Vírus como indicadores da qualidade da água em ecossistemas costeiros da Zona Oeste do Rio de Janeiro: utilização de metodologias moleculares e avaliação de impacto antropogênico em águas recreacionais

Abstract

Este estudo teve como objetivo avaliar a disseminação de agentes microbiológicos em diferentes ecossistemas aquáticos da região litorânea da Baixada de Jacarepaguá que dispõe de um emissário marinho como solução sanitária para destinação do esgoto doméstico urbano no período de 2016 a 2020. Inicialmente, o impacto antrópico nas águas interiores do Sistema Lagunar foi analisado utilizando ferramentas moleculares de quantificação e caracterização de indicadores bacteriológicos (FIB) e virais (FIV) de contaminação urino-fecal humana, assim como a metodologia de TaqMan Array Card (TAC) capaz de identificar simultaneamente 35 patógenos em uma única análise. Mastadenovirus humanos (HAdV) e JC poliomavírus humano (JCPyV ou HPyV2), utilizados como FIV, foram detectados em concentrações de 102 a 106 cópias do genoma/L (CG/L), assim como outros 17 patógenos entéricos, incluindo vírus (4), bactérias (8), protozoários (4) e helmintos (1). O sequenciamento parcial dos genomas virais caracterizou nessas águas salobras as espécies de HAdV-A, -C, -D e -F e JCPyV tipo 3 (Af2), sendo esta última prevalente em populações mestiças como a brasileira. Posteriormente, o monitoramento de águas residuárias foi realizado para investigar a disseminação, concentração e diversidade genética destes FIV nos esgotos domésticos e hospitalares da região. HAdV e JCPyV foram detectados em 95% das amostras em concentrações de 10 3 a 108 CG/L, sendo caracterizadas 35 genótipos virais, dos quais quatro identificados pela primeira vez no Brasil (HAdV-D17, HAdV-D22, JCPyV-7 e JCPyV-8). Visando quantificar partículas de HAdV com capsídeos íntegros e potencialmente infecciosos foi estabelecido um protocolo com o uso de um corante intercalante de ácidos nucleicos (PMAxx) associado a qPCR aplicável a diferentes matrizes aquáticas, incluindo de forma inédita, águas salobras e marinhas. O protocolo utilizando pré-tratamento a concentração de 50uM de PMAxx (intercalante de genoma) revelou uma redução média de 2 log entre amostras não tratadas e tratadas. Paralelamente a estes estudos, um monitoramento microbiológico na zona costeira e o entorno do emissário marinho (zona offshore) na praia da Barra da Tijuca foi realizado, a fim de se avaliar a balneabilidade e rastrear as origens de contaminação fecal neste ecossistema costeiro. No período de fevereiro de 2019 a janeiro de 2020, 134 amostras de águas superficiais e ao longo da coluna d’agua foram coletadas e processadas para avaliação de parâmetros físico-químicos, bacteriológicos e virológicos. Foram detectadas partículas de HAdV com capsídeos íntegros em 10% das amostras consideradas próprias para banho, com concentrações de 10 a 60 CG/L. Foi evidenciado que as águas da zona costeira, utilizadas para práticas recreacionais, apresentaram concentrações de até 3log de HAdV íntegros a mais que a zona offshore, sendo identificados inclusive HAdV-A12, -D, -F40 e -F41 potencialmente infecciosos. O emissário marinho foi eficaz em distanciar, diluir e permitir que fatores ambientais reduzissem a contaminação microbiológica. As águas oriundas dos Canais da Joatinga e Sernambetiba foram as principais fontes de contaminação fecal na Praia da Barra da Tijuca. Este trabalho, pioneiro na América Latina na avaliação de vírus como contaminantes ambientais em torno de um emissário marinho, aponta a necessidade da inclusão de parâmetros como a detecção de HAdV íntegro como FIV complementares aos bacterianos para monitoramento ambiental