se no aprendizado coletivo, na solidariedade, no apoio entre suas integrantes e à sua organização enquanto grupo, se configurando assim um espaço também de lutas para a garantia de direitos, articulando-se para isso com movimentos sociais/outros grupos que pactuam dessas mesmas premissas. As em redes sociais eletrônicas eram utilizadas para comunicação e informação. Podemos compreender como tem sido o enfrentamento dos desafios das mulheres mães de crianças com microcefalia. Também foi evidenciado que existe uma rede de apoio e solidariedade composta pelo pai, familiares e vizinhos, no entanto o cuidado está centrado nas mulheres mães, que enfrentam uma rotina exaustiva e sistemática de cuidados com os filhos com microcefalia cotidianamente. Constatamos como a garantia dos direitos sociais por meio de políticas públicas são essenciais para a dignidade das crianças com microcefalia. Também se constatou a importância do SUS durante a epidemia de Zika, no entanto há vários desafios, principalmente de efetivar as ações de saúde do nível federal até os municípios e de acompanhar essas crianças e suas famílias de modo longitudinal. Verificou-se que partir do fenômeno Zika vírus e a sua associação à microcefalia, muitas organizações da sociedade civil foram criadas para lutar pela garantia de direitos, principalmente na Região Nordeste, Centro Oeste, Norte e Sudeste do país. A importância da participação das pessoas em coletivos para a busca e garantia de direitos é uma ação fundamental de exercício da cidadania e fortalecimento e aprimoramento das políticas públicas.