Incidência e transmissão domiciliar de SARS-CoV-2 em uma coorte de famílias residentes na região metropolitana do Rio de Janeiro

Abstract

As taxas de incidência de infecções por SARS-CoV-2 e a soroprevalência de anticorpos têm promovido a compreensão da pandemia e a avaliação de medidas implementadas ao longo do tempo. Apesar das vacinas reduzirem drasticamente as taxas de infecção grave, com o surgimento das novas variantes a prevenção da infecção se tornou outro fator crítico no controle da disseminação viral. De maio de 2020 a junho de 2023, conduzimos um estudo de coorte de famílias para entender a história natural da infecção por SARS-CoV-2 no Rio de Janeiro, Brasil. Este estudo teve como objetivos estimar a incidência da infecção por SARS-CoV-2, descrever o perfil imunológico, investigar a imunidade induzida pela infecção, pela vacina e a probabilidade de contrair a infecção em uma coorte de famílias em diferentes períodos epidêmicos. As famílias foram acompanhadas com coleta sistemática de amostras do trato respiratório e do sangue. Foram monitorados sintomas e status vacinal. Foi calculada a densidade de incidência definida como o número de novos casos de SARS-CoV-2 por 1.000 pessoas-semana de exposição. Para cálculo da soroprevalência, definimos participante soropositivo como aquele com pelo menos um teste sorológico positivo (Ac anti-nucleocapsídeo ou Ac anti-spike) por período avaliado. Para análise da transmissão domiciliar modelamos o número de contatos infectados como uma variável aleatória da distribuição binomial. A variável aleatória binomial foi definida por dois parâmetros: o número de indivíduos no cluster e a probabilidade de transmissão dentro do cluster. A probabilidade de transmissão dentro do cluster foi definida por uma função de ligação logit que consistiu em um intercepto, efeitos fixos e efeitos aleatórios. Foram recrutados 669 indivíduos, totalizando 272 clusters domiciliares e 288 casos índices identificados. A densidade de incidência da infecção por SARS-CoV-2 variou de 4 (Delta) a 56 (B.1.1.33) por 1.000 pessoassemana, sendo a mais alta na onda B.1.1.33 em todas as faixas etárias. A soroprevalência variou entre 37% no período pré-VoC e 99% no período de circulação da variante Ômicron. A transmissão domiciliar ocorreu em 45,6% dos clusters pesquisados. Durante o período pré-VoC, entre os fatores investigados, nenhum foi associado à transmissão. No período Gama/Delta, infecções prévias reduziram a probabilidade de transmissão (OR=0,088; IC 95% 0,023-0,341), enquanto no período Ômicron, ter um profissional de saúde no domicílio (OR=0,486; IC 95% 0,256-0,921) e imunidade híbrida (OR=0,095; IC 95% 0,010-0,924) diminuíram a probabilidade de transmissão. Nossos resultados fornecem forte suporte para o efeito protetor da vacinação regular contra a transmissão domiciliar em uma coorte de famílias expostas a variantes sucessivas do SARS-CoV-2.