Sífilis congênita no município do Rio de Janeiro no período de 2007 a 2021: tendência e características

Abstract

A sífilis é a doença que apresenta as maiores taxas de transmissão durante o ciclo gravido-puerperal. A sífilis congênita, contudo, pode ser evitada, mas a taxa de incidência no Brasil permanece alta, mantendo-a como relevante problema de saúde pública na atualidade. A cidade do Rio de Janeiro apresenta cerca do dobro da taxa de incidência do país, sendo a quarta capital mais atingida. O objetivo do estudo é analisar a tendência e as características dos casos notificados de sífilis congênita no município do Rio de Janeiro no período de 2007 a 2021. Trata-se de estudo ecológico de séries temporais da taxa de sífilis congênita em menores de um ano. Os dados foram extraídos do Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) e do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC). Foram analisadas as variáveis relacionadas às características sociais e assistenciais maternas por estratos de raça/cor da pele, utilizando o teste qui-quadrado de Pearson para avaliar a existência de diferença estatisticamente significativa entre as proporções (p ≤ 0,05). A tendência temporal foi analisada utilizando modelo de regressão joinpoint, sendo calculada a variação percentual anual (APC) e respectivo intervalo com 95% de confiança para cada período de mudança na inclinação da tendência observada. As taxas também foram ajustadas no denominador para média de nascidos-vivos no período; e desagregadas por raça/cor da pele, área de planejamento e regiões administrativas. A taxa de incidência de sífilis congênita no município do Rio de Janeiro aumentou no período de 2007 a 2012 (APC=22,2; p < 0,001), queda até 2019 (APC = - 13,7; p = 0,137), e posterior recrudescimento (APC = 17,1, p = 0,269). A taxa ajustada para média de nascidos-vivos no período apresentou tendência similar. A área de planejamento 1.0 e regiões de favela apresentaram as maiores taxas, bem como entre as mães pretas, mas com tendencia de queda no período (APC = -6,1; p = 0,040). As mães negras tinham proporcionalmente escolaridade mais baixa (p=0,004) e eram adolescentes (p=0,004) do que as mães brancas; e também apresentaram menor realização de pré-natal (p < 0,001), tratamento para sífilis na gestação (p < 0,001) e do parceiro (p = 0,013). A implantação da rede Cegonha em 2011 coincide com a queda na taxa de sífilis congênita até 2019, quando ocorre o desmonte da atenção básica e há um recrudescimento da doença no município, agravada pela epidemia de covid-19. Apesar do diagnóstico e tratamento serem efetivos e de baixo custo, o esforço para o seu combate ainda não obteve o êxito desejado, em particular nos grupos mais vulneráveis, como a população negra e residentes em favela.