Atendimento a mulheres em situação de violência sexual: pesquisa avaliativa em unidades de referência do setor saúde de Minas Gerais

Abstract

Introdução: A violência sexual contra as mulheres é um fenômeno complexo, estruturado em relações desiguais de gênero, com graves consequência para saúde e impactos para a vida toda, exigindo a organização e implementação de ações ágeis e resolutivas pelo setor saúde. Objetivo: analisar a implementação do serviço especializado de atenção às mulheres em situação de violência sexual (SAVS) em unidades de referência do setor saúde de Minas Gerais. Metodologia: trata-se de uma pesquisa avaliativa, com foco no processo e abordagem mista desenvolvida em duas etapas: (I) planejamento da avaliação e (II) implementação da avaliação. O planejamento da avaliação incluiu a realização de uma revisão integrativa da literatura sobre avaliação de políticas, programas e serviços de atenção à violência sexual e a descrição do programa avaliado, que incluiu a elaboração e validação do Modelo Lógico do SAVS. Posteriormente, desenvolveu-se a implementação da avaliação integrada por dois estudos: (i) estudo transversal sobre casos de violência sexual ocorridos em MG e atendidos em unidades de saúde especializadas (UE) do SUS, obtidos do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) e do Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde, disponibilizados pelo DATASUS e (ii) estudo de caso em duas UE do SUS prestadoras do SAVS, localizadas em Belo Horizonte, MG. O estudo de caso envolveu dois tipos distintos de análise: (a) Análise qualitativa dos processos de trabalho instituídos em UE e (b) Análise do nível de implementação do SAVS nas UE a partir de critérios e normas previamente estabelecidas. Para realização do estudo de casos, foram utilizados dados primários obtidos de 18 entrevistas com gestoras(es) e profissionais dos SAVS, observações participantes realizadas nas UE e dados secundários sobre os casos atendidos nas UE, obtidos do SINAN. Resultados: a partir da revisão integrativa da literatura, não foram identificados instrumentos padronizados para avaliação, sendo ricas as possibilidades de abordagens e estratégias metodológicas para se avaliar as políticas, programas e serviços de atenção às mulheres em situação de violência sexual. A análise de dados secundários reafirmou a magnitude e importância da violência sexual enquanto fenômeno relacionado às desigualdades de gênero, já que em Minas Gerais, as principais acometidas foram mulheres abaixo de 29 anos (77,1%), negras (61,1%), solteiras (69,7%) e de baixa escolaridade (42,4%). O estupro foi o tipo de violência sexual mais frequente (73,5%) e a maioria foi notificado até 72 horas após ocorrência. Houve associação entre o atendimento em UE e a maior chance de realização dos procedimentos previstos para os casos de estupro, com exceção do abortamento. A análise qualitativa demonstrou que há desconhecimento sobre a existência do SAVS; despreparo das/os profissionais para abordagem das mulheres em situação de violência; fragilidades na atuação articulada em rede e dificuldades em abordar o tema da violência sexual e do aborto. Como avanços, observou-se: há compreensão da violência sexual como problema social e de saúde por profissionais das equipes multidisciplinares; há disponibilidade de insumos necessários ao atendimento às mulheres e há percepção sobre a melhoria na humanização da atenção à violência sexual a partir da implementação da coleta de vestígios no SUS. A análise do nível de implementação informou que em ambas UE estudadas, o SAVS está implementado, sendo 88% na UE1 e 84% na UE2. A variação do nível de implementação deveu-se, principalmente, à qualidade técnica, componente com os piores resultados nas duas UE e para o qual foi recomendado aprimoramento. Conclusão: conclui-se informando sobre a importância do investimento na formação de profissionais sensíveis às discussões de gênero, da qualificação e ampliação dos SAVS em MG, da divulgação de informações sobre esses serviços na rede intra e intersetorial e à população em geral e da institucionalização de processos avaliativos no âmbito do SUS e dos SAVS.