Caracterização do perfil de mortalidade dos povos indígenas de Mato Grosso do Sul de 2010 a 2018: uma análise a partir de sistemas de informação em saúde

Abstract

Introdução: Os impactos negativos da colonização e do contato forçado entre povos indígenas e a sociedade envolvente vem causando danos à saúde dessas comunidades, em diversas partes do mundo. Os principais indicadores desse processo são as elevadas taxas de mortalidade e as mudanças ambientais, socioculturais e alimentares, reportadas nas comunidades. Objetivos: O objetivo deste trabalho foi analisar o perfil da mortalidade entre os povos indígenas de Mato Grosso do Sul, descrever os óbitos sob o ponto de vista sociodemográfico, e estimar os indicadores de mortalidade geral, mortalidade infantil e elucidar os óbitos por causas externas. Métodos: Trata-se de um estudo epidemiológico descritivo, que analisou óbitos notificados no período de 01 de janeiro de 2010 a 31 de dezembro de 2018, no estado de Mato Grosso do Sul. Foram consultados dados secundários contendo os óbitos registrados na categoria de cor ou raça indígena, disponíveis no Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM). Foram analisadas as seguintes variáveis: data de nascimento e óbito, sexo, logradouro, município de residência e causas da morte. Resultados: Foram analisados 4.294 óbitos com predominância de registros em indígenas do sexo masculino (140 homens para 100 mulheres) e média de 477 óbitos ao ano. Destes, 1.121 foram decorrentes de causas externas (25,3% do total de óbitos), sendo 373 ocorrências classificadas como agressões, 337 como suicídio e 171 devidas a acidentes de transporte, respectivamente Dentre os 373 óbitos por agressões, 220 foram devidos a agressão por meio de arma branca, 52 devidos a agressão por meio de arma de fogo, e 42 por outros meios de agressão. Considerando os 337 óbitos devidos a lesões autoprovocadas (suicídios), 323 foram decorrentes de suicídio por enforcamento. Quando se analisam os óbitos em menores de um ano, a taxa média de mortalidade infantil no período foi 28,21 óbitos por mil nascidos vivos, variando entre 31,80, 29,76 e 23,01/1.000 nascidos vivos em 2010, 2014 e 2018, respectivamente. Conclusão: A análise dos dados de mortalidade entre os indígenas de Mato Grosso do Sul revelou taxas de mortalidade elevadas em comparação com a população não indígena, notadamente em relação aos óbitos por causas externas. O povo indígena Guarani e Kaiowá, sobretudo homens jovens de 5 a 49 anos, foram os mais acometidos. Discriminação, preconceito e estigmatização, historicamente presentes na região, associadas a recorrentes conflitos fundiários revelaram-se como fatores fortemente associados aos óbitos por causas externas, notadamente as agressões.